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| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O senador Renan Calheiros (MDB-AL) tem sido um dos principais personagens da política brasileira desde a redemocratização, em 1985. Já teve momentos de baixa. Mas sempre conseguiu se reerguer para retornar ao centro do poder. Novamente agora, pode voltar a dar as cartas em Brasília: é visto como um dos favoritos para se eleger (pela quinta vez) presidente do Senado. Mas, enfim, qual é o segredo de Renan? De onde vêm tanto poder e influência?

Parte da resposta é que Renan Calheiros não se prende à ideologia, mas sim ao puro pragmatismo. Por astúcia ou sorte, costuma “surfar” a onda do momento. É governo quando o governo tem aprovação popular (e sabe aproveitar as vantagens do poder). Mas migra para a oposição quando a gestão começa a cair em desgraça. Outra explicação está na personalidade de Renan. Ele sabe fazer amigos e influenciar pessoas – o que o torna um hábil articulador político.

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O segredo da personalidade: educado, agregador e corporativista

Quem convive com o senador alagoano repara na sua educação: é firme, mas dificilmente ofende alguém, mesmo quando está numa acalorada discussão política com algum oponente. Também é agregador e hospitaleiro. Nos anos 1990, quando era líder do governo Collor na Câmara, por exemplo, abria sua casa em Brasília uma vez por semana para políticos e jornalistas se encontrarem em animadas peladas. Nos últimos meses, após as eleições, recebeu em seu gabinete uma romaria de senadores e deputados eleitos interessados em saber como funcionam as máquinas do poder no Congresso.

Renan e Moro em audiência no Senado que discutiu o projeto de lei do abuso de autoridade: senador era o autor da proposta criticada pelo ex-juiz e hoje ministro de Bolsonaro.Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

Também conta muito a favor de Renan o seu corporativismo. Ele defende a classe política com unhas e dentes. Foi um dos primeiros a dar a cara à tapa para criticar a Lava Jato. No auge da operação, tirou do papel o projeto de lei contra o abuso de autoridade – visto pela força-tarefa como uma tentativa de intimidar juízes e procuradores. Políticos com problemas na Justiça ou no Ministério Público – e mesmo aqueles que não têm pendências, mas que acham que podem virar alvo – se sentem protegidos pelo senador de Alagoas.

No lugar certo, na hora certa

Renan Calheiros também construiu seu poder e influência por estar no lugar certo no momento certo. Desde a década de 1990, apoiou todos os presidentes: Fernando Collor (1990-1992), Itamar Franco (1992-1994), Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), Lula (2003-2010), Dilma Rousseff (2011-2016) e Michel Temer (2016-2018). Em troca, indicou aliados para cargos importantes – o que aumentou sua rede de influência. Agora, para se eleger presidente do Senado, começou a falar a mesma língua de Bolsonaro.

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Mas Renan também sabe ser oposição quando lhe convém. Rompeu com os três presidentes que viram seus índices de popularidade caírem ao chão devido a denúncias de corrupção: Fernando Collor, Dilma e Temer.

Renan começou a vida política na esquerda...

A trajetória política de Renan Calheiros começou no movimento estudantil, no fim da década de 1970. Nesse período, ingressou no MDB – partido de oposição à ditadura militar (1964-1985) que viria a se tornar PMDB e, mais recentemente, voltar a ser MDB. Era um período em que o regime dos generais já enfrentava forte desgaste. O alagoano se beneficiou do momento: elegeu-se em 1978 para seu primeiro cargo público, deputado estadual.

Na eleição seguinte, em 1982, chegou à Câmara dos Deputados. Embora novato, destacou-se e foi escolhido vice-líder da bancada do PMDB em 1984 e 1985. Teve uma atuação de esquerda: foi contrário aos decretos-leis que promoviam um arrocho salarial; e votou a favor do projeto que proibia a demissão sem justa causa dos trabalhadores. Apoiou a eleição à Presidência de Tancredo Neves no colégio eleitoral, contra o candidato do regime militar, Paulo Maluf. Na legislatura seguinte, foi deputado constituinte – quando defendeu a regulamentação do direito de greve e as desapropriações de terras produtivas para a reforma agrária.

... mas deu uma guinada à direita com Collor e FHC

Licenciou-se do mandato de deputado entre 1988 e 1989 para assumir a Secretaria de Educação de Alagoas no governo de seu então aliado Fernando Collor, que então comandava o estado. Collor se elegeria presidente meses depois com uma plataforma política de direita. E Renan, que era de esquerda, ganhou a liderança do governo na Câmara. Uma de suas primeiras missões foi defender o impopular pacote econômico que confiscou a poupança dos brasileiros. “O Brasil mudou em dezembro [data do segundo turno da eleição de 1989], (...) e quem não entendeu isso vai perder o bonde da História”, disse Renan à época.

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Mas o então deputado alagoano romperia com Collor logo depois. Em outubro de 1990, o hoje senador concorreu ao governo de Alagoas. Perdeu para Geraldo Bulhões. Acusou-o de ter fraudado as eleições. E esperava ter o apoio do então presidente. Mas Collor, que era amigo de Bulhões, ficou em silêncio. Renan, sentindo-se traído, rompeu com o aliado e alinhou-se com a oposição.

