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 | Beto Barata    /    PR
| Foto: Beto Barata / PR

Em Brasília, a pauta de ações e medidas é sempre influenciada pelas articulações políticas. Em ano eleitoral e com cenário tão nebuloso, os políticos correm para definir as pautas que podem chamar atenção do eleitor e resultar em votos. O governo de Michel Temer tem manobrado para escolher os temas mais favoráveis e de apelo popular e influencia o debate, saindo favorecido.

A pauta econômica predominou em 2017, com reforma da Previdência e corte de gastos. Agora é a hora da segurança pública, segundo a visão da equipe de Temer, que trouxe para si o assunto eleito pelo Congresso para ser o centro das atenções neste ano.

“Quem senta na cadeira tem a caneta. Temer é quem pode usar a máquina do Estado a favor dele e faturar sobre as melhoras na economia”, avalia Simão Silber, professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP.

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A escolha em trazer esse assunto para o centro do debate agora também mostra falta de opção. Será mais difícil para Temer e o Congresso adotarem a saúde e a educação como prioridade, com um orçamento apertado e dificuldade de mostrar resultados rápidos nessa área. Com a iminente troca dos ministros, também fica mais complexo propor projetos em áreas finalísticas, o que reduz a opção do Poder Executivo em abordar tais assuntos. 

Os pré-candidatos que estão no poder e junto com o governo tem de pegar carona nas ondas de debate criadas pelo governo este ano, em busca de votos mas também para aumentarem sua influência política, até mesmo para a composição do próximo governo eleito. 

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“Se eles desistirem desde já de terem papel na eleição, o que eles estariam fazendo aqui?”, afirma o analista da consultoria internacional Eurasia Silvio Cascione, em referência à atuação dos políticos em Brasília e em seus cargos nos Poderes Executivo e Legislativo. 

A intervenção retira votos de Bolsonaro e dá votos a Temer? 

O presidente Michel Temer deixou claro que quer se aproximar do cidadão, dando menos foco às pautas da economia (como à reforma da Previdência) para tratar de segurança pública. Para Cascione, o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) não perde com o patrocínio de Temer ao tema que é sua especialidade, o combate ao crime. “Metade da briga em uma eleição é para decidir a pauta e quem define a pauta sai em vantagem. Quando a pauta da campanha foca em segurança, você a está associando a um tema em que Bolsonaro é forte. A discussão, ao invés de girar em torno de saúde, educação, vai girar em torno de segurança, o que favorece Bolsonaro”, avalia. jair

Após o naufrágio da reforma da Previdência, o governo divulgou uma lista de 15 projetos que deve ser perseguida este ano, com grande maioria de temas complexos e ligados à economia, sem grande repercussão na vida prática do eleitor.

Analisamos quais devem ser as principais pautas patrocinadas por cada um dos principais elementos da corrida eleitoral neste momento. 

Michel Temer será mesmo candidato?

Ao deixar a reforma da Previdência para trás e assumir a pauta da segurança pública com a intervenção, Temer ganha fôlego e pode ganhar pontos com o eleitorado. Apesar de seu marqueteiro ter queimado a largada e lançado sua candidatura, analistas ainda consideram incerta sua candidatura. 

André César, cientista político e analista da Hold Assessoria Legislativa, avalia que Temer deixou de ser “um samba de uma nota só”, ao abrir o leque para além da melhora da economia e principalmente: pode conseguir com a intervenção retomar parte da aura do cargo do Presidente da República. 

“Temer retoma certo protagonismo que havia perdido. A figura do ‘golpista, vampiro, ilegítimo’ pode ser parcialmente superada, em outras bases, subindo degraus. Ele também retoma a força institucional do cargo. A figura do presidente é fundamental no nosso Presidencialismo. Nos últimos meses da gestão de Dilma Rousseff parte da força institucional foi perdida. Com essa ação ele retoma a caneta, a força do cargo, e dar outro norte para sua gestão”, avalia. 

Para Cascione, Temer corre altos riscos ao optar pela intervenção, mas é difícil que sua popularidade ou imagem com o eleitor piorem. Por isso, na visão do analista, ainda é improvável que Temer se candidate ou mesmo que faça um sucessor ao cargo. 

