
Uma possível alteração no entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) de que a execução da pena deve ser aplicada após a condenação na segunda instância judicial está tirando o sono do juiz Sergio Moro, responsável pela condução dos processos da Lava Jato na primeira instância no Paraná.
A Corte pode voltar a discutir em breve se a prisão de condenados deve ocorrer mesmo quando ainda cabe recurso em instâncias superiores. Se o tema retornar ao plenário do STF, o risco de o entendimento atual ser alterado é grande, com o início do cumprimento da pena podendo ocorrer somente após o trânsito em julgado, ou seja, quando a possibilidade de recorrer a instâncias superiores se esgotar.
No último dia 16, o ministro Marco Aurélio Mello, relator do tema no STF, afirmou que pode levar novamente o assunto ao plenário do STF. No ano passado, a maioria dos ministros decidiu que a execução da pena de prisão pode ocorrer após a decisão em segunda instância, ou seja, antes do julgamento de recursos nas instâncias superiores.
“O processo está na Procuradoria, eu quero trazer a matéria [ao plenário]. Pelas sinalizações, o escore [isto é, o placar] vai inverter quanto ao segundo pedido, que é aguardar julgamento do STJ”, afirmou Marco Aurélio. O ministro acredita na formação de uma nova maioria, concordando que a execução antecipada da pena ficará condicionada a julgamento de recurso no Superior Tribunal de Justiça.
Dessa forma, as condenações da segunda instância passariam pelos tribunais de justiça estaduais ou tribunais regionais federais, mas a execução da pena só começaria após a análise dos recursos no STJ.
Gilmar Mendes é um dos ministros do Supremo que sinaliza poder mudar seu voto. “Nós admitimos que se permitiria a prisão a partir da decisão de segundo grau. Mas não dissemos que ela fosse obrigatória”, disse ele recentemente ao analisar um caso durante a sessão da Segunda Turma do STF.
A mudança é vista pelo juiz Sergio Moro com preocupação. Ele é responsável por diversas condenações da operação e dá demonstrações frequentes de que a prisão já na segunda instância é um dos trunfos da Lava Jato, porque desestimula a continuidade dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro como ocorria diante da impunidade.
“Essa foi uma reforma essencial para a efetividade da Justiça criminal. Eu diria que essa mudança é algo essencial para que nós tenhamos uma esperança no futuro em que a impunidade desses barões da corrupção chegue a seu termo e que nós tenhamos um país mais limpo”, declarou Moro, durante palestra promovida pela rádio Jovem Pan.
O juiz da Lava Jato chegou a demonstrar seu receio à presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, durante o evento em São Paulo. “Estou preocupado com a segunda instância lá”, teria dito a ela, segundo interlocutores próximos.
Carmén teria respondido que não mudou seu entendimento, que corresponde à atual decisão da Corte, e que nada ainda foi pautado nesse sentido pelo plenário. Ela é contrária à tese de restringir às prisões apenas após a fase de recursos ao STJ e é também a responsável pela definição da pauta de julgamento do STF.
Para o decano do STF, o ministro Celso de Mello, a Lava Jato não sairia enfraquecida caso a Corte defina um novo entendimento e reveja a possibilidade de execução de pena após condenação em segunda instância. Ele foi um dos cinco ministros que votaram contra essa tese no julgamento do ano passado.
Entenda melhor
O Partido Ecológico Nacional (PEN) e o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) são autores de duas ações que pedem a concessão de medida cautelar para suspender a execução antecipada da pena após decisão em segunda instância.
Em outubro do ano passado, por 6 a 5, o STF analisou as duas ações, decidindo manter a possibilidade de execução de penas – como a prisão – após a condenação pela Justiça de segundo grau e, portanto, antes do esgotamento de todos os recursos. Na época, o ministro Marco Aurélio – relator das duas ações – ressaltou que a Corte estava decidindo sobre a medida cautelar, e não sobre o mérito delas.
Marco Aurélio foi um dos votos contrários à prisão após a condenação em segunda instância, sendo acompanhado por Rosa Weber, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello.
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