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 | Tânia Rêgo    /    Agência Brasil
| Foto: Tânia Rêgo /    Agência Brasil

Imposto sobre Movimentações Financeiras (IMF), um tributo para reunir todos os impostos sobre renda e consumo, federais, estaduais e municipais. Essa é uma das propostas para a área tributária que está em estudo pela área técnica da campanha do candidato Jair Bolsonaro (PSL). Seria o Imposto Único.

Segundo integrantes da equipe de especialistas que cercam Bolsonaro, a proposta que está sobre a mesa é a do economista Marcos Cintra, que unifica impostos e cobra apenas um, sobre todas as movimentações financeiras, da mesma forma que foi praticado com a CPMF, que vigorou durante 11 anos no Brasil.

Em setembro, em evento privado com investidores, o economista Paulo Guedes – chamado de “Posto Ipiranga” por Bolsonaro – chegou a mencionar a proposta de um tributo semelhante à CPMF. Não se tratava, nesse caso, de juntar vários impostos num só, como a ideia do Imposto Único, mas sim de criar um tributo para capitalizar a Previdência Social. Na ocasião, a ideia da “nova CPMF” foi rechaçada pelo candidato assim que veio a público.

A proposta do Imposto Único também é defendida pelo presidente licenciado do PSL, deputado Luciano Bivar (PE), que já chamou o modelo de arrecadação praticado hoje no Brasil de “manicômio tributário” e preside a frente parlamentar mista de defesa do Imposto Único.

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Pela proposta de Cintra – que já foi deputado federal com a bandeira da unificação tributária, mas não conseguiu levar o projeto adiante –, todas as operações financeiras seriam taxadas na fonte em 2,81%, tanto no débito como no crédito, totalizando 5,61% em imposto. Por exemplo: se um cidadão faz uma transferência financeira de R$ 100, seria sacado em R$ 102,81 e R$ 2,81 seriam recolhidos para a Receita Federal, pelo banco. Do outro lado, o credor desse valor receberia R$ 97,19, pois também pagaria R$ 2,81 para o governo.

A página de Cintra na internet explica que seria possível eliminar oito taxas federais (Imposto de Renda de Pessoa Física e Jurídica, IPI, IOF, Cofins, CSLL, e a contribuição patronal ao INSS), três estaduais (ICMS, IPVA e ITCD), e três municipais (ISS, IPTU e ITBI) com o Imposto Único.

Essa proposta, no entanto, não é a única em estudo pela equipe de Bolsonaro. Cintra e Paulo Guedes também avaliam uma reforma baseada em quatro pilares: isenção de Imposto de Renda para quem ganha até cinco salários mínimos; alíquota única de 20% para quem ganha acima disso; redução do Imposto de Renda das empresas, que hoje é de até 34%, para 20%; e a retomada da tributação de juros e dividendos, com alíquota de 20%.

Pior para mais pobres, melhor para quem emprega

Para especialistas, um mérito da unificação de impostos é a redução de custos com a burocracia contábil para se administrar tantos tributos. A proposta de juntar ao menos os principais impostos sobre o consumo em uma única taxa – o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) ou Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) – foi bandeira das campanhas de Marina Silva (Rede), Geraldo Alckmin (PSDB), Henrique Meirelles (MDB), Ciro Gomes (PDT) e Fernando Haddad (PT) no primeiro turno das eleições presidenciais, além de fazer parte da proposta de reforma tributária ensaiada pelo governo de Michel Temer.

Porém, a proposta do Imposto Único – mais ambiciosa que o IVA ou o IBS – parece pior principalmente para os cidadãos que têm menor renda, na avaliação de especialistas. Outros problemas são a acumulação de impostos ao longo da cadeia produtiva (criando o problema do efeito cascata, com o recolhimento de imposto sobre imposto) e ainda a tentativa de se usar menos os bancos, para evitar pagar o imposto.

Para empresários e empregadores, o Imposto Único traz alguns ganhos, além da redução dos custos de burocracia com a gestão de tantos tributos e contribuições diferentes. Como a medida inclui no pacote de taxas a contribuição patronal ao INSS, de 20%, os empregadores deixariam de arcar com esse pesado custo em suas folhas de pagamento. Além disso, Marcos Cintra também afirmou em audiência na Câmara dos Deputados em 2015 que o mercado financeiro e os bancos ficariam de fora da proposta, permitindo que seja aplicado algo mais favorável a esse segmento, que realiza um grande número de operações ao dia.

