• Carregando...
O apresentador José Luiz Datena desistiu da pré-candidatura ao  Senado e deu explicações em seu programa de televisão no último dia 9 | Beto Barata/PR
O apresentador José Luiz Datena desistiu da pré-candidatura ao Senado e deu explicações em seu programa de televisão no último dia 9| Foto: Beto Barata/PR

O apresentador de TV José Luiz Datena é mais um dos chamados “outsiders” a desistir da pré-candidatura. Ele se junta ao grupo que inclui o também apresentador Luciano Huck, o ex-ministro do STF Joaquim Barbosa, e o ex-técnico Bernardinho, da seleção brasileira masculina de vôlei.

Para justificar a desistência, Datena citou a pressão da família, que era contra a sua entrada na política, e o momento político atual. Mas a pressão da esposa e dos filhos pesou demais na decisão.“Pensei bem, refleti, conversei com a minha família, conversei muito com Deus, com poucos amigos, ouvi muitas opiniões do povo na rua e achei que ainda não era a hora”, revelou ao retornar ao telejornal “Brasil Urgente”, da Band, no último dia 9. “Devo explicações primeiro a Deus, depois à minha família e, é claro, ao meu público”, disse, anteriormente, ao introduzir o assunto ao vivo, enquanto apresentava o programa.

“Não quero que ele dispute o governo”, disse mulher de Bernardinho

O pedido de familiares também apareceu entre as justificativas dos demais outsiders que abriram mão da candidatura. Joaquim Barbosa, que desistiu da pré-candidatura à presidência da República em maio, afirmou que a família não era a favor de sua tentativa de concorrer ao Palácio do Planalto.

Antes dele, Bernardinho já havia sentido a pressão da família contra sua tentativa de concorrer ao governo do Rio de Janeiro. Mais precisamente da esposa, a ex-jogadora de vôlei Fernanda Venturini. “Não quero que ele dispute o governo. Não por agora. Há políticos que mandam matar! Ele precisa aprender a lidar com a política”, disse à revista Época em março passado. O marido anunciou a desistência da intenção de se candidatar em maio.

No início do mês, a mãe do empresário Josué Gomes e viúva do ex-presidente José Alencar, Mariza Campos Gomes da Silva, disse que “se Deus quiser”, ele não seria pré-candidato à Presidência da República. Gomes deixou o MDB e se filiou ao PR, e é apontado como um possível postulante ao Planalto. Ao jornal O Estado de S.Paulo, Mariza informou: “Nem eu nem a mulher dele, nem a filha [queremos]”.

““Essa coisa da família ser contra é um pouco balela”, diz cientista político

“Essa coisa da família ser contra é um pouco balela, a gente não pode acreditar muito”, afirma o cientista político Sérgio Praça, professor da FGV-RJ. Para ele, são outros fatores que pesam definitivamente na decisão de abrir mão da candidatura, e não necessariamente o pedido de familiares para abandonar a pretensão de assumir um cargo político.

“No caso do Luciano Huck, de fato ele parece querer contribuir, ter uma vida pública na política. E, ao contrário da maioria dos outros, ele perderia muito dinheiro se levasse a candidatura adiante. Até a Angélica perderia o contrato com a [TV] Globo. É uma posição um pouco mais compreensível do que a do Joaquim Barbosa, que não teria nada a perder. Só que ele evidentemente não tem o mínimo de temperamento para ser candidato”, aponta Praça, ao lembrar de alguns dos problemas nos quais o ex-ministro do STF se envolveu, incluindo discussões mais ásperas com jornalistas.

A dúvida quanto à sinceridade da posição dos “outsiders” desistentes é acompanhada por Flávio de Campos, professor do departamento de História da USP. “Sinceramente, não acredito que [o pedido da família] seja a principal motivação”, afirma. Para ele, apontar para os familiares como a razão da desistência de uma pré-candidatura é uma forma de esconder os reais interesses desses personagens, a quem ele prefere classificar como candidaturas avulsas.

“Capivara”: o medo de ter a vida vasculhada

Flávio de Campos acredita que, por trás das desistências pode estar o medo de ter a vida vasculhada por rivais na corrida eleitoral. “Em uma campanha mais concorrida, os adversários políticos tendem a puxar o que a gente chama de ‘capivara’”, em referência a eventuais escândalos ou passagens questionáveis na vida pregressa de alguns desses pré-candidatos – o que ele entende ser papel da imprensa e do Ministério Público, caso haja fatos que desabonem as candidaturas. “Mas esses telhados de vidro talvez estejam sendo revelados quando se fala em motivos de família.”

Nesse caso, Huck seria um dos postulantes com alguns esqueletos no armário e não seria do interesse dele, caso assumisse a condição de candidato, vê-los explorados por adversários políticos. O apresentador protagonizou algumas polêmicas ao longo dos últimos anos, incluindo uma construção irregular e supostos danos ao meio ambiente em Angra dos Reis (RJ) e um jatinho financiado com empréstimo de R$ 17 milhões do BNDES.

O ataque à vida particular dos candidatos poderia vir à reboque dessa procura por atos que arranhassem a imagem de nomes sem um histórico na política, e que se apresentavam como uma alternativa à população cansada da falta de representatividade política no cenário atual. E aí, aponta Campos, viria à tona o que ele entende como o lado perverso da sociedade brasileira: “A mistura do que é vida pública do que é âmbito privado”.

“Aí começam a aparecer eventualmente as relações furtivas extraconjugais, situações de intimidade, de preferência sexual, e isso tudo é baixaria”, afirma. “São questões que só interferem porque temos um nível de politização no nosso país que é muito rasteiro. Regredimos do ponto de vista da consciência política, e aí esses argumentos pessoais, íntimos, da devassa na vida privada, golpes baixos dados por baixo da mesa, também interferem na decisão desses candidatos”, observa.

Outsiders poderiam ter relação tensa com a Câmara caso fossem eleitos

Outro ponto apontado por Sérgio Praça como preponderante para a desistência dos “outsiders” está na dificuldade que os que pretendiam o Executivo nacional teriam no relacionamento com o Legislativo. Por se tratarem de nomes sem experiência no universo político e sem o apoio de grandes partidos, a relação para Huck ou Barbosa, na eventualidade de um ou outro se eleger, com o parlamento não seria das mais doces.

“A fragmentação partidária no ano que vem deverá continuar altíssima. Vai ter muito partido com bancada entre 15 a 50 deputados na Câmara, o que torna a negociação mais difícil, mais custosa, então, imaginar o Huck ou o Joaquim Barbosa navegando nisso é muito difícil. Acho até que no caso do Huck seria mais plausível, porque é alguém que tem um temperamento político, é um conciliador, não é um cara briguento. Ao contrário do Joaquim Barbosa, que mal aguenta dar entrevista. Imagine então lidar com deputado”.

Campos também entende que os candidatos avulsos teriam dificuldade no trato com o parlamento pela inexperiência dentro do cenário político. “Essas candidaturas sabem que vão ter que negociar com essa estrutura política [atual], com os diversos grupos de pressão, grupos empresariais, grupos ligados a religiões, ruralistas, os poderes oligárquicos de cada estado, com o setor financeiro, pressões internacionais e as estruturas partidárias. Aí se revela o limite dessas candidaturas”, pondera.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]