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Atualmente, de 16 mil médicos que atuam no Mais Médicos, 8.332 são cubanos: saída preocupa municípios. | Josue Teixeira/Arquivo Gazeta do Povo
Atualmente, de 16 mil médicos que atuam no Mais Médicos, 8.332 são cubanos: saída preocupa municípios.| Foto: Josue Teixeira/Arquivo Gazeta do Povo

O governo planeja sugerir à equipe de transição do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) que parte da dívida de recém-formados em Medicina com recursos do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) seja abatida como forma de incentivá-los a ocupar vagas abertas pela saída dos cubanos no programa Mais Médicos. Segundo o ministro da Saúde, Gilberto Occhi, o tema foi analisado por técnicos e deve ser agora debatido em nível político.

O Fies financia os estudos de alunos de baixa renda. Um período depois de formados, os estudantes passam a pagar as mensalidades que foram financiadas. Os valores variam de acordo com a negociação prévia feita no momento da matrícula. “Vamos adotar todas as medidas para que não falte médico nas cidades brasileiras”, disse Occhi, nesta sexta-feira (16), durante inauguração de um centro médico em Duque de Caixas (RJ).

Após o anúncio do fim da participação de Cuba no Mais Médicos na última quarta-feira (14), o governo informou que até a próxima terça-feira (20) será lançado um edital para preencher as vagas abertas pela saída dos profissionais já na próxima semana e que a convocação aos postos deverá ocorrer de forma “imediata”. O comparecimento aos municípios deve ocorrer logo após a seleção, informa a pasta.

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Os cubanos devem ser substituídos por médicos brasileiros que tenham o número de inscrição no Conselho Regional de Medicina (CRM), obtido no Brasil e que possam fazer a opção de trabalhar no Programa Mais Médicos.

“Em um segundo momento, depois de um determinado período, vamos abrir para os médicos brasileiros formados no exterior. Acreditamos que existe um universo de cerca de 15 a 20 mil médicos aptos a participar do edital e a nossa ideia é fazer isso imediatamente ainda agora em novembro nós já temos médicos que tenham condições já escolhendo seus lugares para trabalhar”, afirmou o ministro da Saúde.

Desconfiança e apreensão com a saída dos cubanos

Apesar das declarações do ministro, especialistas e representantes dos municípios veem o prazo com desconfiança e dizem que pode haver dificuldade em repor as vagas dos médicos cubanos, sobretudo em regiões mais distantes dos grandes centros. A avaliação é que, embora tenha havido aumento na procura de brasileiros por vagas nos últimos editais, muitos ainda deixam de comparecer às vagas. Cerca de 30% também desistem ao longo do primeiro ano.

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Occhi indicou ter certeza de que as vagas serão ocupadas. “Acredito que sim [as vagas serão ocupadas], até porque, no último edital que fizemos no ano passado, tivemos mais de 20 mil inscritos brasileiros. Depois, eles não foram para os lugares, aí utilizamos em uma segunda chamada o médico estrangeiro. Acreditamos que sim, já que essa é uma grande oportunidade”, disse.

Atualmente, de 16 mil médicos que atuam no Mais Médicos, 8.332 são cubanos. A saída preocupa municípios, que temem desassistência e uma espécie de “apagão médico”, especialmente no Norte e Nordeste do país.

Segundo Occhi, ainda não foi definido um cronograma de saída dos profissionais cubanos do Mais Médicos. “Não tem uma definição. Isso é uma decisão do governo de Cuba de retirá-los. Nós estamos trabalhando de forma emergencial, para que na medida em que o médico cubano saia, ele tem a decisão de sair, mas que a gente tenha outros profissionais brasileiros que possam ocupar este lugar.”

Nesta sexta-feira (16) houve uma reunião entre representantes do Ministério da Saúde e da Opas (Organização Pan-Americana de Saúde) para discutir estratégias e a organização da saída dos médicos cubanos. Um novo encontro deve ocorrer na segunda-feira para finalizar a decisão. Já os detalhes devem ser divulgados na próxima semana.

Defensoria pede à Justiça que União mantenha regras do Mais Médicos

A Defensoria Pública da União informou ter pedido à Justiça Federal de Brasília que determine à União a manutenção das atuais regras do programa Mais Médicos. O órgão pede que profissionais estrangeiros não precisem ser submetidos à revalidação de diploma para atuar no programa.

