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Renan Calheiros: votação secreta favorece o senador alagoano. | Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Renan Calheiros: votação secreta favorece o senador alagoano.| Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

A eleição para a presidência do Senado acontece apenas no começo de fevereiro, mas a disputa pelo cargo já está começando a se definir; e a maior briga pela cadeira passa pela Lava Jato. Desde o início do ano, integrantes da força-tarefa no Ministério Público Federal (MPF) em Curitiba endossam uma campanha pelo voto aberto para a presidência tanto do Senado quanto da Câmara dos Deputados. Os procuradores usam as redes sociais para divulgar um abaixo-assinado que pede o fim da eleição com voto secreto para as duas presidências.

De acordo com o procurador Roberson Pozzobon, um dos procuradores da Lava Jato mais engajados na campanha nas redes sociais, a eleição dos comandantes das duas casas são importantes para o avanço de pautas anticorrupção. “Os presidentes, tanto da Câmara quanto do Senado, são os senhores da agenda do Congresso Nacional. A palavra deles é a palavra que define quais projetos serão submetidos a votação, qual será a pauta e, por consequência, quais serão as prioridades do Congresso nessa legislatura pelos próximos dois anos”, disse Pozzobon em entrevista à Gazeta do Povo.

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O procurador destaca que o ministro da Justiça, o ex-juiz federal Sergio Moro, que conduzia os processos da Lava Jato em Curitiba, já sinalizou que vai encaminhar para o Legislativo uma série de medidas de combate à corrupção. “Se houver um presidente [da Câmara ou do Senado] que divirja desse entendimento, que não entenda que a pauta anticorrupção seja prioritária, ao fim e ao cabo não haverá avanço nenhum em termos legislativos no combate à corrupção nos próximos dois anos”, explica Pozzobon.

O procurador destaca, ainda, que o avanço no combate à corrupção pode sofrer um duro revés se o próximo presidente de uma das duas Casas for um investigado por esse tipo de crime. “O voto secreto acaba se tornando, nesse contexto, uma via para eleição de um presidente que não esteja comprometido com as causas anticorrupção. Se não pior, presidentes das duas Casas que estejam comprometidos com atos de corrupção”, alerta.

Tanto o senador Renan Calheiros (MDB-AL) quanto o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) – considerados favoritos nas eleições do Senado e da Câmara – são investigados pela Lava Jato.

Colega de Pozzobon, o coordenador da Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, também tem usado as redes sociais para defender o voto aberto na disputa pelos comandos da Câmara e do Senado.

“Mais de 500 mil pessoas estão pedindo o voto aberto. É um grito da sociedade pelo direito de acompanhar a posição de seus representantes nessa escolha que pode ser tão importante quanto a eleição de um Presidente da República”, disse Deltan em uma postagem no Twitter no dia 14 de janeiro. Junto com a mensagem, o procurador postou uma matéria do jornal Correio Braziliense com o título: “Manutenção da votação secreta é vista como um trunfo de Renan no Senado”.

Favorito para vencer disputa no Senado é crítico da Lava Jato

Reeleito para mais oito anos no Senado, Renan Calheiros (MDB) é um dos favoritos para ocupar a presidência no Senado pela quarta vez. A avaliação é que, com a eleição no Senado ocorrendo por voto secreto, Renan tem mais chances de vencer a disputa e voltar ao comando da Casa e, por consequência, à presidência do Congresso Nacional.

Se a eleição fosse aberta, uma parte dos senadores tenderia a votar contra o senador alagoano. Eles não estariam dispostos a serem associados publicamente a Renan, que responde a oito processos no Supremo Tribunal Federal (STF) e a mais dez inquéritos na Justiça.

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Renan é um crítico ferrenho da Lava Jato e do modo de atuação dos investigadores do caso. Já usou as redes sociais diversas vezes para criticar a operação e os principais nomes à frente das investigações, como o coordenador da força-tarefa no Ministério Público Federal (MPF) em Curitiba, Deltan Dallagnol, e o ex-juiz federal Sergio Moro, que julgava os casos.