Temer ainda pode ganhar pontos ao eleger pautas de economia para serem encaminhadas este ano, mesmo que não sejam aprovadas, mantendo o mercado financeiro interessado em suas articulações. 

Jair Bolsonaro e a movimentação dúbia sobre intervenção no Rio

Sua primeira reação ao anúncio da intervenção federal foi criticá-la, afirmando que essa não seria a melhor resposta para o problema. Mas o deputado votou a favor do decreto e pode ter de reformular seu discurso para 2018. 

“Bolsonaro perdeu pelos dois lados e terá de redirecionar agora seu discurso. Se a operação der certo, o eleitor que hoje é apenas simpatizante do deputado pode pensar que Temer ou seu candidato são opções menos radicais dentro do Centro, mas que trazem soluções para o problema da segurança pública. Se a intervenção der errado, esse eleitor pode dizer que não é atacando na segurança que se resolve o problema”, aponta André César. 

Já o analista da Eurasia avalia de forma diferente. “Ele ganha quando se coloca o tema de segurança no centro da agenda. Mesmo que a intervenção seja bem sucedida, Bolsonaro vai poder dizer que ele estava certo, que seu principal assunto é importante. Se der errado, ele vai poder dizer que ‘com o Temer não ia dar certo, mas comigo sim’. Achamos que o Bolsonaro se beneficia, e mesmo com congresso falando de segurança”, pontua Cascione. 

O que Rodrigo Maia pode ganhar 

O presidente da Câmara tem variado quanto à defesa da intervenção na segurança, adotando cautela. Ele pode ser um dos maiores herdeiros da medida caso dê certo, mas também se arrisca ao defendê-la, ficando com o ônus junto ao seu eleitorado no Rio de Janeiro, em caso de insucesso. “Nos bastidores, apontam Maia como um elemento importante na intervenção, quem colocou os pingos nos is. Ele está jogando no plano institucional, sem se expor muito. Está jogando bem. Se entrar de cabeça e não der certo, se queima”, avalia César. 

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Defensor da liberação de posse de armas pelos civis, Maia tem encampado a segurança pública, pautando projetos sobre o tema na Câmara. Apesar disso, ele tem elegido temas importantes para o mercado e para o governo em seu discurso e mostra-se um fiscalista, ao defender redução do Estado e corte de gastos, um viés que agrada ao mercado financeiro. 

A privatização da Eletrobras entra nesse rol. O deputado – que é próximo do ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho; tem tido importante papel no processo. Foi ele quem exigiu que a Câmara tivesse protagonismo no tema, com tramitação via projeto de lei e não medida provisória como queria o governo. Ele também deve escolher o relator da medida, um deputado de seu partido, o mato-grossense Fábio Garcia. 

Ao mercado, Maia se apresenta como uma opção possível. Defensor do corte de despesas e da reforma da Previdência, o presidente da Câmara tem mencionado pautas econômicas como prioridades. Nesta quinta-feira (22), Maia defendeu o projeto de autonomia do Banco Central (BC). “Sou a favor. Não pelo lado fiscal, mas do ponto de vista da segurança jurídica que cria, no futuro gera impacto forte na taxa de juros e na decisão de investimentos. A introdução desse assunto será importante, não sei se em curto prazo”, afirmou. 

Henrique Meirelles perdeu oportunidade com Previdência

No final de 2017, o ministro da Fazenda tentou engatar a primeira em sua pré-campanha, mas acabou deixando o carro morrer com o sepultamento de sua principal pauta, a reforma da Previdência. Favorito do mercado financeiro, que torce em ver um presidente da República com o arquétipo de Meirelles, o ministro precisará reformular sua plataforma este ano. 

Desde o retorno dos trabalhos do Congresso, há cerca de duas semanas, Meirelles ainda não conseguiu encontrar sua nova pauta, mas segue defendendo medidas fiscais estruturais. Em entrevista no dia 21 de fevereiro, disse que os brasileiros verão um aumento brutal de impostos caso a reforma da Previdência seja não ocorra. 