Segundo a defensoria, o pedido visa evitar que a população atendida pelo programa “seja prejudicada com a saída abrupta de milhares de médicos” sem que o Ministério da Saúde promova medidas para repor “imediatamente” as vagas abertas com a saída dos profissionais.

No documento, a Defensoria defende ainda que sejam mantidas as atuais regras do programa Mais Médicos para a participação de médicos estrangeiros de qualquer nacionalidade, “condicionando quaisquer alterações, especialmente no tocante a desnecessidade de submissão ao Revalida, à realização de prévio estudo de impacto e comprovação da eficácia imediata das medidas compensatórias que assegurem a plena continuidade do serviços”.

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O Revalida é um exame nacional exigido por formados no exterior que queiram exercer a medicina no país. Para a Defensoria, a “rescisão repentina desses contratos [com os cubanos] impactará negativamente o desatendimento de mais de 29 milhões de brasileiros, um cenário desastroso em, pelo menos, 3.243 municípios”.

“Ainda que seja possível questionar pontos do programa, como a desnecessidade de prévia submissão de médicos estrangeiros ao Revalida, o percentual pago pelo governo brasileiro diretamente ao governo cubano e não aos médicos, e a impossibilidade de médicos trazerem suas famílias, fato é que o STF – a quem cabe dar a última palavra sobre a aplicação escorreita da Constituição Federal – declarou o programa Mais Médicos constitucional”, aponta o órgão.

“Se fosse presidente, exigiria um Revalida presencial”, diz Bolsonaro

A saída dos profissionais cubanos do Brasil ocorre por determinação do governo de Cuba. A decisão é atribuída a declarações do presidente eleito Jair Bolsonaro, que tem questionado a qualificação dos médicos cubanos e manifestado intenção de modificar o acordo, exigindo revalidação de diplomas e contratação individual.

Ele afirmou nesta sexta-feira que se já estivesse no cargo exigiria um “Revalida presencial” dos profissionais cubanos que integram o Mais Médicos. “Se fosse presidente, exigiria um Revalida presencial. Assistir o médico a atender o povo. Porque o que temos ouvido são muitos relatos de verdadeiras barbaridades. Não queremos isso para ninguém”, afirmou Bolsonaro, sem detalhar como isso seria feito.

O presidente eleito voltou a falar que também exigiria o repasse direto e integral do salários aos profissionais cubanos. “A situação é de praticamente escravidão a que estão sendo submetidos os médicos e as médicas cubanos do Brasil. Já imaginou confiscarem 70% do seu salário?”.

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Diferentemente do que acontece com os médicos brasileiros e de outras nacionalidades, os cubanos do Mais Médicos recebiam apenas parte do valor da bolsa paga pelo governo do Brasil. Isso porque, no caso de Cuba, o acordo que permite a vinda dos profissionais é firmado com a Opas, e não individualmente com cada médico.

Pelo contrato, o governo brasileiro paga à Opas o valor integral do salário, que, por sua vez, repassa a quantia ao governo cubano. Havana paga uma parte aos médicos (cerca de um quarto), e retém o restante.

Regresso já começou, diz TV cubana

Inicialmente, a previsão era que os médicos começassem a deixar o país no dia 25 deste mês e que a saída seja feita de forma gradual, até 25 de dezembro. Mas, nesta sexta, a televisão estatal cubana registrou o retorno dos primeiros médicos ao país. No vídeo, divulgado pelo jornal O Globo, 196 médicos chegam no aeroporto de Havana, na madrugada de quinta-feira (15), menos de 24 horas após o anúncio da decisão. Segundo a reportagem foi “um momento mágico de regressar à pátria com a missão cumprida”.

Os médicos foram recebidos pela vice-ministra de Saúde Pública, Regla Angulo Pardo, que elogiou os profissionais cubanos e agradeceu pelo apoio dos brasileiros. “Durante esses cincos anos, vi eles partirem, se prepararem, compartilhei com eles a preparação para o idioma, para a geografia do Brasil, para as condições da saúde. Não continuamos no programa Mais Médicos, mas acho importante reconhecer a maneira com que o povo brasileiro sempre tratou a nossos médicos”, disse ela.

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