Renan também foi o autor de um projeto de lei que tratava do abuso de autoridade e que foi duramente criticado por integrantes da Lava Jato, que enxergavam no projeto uma tentativa de cercear as investigações. Sob a presidência dele, o Senado aprovou, em 2017, um projeto de lei de abuso de autoridade de autoria do senador Roberto Requião (MDB), que tinha como base o texto proposto por Renan.

No dia seguinte à postagem de Deltan, Renan também usou o Twitter para criticar o procurador. “Deltan Dallagnol continua a proferir palavras débeis, vazias, a julgar sem isenção e com interesse político, como um ser possuído”, provocou o senador.

Na quarta-feira (16), Renan afirmou que em fevereiro vai entrar com uma representação no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) contra Dallagnol, “que continua a fazer política com declarações, tweets e retweets”, disse.

A deputada eleita Joice Hasselmann (PSL) também usou as redes sociais para se manifestar sobre o assunto e chamou Renan de “coroné do Senado” e disse esperar que ele seja mandado “para a cadeia”. Em resposta, o senador a bloqueou na rede social.

O procurador Pozzobon defende o colega e diz que não há irregularidades nas postagens de Deltan nas redes sociais. “O CNMP tem uma função muito importante, mas certamente essa função não é perseguir, a partir de comentários de parlamentares, membros do Ministério Público”, diz. “Não há nenhuma irregularidade na manifestação do Deltan. O que haveria de errado seria buscar colocar uma mordaça nos membros do Ministério Público”, diz Pozzobon.

Apesar de defender o colega, Pozzobon evitou comentar o favoritismo de Renan Calheiros para ocupar a presidência do Senado e o impacto que a eleição dele teria na Lava Jato. “Prefiro não personalizar a questão, até mesmo porque nossas manifestações vão no sentido de tornar a votação para a presidência da Câmara e do Senado públicas porque isso é o certo a se fazer, isso tornará nossa democracia mais forte”, disse.

Supremo foi acionado sobre voto secreto

O Supremo Tribunal Federal (STF) chegou a ser acionado para se manifestar sobre o voto secreto para a presidência da Câmara e do Senado. Ainda no ano passado, o ministro Marco Aurélio acatou um pedido do senador Laiser Martins (PSD) e determinou que o Senado realizasse a eleição com voto aberto – quando é possível saber em quem cada senador votou para presidir a Casa.

A decisão, porém, foi derrubada pelo presidente do STF, o ministro Dias Toffoli, que manteve a votação secreta. A pressão pelo voto aberto continua nas redes sociais com abaixo-assinados pedindo transparência na votação.

Clima anti-Renan se instala

A disputa pela presidência do Senado parece ter ganhado a marca do “anti”. Assim como ocorreu na eleição presidencial, a escolha de quem comandará a Casa pelos próximos dois anos será definida por grupos a favor e contra a chamada “velha política”, nesse caso, representada por Renan.

Sem o apoio do presidente ou do partido dele, o PSL, Renan acompanha, nos bastidores, a pretensão de Tasso Jereissati (PSDB) de firmar uma espécie de acordo tácito com a base aliada para derrotar o emedebista, mesmo que numa votação apertada e secreta. Assim como Renan, o tucano não se colocou oficialmente como candidato, mas busca líderes de outros partidos para avaliar suas chances de vitória.

“Ele não vai entrar nesse jogo para perder. Mas espera um sinal dos senadores para se colocar publicamente. Tasso é o único que pode derrotar Renan”, diz o senador Ataídes Oliveira (PSDB), que não se reelegeu, mas faz parte do grupo de sustentação à campanha de Tasso.

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Apesar da discrição, o tucano já se reuniu com líderes do DEM, do PSD e do Podemos e tem marcada para o dia 28 uma reunião com o governador de São Paulo, João Doria, para tratar de eleição. Doria tem ocupado espaço no PSDB depois que o presidente da sigla, Geraldo Alckmin, se afastou do dia a dia partidário, ainda que extraoficialmente.

