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| Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Depois de ser parte de um do maiores esquemas de lavagem de dinheiro do país, a Petrobras ainda tenta se livrar da imagem de corrupção. A companhia diz que ao longo dos últimos quatro anos, desde quando foi deflagrada a Operação Lava Jato, adotou uma série de ações para afastar envolvidos no escândalo e para evitar que novos casos aconteçam. Agora, lançou uma campanha publicitária para mostrar tudo o que fez e tentar recuperar a confiança da sociedade. Mas, apesar da utilidade das ações adotadas, só o tempo dirá se o mal da corrupção foi realmente afastado da cultura de uma das principais estatais do país.

A mais recente medida para resgatar a sua credibilidade foi lançamento de uma campanha publicitária. Chamada “Confiança” e com o slogan “Não existe caminho fácil. Existe caminho certo”, o objetivo é mostrar que a Petrobras também foi vítima do Petrolão, que ela não se beneficiou do esquema criminoso e que as medidas punitivas e preventivas já foram tomadas para “passar a limpo” o seu passado e “arrumar a casa” para um novo momento da estatal. Ela será comandada pelo economista Roberto Castello Branco no governo Bolsonaro. Ele é ex-diretor da Vale e do Banco Central (BC).

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Um site foi criado para dar publicidade às ações adotadas pela estatal para punir os corruptos e para evitar que novos casos aconteçam. As medidas implementadas envolvem técnicas de compliance e governança corporativa, como são chamadas, respectivamente, o conjunto de práticas estabelecidas para que uma empresa cumpra suas normas internas e respeite às legislações vigentes e a diretoria que verifica se tudo está sendo cumprido. Elas foram batizadas de “10 ações anticorrupção”. São elas, resumidamente:

  • Colaboração com as investigações da Operação Lava Jato;
  • Punição dos envolvidos no escândalos, de advertência a afastamento e demissão por justa causa;
  • Recuperação de parte do dinheiro desviado;
  • Criação de um canal de denúncias externo, que pode ser usado pela própria sociedade, o que não existia;
  • Contratação de especialistas em combate à corrupção para a nova diretoria de Governança, Risco e Conformidade;
  • Rigor no controle e prevenção, com criação de normas, manuais de condutas e submissão dos processos à auditoria interna, externa e por órgãos de controle;
  • Nenhum executivo tem mais o poder de fechar contratos sozinhos. Decisões são autorizadas por, pelo menos, dois gestores sem relação hierárquica;
  • Fornecedores passam por análise de integridade (se obedecem às legislações, se já se envolveram em esquemas de corrupção, etc.) antes de fechar serviço;
  • Checagem de integridade dos gestores;
  • Ter somente líderes altamente capacitados tecnicamente.

Também foram gravados vídeos com depoimentos de funcionários, todos com bastante tempo de casa ou da nova diretoria de Governança, Risco e Conformidade, criada em 2015, após a revelação do Petrolão, justamente para mitigar os riscos de fraudes e corrupção dentro da empresa. Os depoimentos estão sendo veiculados em emissoras de TV e em sites de grandes veículos de comunicação. A Petrobras não revela quanto gastou para colocar a campanha no ar.

Quais medidas foram realmente efetivas?

De todas as medidas anunciadas pela Petrobras para combate à corrupção, o professor Economia & Finanças do Ibmec-RJ Gilberto Braga destaca a criação da diretoria de Governança, Risco e Conformidade, além do afastamento dos envolvidos. O professor explica que a Petrobras tinha um estrutura interna muito elogiada e bem definida, com boas práticas de gestão e um comitê de governança corporativa, mas que falhou do ponto de vista prática para evitar que fraudes acontecessem.

“Uma das questões que levaram ao Petrolão era o fato de que as diretorias eram leiloadas entre os partidos que apoiavam a base de sustentação do governo na época. O corpo empresarial pensava em governança, enquanto a direção em interesse próprio”, explica.

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“Agora, eles criaram uma Diretoria de Governança e Conformidade. É uma diretoria, ao lado da presidência, ocupada por pessoas independentes que foram um quadro numeroso para fazer com que o compliance interno funcione”, completa Braga. Na criação, a diretoria contava com 362 pessoas especialistas em compliance (conjunto de regras para evitar corrupção, fraude) e conformidade (o que pode ser feito para a empresa sempre cumpra as legislações vigentes).

