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| Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Depois da reunião com o Conselho da República e com o Conselho da Defesa na segunda-feira (19), o governo federal cogitou pedir ao Judiciário a expedição de mandados de busca e apreensão coletivos durante a intervenção federal no estado do Rio de Janeiro. A medida, que não está prevista no Código de Processo Penal, é alvo de críticas de especialistas em segurança e direitos humanos, além de violar artigos da Constituição.

Diferentemente do mandado judicial de busca e apreensão tradicional, o mandado coletivo tem uma abrangência mais ampla. Com ele, a polícia pode entrar em qualquer lugar de uma determinada área sem autorização dos proprietários, mesmo em casas onde os moradores não são suspeitos de cometer nenhum crime.

“O mandado de busca e apreensão tradicional, que tem previsão no Código de Processo Penal, tem objeto e destinatário específico. Quem expede o mandado de busca e apreensão, que é um juiz, o faz com base em um pedido determinado. Se a gente tem, por exemplo, uma residência específica ou algumas residências específicas, essas residências precisam ser determinadas e o objeto da busca e apreensão, um aparelho telefônico, droga, isso também tem que ser determinado”, explica o advogado e mestre em Direito Penal e Criminologia Jovacy Peter. “O mandado itinerante ou coletivo não especifica um determinado ponto, mas ele acaba abrangendo uma região”, compara.

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Para Peter, os mandados coletivos, ao não especificar o local onde serão cumpridos, geram um conflito de direitos fundamentais. “Você tem a garantia constitucional de que a privacidade e a intimidade são direitos de ordem fundamental. Isso seria uma violação”, explica. O especialista explica que existem outros mecanismos na Constituição Federal que permitem a flexibilização de direitos fundamentais, como a decretação do estado de sítio.

Outros casos

A utilização dos mandados coletivos não é uma novidade no Brasil. Mesmo sem previsão legal, esse instrumento tem sido autorizado pela Justiça em outros casos. Recentemente, foi empregado em uma operação policial no Espírito Santo. O mandado coletivo também já foi utilizado em Brasília e no próprio Rio de Janeiro, em outros momentos.

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“Tem sido utilizado, com muitas críticas, sempre dentro de um contexto semelhante. São comunidades pobres, muitas vezes relacionados à prática de atos ligados ao tráfico de entorpecentes. E a justificativa é que pelo fato de serem comunidades que foram urbanizadas sem critério algum e seria muito difícil singularizar as residências”, explica Peter.

Os mandados coletivos já foram utilizados também na missão de manutenção de paz comandada pelas tropas brasileiras no Haiti. A Defensoria Pública do Rio e a seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no estado já se colocaram contra a proposta e disseram que utilizarão de medidas judiciais para impedir os mandados de busca coletivos.

Questionamento ao STF

Para Peter, a discussão sobre a utilização dos mandados coletivos durante a intervenção no Rio pode ir parar no Supremo Tribunal Federal (STF) por violar direitos fundamentais. “A possibilidade de abuso é um apontamento prático. Mais do que isso, a gente tem o limite teórico, um limite constitucional. A gente não pode ficar flexibilizando a interpretação constitucional em virtude de casuísmos, sob pena de a Constituição perder seu sentido”, alerta o especialista.

Nesta terça-feira (20), diante das críticas, o governo sinalizou um recuo na intenção de pedir mandados coletivos. O ministro da Justiça, Torquato Jardim, disse que o governo irá garantir, no âmbito da intervenção federal na segurança do Rio, “os direitos fundamentais da população”.

Mas ele evitou dizer que o governo descartou por completo a possibilidade, embora tenha dito que “a intervenção federal não suspende nenhum direito fundamental”.

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