A entrada de Doria na campanha de Tasso é considerada essencial para atrair o apoio de Bolsonaro e convencer o senador eleito Major Olímpio (PSL-SP) a se retirar da disputa, já que ainda não conseguiu agregar apoio. É esperada uma declaração pública do governador após a reunião – assim como fez com o deputado Rodrigo Maia (DEM), que já o visitou em busca de apoio para sua reeleição.

Frente de centro-esquerda articula lançamento de um nome no Senado

Tasso tenta ainda ser o nome de um bloco que se forma no Senado com a participação de diversos partidos. “Pedi para ir ao gabinete do Tasso. Saímos da eleição totalmente divididos. Candidatos a presidente, governador, tudo diferente. Tem sido assim há dez anos. Coloquei que o nome dele é um nome, mas existem outros”, disse o senador eleito Cid Gomes (PDT-CE).

Cid articula um bloco com PSB, Rede e PPS que teria 15 senadores e seria, na opinião dele, capaz de atrair outras forças como PSDB, PP, PSD e DEM. Com isso, se formaria uma “espinha dorsal” no Senado que garantiria a eleição do presidente e os principais postos da Mesa Diretora.

A proposta de Cid é apresentar um manifesto que defenda mudanças no regimento da Casa e uma direção que não seja “nem situação automática nem oposição sistemática”, mantendo independência em relação ao governo. Pela proposta, a escolha do nome a presidente seria o último passo do processo. “Tasso concordou com isso”, disse Cid, que afirma considerar o tucano um “nome forte”.

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Enquanto isso, o movimento anti-Renan tem crescido nas redes sociais. O Movimento Brasil Livre (MBL) lançou vaquinha online para arrecadar R$ 30 mil e custear manifestações contra a candidatura do senador de Alagoas. O grupo batizou a ofensiva como “Operação Fora, Renan” e a ideia é “organizar piquetes” em endereços de senadores que apoiam o alagoano, além de comícios em alguns estados e ações na Justiça.

Na terça-feira (15), o MBL protocolou ação popular no Supremo Tribunal Federal com pedido de liminar para impedir que Renan se candidate. O argumento é de que eventual eleição do senador iria contra o princípio da moralidade pública, já que o emedebista é alvo de inquéritos no STF por lavagem de dinheiro, corrupção e organização criminosa.

MDB mantém ‘plano B’ caso Renan saia da disputa

Se enfrenta dificuldades para atrair aliados de Bolsonaro, como o MBL, Renan tem apoios assegurados por colegas do seu MDB, passando pelo PT ao PSD, que deve dar cinco de seus oito votos ao alagoano. Mas, por receio de que a candidatura de Renan sofra algum abalo até fevereiro, o MDB vai manter a senadora Simone Tebet (MDB) como “plano B” até às vésperas da eleição.

Atual líder da bancada do MDB no Senado, Simone queria anunciar à imprensa, ainda antes do recesso, em dezembro, que não seria candidata. Ela, porém, foi demovida pela direção do partido. A justificativa usada pelos dirigentes foi de que a sigla ainda “desconfia” de que Renan conseguirá ter condições para vencer a eleição interna e que a desistência dela serviria às candidaturas alternativas.

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Apesar de o senador alagoano ser o candidato que desponta como favorito, há um receio no próprio MDB de que a pressão da opinião pública vai aumentar na próxima semana e, por causa disso, alguns parlamentares possam mudar de posição.

Diante desse cenário, Renan atua para garantir que a bancada decida por seu nome somente no último dia antes da eleição, 31 de janeiro, e busca se aproximar do governo. Já jantou com o ministro da Economia, Paulo Guedes, e prometeu aprovar a reforma da Previdência.

O senador enfatiza que o partido só definirá se ele é candidato ou não na véspera da data da eleição. Para o MDB, quanto mais tarde vier a confirmação de que Renan será candidato, menor será o tempo para reação de setores contrários ao seu nome.

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