Não há empresa incorruptível

Mas, apesar da pertinência das ações, não há empresa incorruptível, afirma Juliana Sakai, diretora da Transparência Brasil. “Tem aí algumas medidas que são boas práticas para evitar ou diminuir riscos de corrupção e para aumentar o controle. Mas nada é incorruptível.”

Juliana explica por que nenhuma empresa é incorruptível: “Empresas têm um objetivo claro que é ganhar dinheiro. E isso pode gerar um problema para quem está tocando a empresa. Você pode ter mecanismos de compliance, mas se, no final, um superior tem muito interesse em fechar negócio escuso e ordenar que seu subalterno faça, isso pode voltar a acontecer”, completa.

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John Forman, ex-diretor da Agência Nacional de Petróleo e diretor da J.Forman Consultoria, lembra que, apesar de a Petrobras ter funcionários muito qualificados, muitos ajudaram, mesmo que sem levar vantagem, a dar vida ao esquema criminoso. “O processo (de afastamentos dos corruptos) eliminou só o alto escalão. Não é um diretor que senta, que escreve o contrato. Tem toda uma estrutura que mexe com isso. Tem muita gente, o instrumental, que ajudou isso acontecer. Agora, as regras foram modificadas para minimizar esses casos. É necessário algum tempo para saber se toda a estrutura se conscientizou.”

E o que pode ainda ser feito?

Os especialistas destacam, ainda, o que pode ser feito para evitar que novos casos de corrupção aconteçam na Petrobras. Juliana Sakai sugere mudar o processo de nomeação das empresas públicas. “ A explicação para parte da corrupção na Petrobras está nesse processo. Uma das possibilidades seria restringir para quem já está ali dentro. Mas não que isso seja um mecanismo incorruptível. Você reduz as chances”, afirma.

Ela ainda recomenda uma mudança na forma de controle das empresas públicas. “Algo que é fundamental que não está sendo feita é colocá-las (as estatais) sobre o controle da CGU . Uma vez que ela pode fazer o controle interno das estatais, como faz da administração direta, teríamos um avanço no controle”, diz Juliana.

John Forman cita uma medida que vai além da Petrobras, e que envolve também os Poderes: processos transparentes e simples de combate à corrupção, em todos os níveis. “Quando você cria um sistema complexo para evitar a corrupção, você acaba criando as condições para que ela corra. Tem a famosa Lei 8.666, que controla as licitações para evitar que, em tese, não tenha fraudes. Mas isso não acontece. Tem também os tribunais de contas que opinam e olha o que aconteceu como muito deles. Tem que criar processos simples, objetivos, claros e transparentes.”

Juliana também comenta a necessidade de se exigir mais transparência das estatais. “Você tem um potencial muito grande de diminuir a interferência política na empresa a partir do momento que se aumenta o controle sobre ela.”

Primeiro passo foi dado, mas é preciso sair do papel

Os especialistas afirmam, ainda, que a Petrobras precisa provar que as medidas por ela já adotadas vão funcionar na prática. Por isso, ainda é cedo, na avaliação deles, para avaliar o real efeito das ações implementadas ao longo dos últimos quatro anos no combate e na prevenção à corrupção: foi um primeiro passo, mas outros precisam ser feitos.

“Precisamos ver as ações funcionando na prática, quando forem postas à prova. Por exemplo, se tiver uma nomeação duvidosa (no futuro), se a nomeação vai ser mantida ou se os mecanismos de proteção vão impedir que ela (a nomeação duvidosa) suba de cargo”, exemplifica Juliana.

“Aquilo que está escrito no papel, para pegar, é preciso que se dê o exemplo. Embora a Petrobras já praticasse muitas (práticas de) governança, quando se tem corrupção no alto escalão, significa que aquilo não pegou para valer. Era uma cultura mais de papel, agora precisamos ver se vira real”, afirma Gilberto Braga. Forman conclui: “O tempo dirá se vai funcionar”. Um desafio e tanto para o novo presidente da estatal.

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