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Lula preso na década de 1980 por causa da greve no ABC Paulista e em 2018 na Lava Jato, por corrupção  e lavagem de dinheiro: derrocada de um líder popular. | Arquivo/Gazeta do Povo; Miguel Schincariol/AFP
Lula preso na década de 1980 por causa da greve no ABC Paulista e em 2018 na Lava Jato, por corrupção e lavagem de dinheiro: derrocada de um líder popular.| Foto: Arquivo/Gazeta do Povo; Miguel Schincariol/AFP

A prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cumprida neste sábado (7) pela Polícia Federal, tem ao menos um simbolismo em comum com a detenção do líder sindical Lula em 1980. Os dois momentos marcam a derrocada de um projeto político. Na década de 80, precedia o fim da ditadura militar. Agora, encerra um capítulo da história política da esquerda no Brasil.

Apesar de diferentes, as duas prisões do petista adicionam novas camadas à figura populista de Lula e podem aumentar o capital político do presidente entre seus apoiadores. Eleitoralmente, a prisão do ex-presidente expedida pelo juiz Sergio Moro fragmenta os votos da esquerda, mas também enfraquece o capital eleitoral da direita. 

Na visão do cientista político André César, da Hold Assessoria Legislativa, nas urnas a prisão de Lula pode ser ruim para os candidatos alinhados com a direita, e pode favorecer os candidatos mais ao centro. A simbologia na qual Lula está investido ainda traz medo para alguns eleitores, que avaliam votar no deputado federal Jair Bolsonaro (PSL-RJ) para impedir a eleição do petista. “Lula fora das eleições é ruim para o Bolsonaro. Parte do eleitorado do Bolsonaro vota nele para se contrapor ao Lula. Ele é o que mais perde com a prisão do ex-presidente”, avalia César. 

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Leonardo Barreto, doutor em Ciência Politica pela Universidade de Brasília (UnB), aponta que, mesmo com a tentativa de construção de um discurso pela militância petista de que Lula é vítima da prisão, será difícil o PT conseguir reverter o discurso que criou após falar em “golpe”. 

“Nosso processo democrático só vai se reestabilizar quando o PT voltar para o jogo democrático, inclusive cumprindo as decisões da justiça . Eles vão defender o que em campanha? Soltar o Lula? Rasgar a Constituição? Fazer um expurgo no Judiciário? O PT está liquidado. Ele entrou numa narrativa que ele dançou”, afirmou Barreto. 

Prisão em 1980 era política. Agora, por corrupção 

O encarceramento de Lula em 1980 e em 2018 representa o fim de capítulos da história política brasileira, mas com leituras opostas. Se no passado a prisão do “subversivo” sindicalista Lula mostrava os estertores da ditadura militar no Brasil e o fortalecimento dos movimentos sindicais, hoje a prisão do ex-presidente simboliza o fim do projeto político petista no poder. “O fracasso simbólico de um projeto. A síntese é essa”, avalia César sobre a prisão de Lula. 

Foram 31 dias de prisão em 1980, episódio que ajudou a construir a imagem do político Lula, antes apenas um símbolo do sindicalismo, ainda quando o Partido dos Trabalhadores (PT) não tinha sido fundado. Lula construía a imagem da liderança, lutava pela democracia, e contra o sistema que prejudicava os trabalhadores. Era a prisão de um ícone contra a ditadura, sem bagagem política. 

Agora, Lula é uma pessoa totalmente diferente. Depois de chegar ao poder e ser chamado pelo ex-presidente dos Estados Unidos Barack Obama de ser “o cara”, caiu o uniforme de metalúrgico e entraram os ternos Ricardo Almeida na simbologia do petista. Mais ainda: a pressão popular quer que sejam punidos os políticos corruptos e Lula é esse personagem para boa parte da população que não se alinha aos movimentos de esquerda. 

A prisão do petista tem menor potencial de inflamar os movimentos sociais e influenciar a política do que tinha nos anos 1980. Em depoimento à Comissão Nacional da Verdade, em 2014, Lula comentou como sua prisão ajudou a adicionar força ao movimento grevista. 

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"O que aconteceu quando eles me prenderam? Foi uma motivação a mais para a greve continuar, as mulheres fizeram uma passeata muito bonita em São Bernardo do Campo, depois foi aquele primeiro de maio histórico, em que foi o Vinícius de Moraes, e a greve durou quase 30 dias", disse Lula, em seu depoimento. 

De anistiado político a corrupto condenado

Foi reconhecida a prisão de Lula como sendo por motivos políticos. O presidente recebe aposentadoria especial como anistiado político. A condenação de Lula agora é pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex no Guarujá. Se a figura de Lula era marcada pela sua atuação pelos direitos do trabalhador, sendo um homem pobre e vindo do Nordeste, agora está marcada por ter enriquecido às custas de acordos com empreiteiras. 

Preso pelo DOPS quando transcorriam 17 dias da greve de trabalhadores metalúrgicos do ABC Paulista, Lula admitiu à Comissão Nacional da Verdade que seu encarceramento foi uma resposta dos militares à greve e classificou como “burrice”. "Os militares cometeram a burrice de me prender, porque não tinha mais como continuar a greve", disse. 

Na cadeia, ele fez greve de fome durante seis dias e manteve atuação sindical, inclusive realizando reuniões com membros do sindicato dentro do DOPS. 

“Não havia processo judicial naquela época, a prisão ocorreu sem processo, tanto que foi breve. Era uma prisão política. Hoje é uma prisão criminal com componentes políticos. Prisão que influencia muitas coisas, não apenas eleição, mas influencia também o estado do processo democrático no país”, avalia Barreto.

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