Os gastos da União com pessoal civil e militar – da ativa, aposentados e pensionistas – devem somar R$ 262,9 bilhões em 2019. Ao menos essa é a proposta de Orçamento para o próximo ano, primeiro da gestão de Jair Bolsonaro (PSL) frente à Presidência. E ele já assume com o desafio de lidar com o funcionalismo, uma alta despesa fixa da União.
Relatórios da equipe de transição apontam o tamanho do problema que o novo presidente vai enfrentar. A quantidade de servidores não é o maior problema, mas os salários elevados e as potenciais aposentadorias nos próximos anos, sim.
Entre 2015 e 2017, o gasto com pessoal do Poder Executivo cresceu 17% – passou de R$ 202,7 bilhões para R$ 236,9 bilhões. Neste ano, as despesas devem fechar em R$ 241,8 bilhões. As informações estão no relatório para transição de governo, elaborado por técnicos do Ministério do Planejamento.
Os gastos com a folha de pagamento só perdem para as despesas com Previdência – e não é uma possibilidade não honrar esses pagamentos. Mas, de alguma forma, é preciso rever esse custo fixo. “É real a necessidade de rever a atual configuração da APF [Administração Pública Federal] e de suas estruturas de gestão, das funções previstas na Constituição Federal, das competências regimentais”, diz o documento.
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O problema é que há alguns reajustes que serão concedidos para as carreiras de servidores federais, a despeito do cenário fiscal desfavorável e baixa arrecadação da União. A Medida Provisória que postergava os reajustes previstos de 2018 para 2019 caducou, e o Supremo Tribunal Federal (STF) a derrubou com uma liminar. Com isso, o governo deixou de economizar R$ 4,4 bilhões neste ano. Uma nova proposta de adiamento dos reajustes de 2019, com possibilidade de economia de até R$ 4,7 bilhões, foi proposta em agosto deste ano.
A questão é que o Senado aprovou, no início de novembro, um reajuste de 16% para os ministros do STF – os salários saltarão de R$ 33,7 mil para R$ 39,3 mil. Essa medida gera um efeito cascata que pode ser de R$ 5,2 bilhões, pois esse salário é o teto do funcionalismo.
Servidores sob controle
O relatório “Um ajuste justo”, publicado pelo Banco Mundial em 2017, já apontava que os altos níveis de gastos do governo com pessoal são impulsionados pelos altos salários dos servidores, e não pelo número excessivo de funcionários públicos.
Dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT) mostram que a relação entre funcionários públicos e população no Brasil é de 5,6% – mais alta que a médica latino-americana, que é de 4,4%, mas menor que a de países da OCDE, Europa e África. O problema é que a massa salarial do setor público brasileiro em relação ao PIB subiu de 11,6% em 2006 para 13,1% em 2015, excedendo a média de países de renda alta, como Portugal e França.
“Os altos salários do setor público contribuem para a desigualdade. Uma vez que a maioria dos servidores públicos está próxima ao topo da distribuição de renda, seus altos salários e prêmios salariais em relação a funções comparáveis no setor privado aumentam a desigualdade de renda”, aponta o documento, que também foi usado para embasar a análise para a equipe de transição.
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Remunerações altas
Hoje, o Brasil tem cerca de 634 mil servidores na ativa e outros 641 mil inativos, de acordo com dados de julho deste ano. No Poder Executivo federal, a menor remuneração é paga para o auxiliar executivo em metrologia e qualidade de carreira, do Inmetro, que recebe R$ 1.467,49 mensais. O maior salário mensal é de R$ 29.604,70, paga aos cargos de perito e delegado das carreiras da Polícia Federal e Polícia Civil dos ex-territórios.
A remuneração média é de R$ 11,2 mil para servidores na ativa, R$ 9 mil para aposentados e R$ 6,7 mil para pensionistas. Dados da PNAD Contínua, do IBGE, referentes ao terceiro trimestre de 2018, indicam que a média salarial de todos os trabalhadores brasileiros é de R$ 2,2 mil. O teto do INSS é de R$ 5,6 mil.
Para a equipe do ministério do Planejamento, as carreiras, cargos e funções da administração pública estão estruturadas em um sistema oneroso, complexo e com pouca mobilidade. Na década de 1990, eram cerca de 80 carreiras – agora são mais de 309, cada qual com suas regras e estruturas de remuneração específicas.
Quem está ocupando as carreiras com maior remuneração tem pouco estímulo para investir em cargos de gestão, o que significa que nem sempre são entregues os melhores serviços à sociedade. Outro problema apontado é a progressão automática, por tempo de serviço e sem alinhamento com instrumentos de avaliação de desempenho do funcionário.
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“As carreiras apresentam vários níveis de classes e padrões na sua estrutura, com diferentes amplitudes de progressão. Em alguns casos, os servidores alcançam o topo remuneratório da carreira em menos de dez anos de efetivo exercício, contrariando a lógica do tempo de contribuição mínimo exigido para efetivar a aposentadoria. A desmotivação também está relacionada à progressão, à promoção inadequada da carreira, aos instrumentos de avaliação de desempenho desalinhados com as boas práticas de mercado para realizar a progressão e promoção com base na meritocracia”, aponta o documento entregue à equipe de Bolsonaro.
Reestruturação de carreiras
O relatório do Banco Mundial defende uma reforma do funcionalismo público que vise reduzir os prêmios salariais. “Uma opção seria reduzir os salários iniciais de todos os novos funcionários e, assim, reduzir gradualmente os níveis de remuneração e aumentar os retornos da experiência profissional à medida que as coortes mais antigas de servidores se aposentarem”, sugere o documento.
A reestruturação das carreiras para um modelo mais moderno também é sugerida pela equipe de Ministério do Planejamento. O documento para esse período de transição diz que já há um estudo em andamento cujo objetivo é substituir o atual sistema de carreiras do serviço público por um modelo mais moderno e eficaz. Esse modelo seria pautado em metas e resultados, desenvolvimento, avaliação de desempenho, entre outros, e também alinharia as remunerações pagas pelo setor público aos salários praticados pelo setor privado.
Aposentadoria dos sonhos
Essas mudanças terão reflexos no futuro, inclusive em relação à aposentadoria dos servidores, que deve passar por mudanças em uma futura reforma da Previdência. Atualmente, a média de idade dos servidores é de 46 anos. Segundo o ministério do Planejamento, isso “traz alto risco de aumento na quantidade de pedidos de aposentadorias nos próximos anos”, o que poderá “gerar demanda adicional por recomposição da força de trabalho para atendimento aos anseios da sociedade”.
De acordo com o documento para a equipe de transição, 108 mil servidores, cerca de 17% do total, já teriam condições para aposentarem-se, mas seguem trabalhando por causa do abono de permanência, um incentivo financeiro para que os servidores sigam em atividade. Ainda assim, os pedidos de aposentadoria de servidores aumentaram. Em 2017, foram concedidas 22.458 aposentadorias a servidores – esse é o maior número desde 1998, e representou um aumento de 42% na comparação com 2016. Até julho de 2018, já haviam sido concedidas 12.360 aposentadorias.
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