Se ele aparecia como a estrela mais brilhante no panteão de Temer em 2017, quando a retomada econômica era a principal bandeira do governo, Meirelles corre o risco de ficar sem plataforma no momento mais importante da disputa eleitoral, neste ano, caso o debate fuja da economia e migre para a segurança pública. 

“Qual discurso que ele terá? Sai sem entregar nada”, avalia André César. 

Meirelles também tem pouco a ganhar, eleitoralmente, com a pauta econômica entre os 15 pontos apresentados agora pelo governo. “Aprovar ou não as 15 medidas faz pouca diferença para viabilizar uma candidatura. É mais importante para os políticos defenderem as bandeiras que estão ali do que elas de fato serem aprovadas. A bandeira econômica está colocada, e isso é bom para Temer, como para o Meirelles e até para o Maia, os ajuda a manter a simpatia do mercado”, destaca Silvio Cascione, que avalia que as pautas econômicas estão distantes do eleitorado e são difíceis de atraírem votos. 

Geraldo Alckmin  ainda busca uma plataforma principal

O governador de São Paulo, do PSDB, ainda tateia qual será sua plataforma principal e pode ter perdido com a defesa da intervenção na segurança pública. André César relembra que a ideia da criação de um Ministério da Segurança Pública já aparecia nas propostas do tucano, que perde essa pauta para Temer. “Temos de ver como o PSDB vai se comportar agora no Rio”, diz César. 

Também visto com bons olhos pelo mercado financeiro, ainda falta saber como o candidato – considerado pouco carismático para o eleitorado mais amplo – vai encontrar essa proximidade. A simplificação tributária, o primeiro tema da pauta prioritária do governo Temer, é um projeto do deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), o que pode render ativos para Alckmin. Mas o assunto é de difícil compreensão e não capitaliza votos. Caberá a Alckmin manter cativo quem já gosta dele, dentro do mercado financeiro. 

“Para o eleitor comum, são temas técnicos, que não vão viabilizar a candidatura ou colocar alguém num segundo turno. O Alckimin não está envolvido nessas pautas, mas escolheu o Pérsio Árida (economista e um dos criadores do Plano Real) para coordenar seu programa econômico. A intenção dele é se manter na mídia como o candidato com relação com o mercado, com a plataforma mais forte para ser o candidato que vai afastar o populismo, seja de esquerda ou de direita. E com o Pérsio, mostra que essa agenda de reformas vai continuar viva, nem que seja em 2019. Ele passa essa mensagem para o mercado”, avalia Cascione. 

A oposição fica sem rumo 

A oposição e os partidos ligados à esquerda ainda patinam para definir seu principal discurso. A intervenção federal os colocou em campo difícil: se criticam de forma geral, podem soar antipáticos aos problemas da população e parecerem entrincheirados em um espaço de elite, distantes da insegurança do povão. 

Os nomes que se apresentam com maior vantagem nas pesquisas de intenção de voto, fora do atual governo, são o do ex-presidente Lula, do ex-governador do Ceará e ex-ministro Ciro Gomes (PDT); da ex-ministra e senadora Marina Silva (Rede). Lula ainda é candidato incerto, com os desdobramentos de sua condenação. 

O analista André César avalia que a oposição demorou a responder ao anúncio da intervenção federal, o que indica a dificuldade em gerar um novo discurso. “Eles têm de fazer o discurso contrário, dizer que não se resolve assim, que é um problema social. Mas foram pegos de surpresa. Não tinham articulado nada, o que mostra as dificuldades técnicas. Estão batendo cabeça e correm um risco sério de parecerem antipáticos, como ficou com a criação do plano real, que chamaram de eleitoreiro e depois tiveram de voltar atrás”, avalia. 

Entre os principais nomes da esquerda, o prolongamento da indefinição quanto a Lula também atrapalha, pois atrasa alianças, o que também posterga a definição de pautas prioritárias. 

Ciro afirmou que a intervenção é uma medida “politiqueira” e que não vai funcionar, promovendo “ilusão” na população de que o problema será resolvido. Já Marina defendeu a medida, mas chamou de “medida extrema”.

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