A advogada Bruna Morato, que depõe à CPI da Covid do Senado nesta terça-feira (28), afirmou que o Ministério da Economia do governo de Jair Bolsonaro teve conexões com o chamado "gabinete paralelo", conjunto de médicos e pesquisadores que prestou assessoria informal ao presidente em questões ligadas à pandemia de coronavírus e concedeu informações contrárias às das autoridades de saúde.
Segundo Morato, houve uma "aliança" entre membros do Ministério da Economia e médicos vinculados à empresa Prevent Senior. A parceria, de acordo com ela, tinha como objetivo estimular a adoção ao tratamento precoce contra a Covid-19 e, assim, frear medidas de restrição das atividades comerciais e de lockdown. "O objetivo era conceder esperança. E a esperança tinha nome: hidroxicloroquina", afirmou a advogada, citando o medicamento mais relacionado ao tratamento precoce.
A advogada mencionou o nome dos médicos Anthony Wong (morto no início do ano) e Nise Yamaguchi e do virologista Paolo Zanotto como representantes do diálogo entre a empresa e o governo brasileiro.
Morato é advogada de médicos que deixaram a Prevent Senior por discordarem de práticas efetuadas pela companhia. Eles, em conjunto com a advogada, elaboraram um dossiê com as supostas irregularidades praticadas pela empresa - a lista contém ações como ocultação de informações sobre tratamento a pacientes e familiares, manipulação de dados de falecimentos e adoção massiva do tratamento precoce. A Prevent Senior alega que o dossiê é resultado de invasão a seus sistemas e adulteração de dados.
A advogada relatou à CPI que, desde que suas acusações vieram a público, passou a sofrer ameaças. Ela contou que o seu escritório foi invadido e vandalizado, em uma ação que não guardava semelhanças com as feitas para a execução de assaltos.
"Existia uma megalomania"
A advogada disse que membros da Prevent tinham pretensão de criar novos protocolos para o combate à Covid-19, com diretrizes que teriam impacto mundial. "Existia uma megalomania", relatou. Conversas apreendidas pela CPI identificaram médicos da comissão dizendo que as pesquisas em curso na empresa poderiam "mudar o rumo da medicina".
Morato reiterou que a Prevent Senior determinava que seus médicos ministrassem o tratamento precoce aos seus pacientes, ainda que um profissional julgasse que a medida pudesse não ser a adequada para um caso específico. Segundo ela, médicos diziam que, se não adotassem o tratamento precoce, seriam demitidos.
A Prevent Senior ganhou notoriedade por distribuir aos seus pacientes o chamado "kit covid", uma caixa com medicamentos como cloroquina, ivermectina e zinco. À CPI, porém, o diretor da empresa, Pedro Batista, disse que o kit não era uma imposição, e sim uma sugestão que a companhia apresentava aos seus integrantes.
A advogada afirmou que o kit chegava "lacrado" aos médicos e que a determinação imposta aos profissionais feria a autonomia médica. Segundo ela, a Prevent Senior aplicava uma "política de coerção" sobre seus profissionais.
Ela disse ainda que a Prevent Senior utilizava critérios econômicos para influenciar na utilização de medicamentos. A Prevent Senior, segundo ela, verificava que os custos com medicamentos eram menores do que os para a manutenção de um paciente em uma UTI.
CPI ouvirá empresário na quinta e já não fala em término
Antes do depoimento de Morato, a CPI aprovou o requerimento de convocação para o empresário Otávio Fakhoury. Ele deverá falar ao colegiado na terça-feira (30).
Fakhoury é apoiador do governo Bolsonaro e, segundo membros da CPI, atuou na disseminação de notícias falsas sobre a pandemia. Ele recentemente se tornou o presidente do diretório estadual do PTB em São Paulo.
A convocação de Fakhoury foi pedida pelo vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP). O parlamentar afirmou, na manhã desta terça, que evita prever uma data de término para os trabalhos da comissão. Segundo ele, os acontecimentos dos últimos dias motivam a realização de novos depoimentos.
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