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Samir Choaib, advogado tributarista e sócio do escritório Choaib, Paiva e Justo Advogados, critica a proposta do Imposto Único. Um ponto negativo é taxar ricos e pobres da mesma forma, sem progressividade, conceito no qual quem ganha mais, paga mais. 

“Acaba gerando um imposto alto, haveria distorção. Se por um lado, isso pega todo mundo na fonte, por outro ao ser tributado na entrada e na saída fica alta a tributação no final, e vai gerar injustiças. Algumas pessoas vão conseguir se planejar um pouco, especialmente nas classes mais altas, mas os demais não têm como escapar disso. [Essa alíquota] na classe mais baixa é altíssima”,avalia Choaib. 

O especialista também critica a tributação em cascata gerada pela sistemática.Para ele, a simplificação tributária é um ponto positivo. Contudo, ao incidir sobre débitos e créditos de todas as operações financeiras, criaria “distorções” na tributação, gerando injustiças.

“Acho que a tributação não é isso, buscar fazer algo apenas porque é mais fácil. Você tem de tributar renda, patrimônio, mesmo no valor agregado você tem de tributar tudo. [A proposta do Imposto Único] pode gerar uma tributação grande. No fim das contas, sob o pretexto de facilitar, tira o objetivo final da tributação, que é se preocupar com a progressividade e a justiça fiscal”, pondera. “Não tem como se planejar e o assalariado vai pagar duas vezes. A tributação deve ser progressiva, quem tem mais patrimônio tem de pagar mais”, completa.

Também são pontos de dificuldade da implantação do Imposto Único a unificação de tributos estaduais e municipais, que deve sofrer resistência dos governos regionais.

Meio termo e “nova CPMF”

O deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), responsável pela proposta de reforma tributária que está em curso no Congresso Nacional, afirmou à Gazeta do Povo que a proposta de Marcos Cintra tem benefícios, mas que precisaria de algumas mudanças e não poderia ser o único imposto cobrado. 

Hauly, um dos maiores especialistas na questão tributária no Congresso, conhece a proposta de Cintra e já participou de diversas audiências e reuniões com o ex-deputado, que apresentou a proposta publicamente na Câmara.

O deputado considera que o IMF seria positivo se fosse destinado para cobrir parte do déficit da Previdência, compensando a arrecadação que não vem de setores da economia que não recolhem a contribuição patronal, como parte dos produtores rurais, entidades filantrópicas e autônomos.

Para o deputado Hauly, a contribuição poderia ser chamada de CPMF, como a que foi instituída no passado, mas nesse caso a letra P da sigla não seria de “provisória”, como no nome da taxa antiga, mas de “previdenciária”, indicando a destinação dessa arrecadação para esse fim. Era isso, aliás, o que Paulo Guedes havia mencionado a investidores antes de ser desautorizado por Bolsonaro.

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Hauly acha inviável unificar todos os impostos em apenas um. Para ele, o ideal é criar um “mix”, mantendo quatro bases de tributação: os impostos sobre o patrimônio; sobre a renda (com a unificação do Imposto de Renda Pessoa Jurídica e a Contribuição Social sobre Lucro Líquido); sobre o consumo (onde Hauly sugere a unificação de até nove impostos para criar apenas um, o Imposto sobre Valor Agregado); e a contribuição previdenciária. Apenas esta última seria substituída pelo IMF.

“Se a CPMF fosse encaixada para reduzir a contribuição patronal ao INSS seria ótimo. Mas teria de ter uma alíquota baixinha, e retirar a contribuição que hoje está sobre o faturamento”, defende o deputado parananense. “O Imposto Único não dá certo sozinho. Precisamos de um mix”, afirmou. 

O desafio da reforma tributária

A reforma tributária é uma das medidas para a economia que o governo Temer perseguiu e teve dificuldades de encampar no Congresso, junto com a reforma da Previdência. Na nova legislatura também não deverá ser fácil levar à frente uma reforma de impostos, especialmente se tal proposta incluir o fim de impostos estaduais e municipais. 

Cintra tentou pautar a reforma durante seu mandado como deputado federal de 1998 a 2003, com a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 474. Porém, a proposta foi arquivada. Inclusive, o economista não é figura nova na política brasileira, já tendo sido eleito vereador e deputado e disputado eleições para a prefeitura da São Paulo. 

Em 1998, ele foi eleito pelo PL, atual PR. Em 2008, elegeu-se vereador em São Paulo pelo PR. Em seguida, foi nomeado secretário municipal de Desenvolvimento Econômico e do Trabalho pelo prefeito Gilberto Kassab, cargo que exerceu entre 2009 e 2012. Hoje ele é presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).

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