Teve sorte. Em 1992, o então presidente foi alvo de denúncias de corrupção e sofreu impeachment. O novo presidente, Itamar Franco, deu-lhe o cargo de vice-presidente da Petrobras Química (Petroquisa), que ocupou entre 1993 e 1994.

Renan Calheiros elegeu-se senador pela primeira vez justamente em 1994. O presidente era o tucano FHC, que implantou uma agenda “neoliberal”. O alagoano acompanhou os ventos. Coordenou no Senado um grupo de trabalho para cortar gastos desnecessários na Casa – eram tempos de aperto de cinto. Apoiou a desvinculação de até 20% das despesas obrigatórias da União em saúde e educação para que o governo pudesse gastar onde bem entendesse. Votou a favor da emenda constitucional que permitiu a Fernando Henrique concorrer à reeleição. Foi nomeado ministro da Justiça por FHC. De volta ao Senado, defendeu a aprovação do Estatuto do Desarmamento – que hoje o governo Bolsonaro pretende revogar.

Lula presidente: esquerda volver

Reeleito ao Senado em 2002, Renan mudou de lado logo em seguida. Havia uma nova “onda”. Desta vez, de esquerda. Lula estava na Presidência; e o senador alagoano negociou a adesão de seu partido, o PMDB, ao governo petista em troca de cargos.

Lula retribuiu pessoalmente em 2005: apoiou publicamente o nome de Renan para a presidência do Senado. Deu certo. Pela primeira vez o alagoano venceu a disputa pelo comando da Casa. Em 2006, Renan articulou o apoio do PMDB à reeleição de Lula.

A jornalista Mônica Veloso, pivô do primeiro grande escândalo a atingir Renan.Foto: Lula Marques /Folhapress

Em 2007, Renan se reelegeu à presidência do Senado. Mas não tardou para virar alvo de sua primeira grande denúncia de corrupção: foi acusado de receber propina da empreiteira Mendes Júnior para custear as despesas da jornalista Mônica Veloso, amante de Renan com quem teve uma filha.

As acusações contra o alagoano passaram a se suceder: concessões de benefícios à Schincariol em troca de favores; uso de notas frias para compra de gado; desvio de dinheiro público em ministérios comandados pelo PMDB.

Ele passou a correr risco de perder o mandato. E então negociou uma saída honrosa: renunciou à presidência do Senado; e foi salvo da cassação pelo plenário da Casa.

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Aliança com Dilma foi até o limite. Mas então Renan entrou no barco de Temer

Renan viria a se reeleger ao terceiro mandato no Senado em 2010. O PT continuava na Presidência; desta vez com Dilma. Renan manteve sua aliança com os petistas. Apoiou, por exemplo, a PEC que garantiu direitos trabalhistas para as empregadas domésticas (medida que Bolsonaro, como deputado, foi contra).

Em 2013, Renan voltou ao comando da Casa. Foi nesse ano que o país entrou em ebulição com as Jornadas de Junho. O governo Dilma começava a balançar. A petista se reelegeu em 2014, com o apoio do PMDB. Renan permaneceria fiel à presidente por um bom tempo. Ambos tinham um interesse em comum: enfrentar a Lava Jato, que viria a atingir os dois.

Mas o país estava embarcando em uma nova onda. Renan embarcou nela: votou a favor do impeachment de Dilma e passou a apoiar o governo de Temer – com quem já havia tido atritos dentro do PMDB. Como presidente do Senado (reeleito para o biênio 2015-2016), Renan colocou em pauta os projetos de interesse do governo, como a PEC do Teto de Gastos e a reforma trabalhista – propostas duramente criticadas pela esquerda.

De Temer a Lula. E agora, acenos a Bolsonaro

Renan, Lula e Renan Filho: depois de apoiar o impoeachment, senador voltou a se aliar ao PT.Foto: Ricardo Stuckert/Fotos Públicas

Mas o apoio de Renan a Temer foi relativamente curto. O então presidente tinha índices de popularidade baixíssimos e Renan viu sua reeleição ao Senado ameaçada. Como o eleitorado de Alagoas demonstrava ser majoritariamente a favor do PT, o senador rompeu com o presidente e reaproximou-se de Lula – que então era pré-candidato a presidente. Lula teve sua candidatura barrada. Mas Renan apoiou Fernando Haddad (PT) contra Bolsonaro em 2018.

O senador renovou seu mandato nas urnas, apesar de ver multiplicarem-se as denúncias da Lava Jato contra ele. Mas quem chegou ao Planalto foi o ex-capitão do Exército, seu adversário que levou ao governo o ex-juiz da operação, Sergio Moro.

Nenhum problema para o alagoano, que passou a se autointitular um “novo Renan” e a defender propostas de Bolsonaro. “O velho [Renan] era sobrevivente, mais estatizante. Esse novo, não. É mais liberal e está querendo fazer as reformas de Estado”, disse recentemente o senador. São os novos tempos.

Colaborou Lúcio Vaz

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