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Jair Bolsonaro e Davi Alcolumbre: negociação de um acordo econômico ou interesses pessoais?
Jair Bolsonaro e Davi Alcolumbre: negociação de um acordo econômico ou interesses pessoais?| Foto: Alan Santos/PR

O presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (DEM-AP), adiou mais uma vez na terça-feira (15) a votação do veto do presidente Jair Bolsonaro à lei que ampliou até o fim de 2021 a desoneração da folha salarial. Um dia depois, a Advocacia-Geral da União (AGU), um órgão do governo federal, enviou parecer ao Supremo Tribunal Federal (STF) em que se posiciona a favor da possibilidade de que as regras sobre reeleição dos presidentes de Câmara e Senado sejam definidas pelas próprias casas – o que favorece as pretensões de Alcolumbre, que não esconde a vontade de seguir no comando do Senado.

Os dois fatos levantaram a dúvida: Alcolumbre estaria segurando a apreciação do veto à desoneração em troca do apoio do Planalto em sua tentativa de se reeleger presidente do Senado? Parte dos senadores acredita que sim. Mas aliados do governo negam e argumentam que Alcolumbre, ao adiar a votação dos vetos, apenas está permitindo a negociação de um acordo em torno das desonerações.

Entenda o caso envolvendo Alcolumbre e a desoneração

A manifestação da AGU ao STF se deu em uma ação movida pelo PTB. O partido, aliado do governo Bolsonaro, havia acionado preventivamente a Corte para barrar a articulação para uma nova candidatura de Alcolumbre e também do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Atualmente, o entendimento é de que a Constituição veda a reeleição dos parlamentares às presidências dentro de uma mesma legislatura.

A manifestação da AGU se soma a esforços de aproximação feitos por Alcolumbre e pelo Palácio do Planalto nas últimas semanas, e que têm como exemplo a decisão do presidente do Senado de promover sucessivos adiamentos da votação do veto de Bolsonaro ao projeto de lei sobre a tributação da folha de pagamento.

Alcolumbre reagendou a sessão de apreciação do veto para o próximo dia 30. Até o início desta semana, a expectativa era de que o veto fosse votado em sessão do Congresso desta quarta (16) ou nesta quinta (17). Ao cancelar a sessão desta semana, Alcolumbre justificou que o Senado precisava cumprir uma série de votações de indicações de autoridades, que estavam na "fila" desde o início da pandemia de coronavírus. Como presidente do Senado e do Congresso, é Alcolumbre quem marca a votação de vetos.

A ampliação da desoneração foi aprovada pelo Legislativo em junho, como resultado de uma medida provisória (MP) editada pelo governo dois meses antes. Na MP, o Planalto autorizou empresas a renegociarem contratos para redução de jornadas de trabalho e salários, no contexto da pandemia de coronavírus. Porém, durante a tramitação da medida no Congresso, parlamentares incluíram na MP a prorrogação até dezembro de 2021 da desoneração da folha de pagamento de 17 setores.

O desejo do governo era de que a medida vigorasse apenas até o fim de 2020, como estava previsto na legislação anterior. A prorrogação da desoneração significa que o governo terá perda de receitas no ano que vem. Por causa disso, Bolsonaro vetou esse ponto da lei quando promoveu a sanção da MP, em julho.

Desde então, Alcolumbre não colocou o veto em pauta – o que desagrada grande parte do Legislativo, já que parlamentares sinalizam interesse em derrubar a decisão de Bolsonaro.

A votação do veto é também cobrada por representantes do setor produtivo. Em entrevista ao Jornal da Band, o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), José Velloso, disse que "o empresariado quer ter previsibilidade", e que por isso espera uma definição a respeito as regras que valerão sobre a folha de pagamento. Os 17 setores beneficiados com a desoneração prevista em lei são responsáveis por 6 milhões de empregos.

"Alcolumbre está dedicado a dois projetos eleitorais", diz senador

O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) está entre os parlamentares que cobra de Alcolumbre a realização da votação sobre o veto de Bolsonaro.

"É uma medida de uma importância muito grande para a retomada de empregos. A pandemia agravou o quadro, e não faz sentido voltar a onerar a folha de pagamento", diz Vieira. Na avaliação dele, a tendência do Congresso, hoje, é de derrubar o veto do presidente.

O senador Vieira declarou à Gazeta do Povo que Alcolumbre tem feito das tratativas para sua reeleição "uma questão pública", o que tem influenciado a agenda do Congresso e o trato do presidente do Senado com os outros integrantes da Casa.

"Ele, infelizmente, tem se dedicado a dois projetos eleitorais: o seu [de reeleição à presidência do Senado] e o do irmão, que é candidato a prefeito de Macapá", afirmou. O irmão de Alcolumbre citado por Vieira é Josiel, que é suplente do presidente no Senado e pré-candidato na capital do Amapá.

"Essa informação não procede", diz vice-líder do governo sobre articulação

Vice-líder do governo no Senado, Chico Rodrigues (DEM-RR) afirma que a motivação para os adiamentos na votação do veto à desoneração da folha de pagamento é a busca pela redação de um texto que satisfaça as condições da equipe econômica do governo federal.

"Nós ainda estamos vendo com a equipe econômica como conduzir, para aí formarmos um juízo de valor", declarou o parlamentar, que é vice-líder do governo no Senado. O Ministério da Economia argumenta que pretende propor um projeto alternativo que permita a desoneração permanente da folha salarial. Mas, até agora, não encontrou as fontes de receita que permitam que isso seja feito.

Rodrigues afirma ainda que "não procede" a informação de que Alcolumbre estaria buscando agradar o Palácio do Planalto para, em troca, receber do Executivo apoio na sua tentativa de concorrer a um novo mandato. O senador diz considerar Alcolumbre um "parceiro do Brasil" e um "árbitro" na mediação dos interesses do Congresso e do governo.

Apesar disso, ele próprio admite ser a favor da reeleição de Alcolumbre. "Eu seria favorável a uma nova candidatura dele", diz. Para o senador, a autorização a Alcolumbre poderia vir tanto por meio de uma decisão do STF quanto com uma proposta de emenda à Constituição (PEC), que seria aprovada pelo próprio Congresso.

No início do mês, a senadora Rose de Freitas (ES) apresentou uma PEC para permitir a reeleição de presidente do Senado e da Câmara. A proposta levou a senadora a se desfiliar do Podemos, já que o partido é contrário à iniciativa e anunciou que suspenderia a parlamentar.

Mudança nas regras corre contra o tempo

A alteração nas regras desejada por Alcolumbre tem prazo para acontecer. Isso porque o mandato atual dele no comando do Senado se encerra em fevereiro. Até antes disso, portanto, o imbróglio em torno de sua candidatura precisa estar sanado.

As PECs são as propostas de tramitação mais lenta no Congresso. Demandam a criação de comissão especial e votações em dois turnos, tanto na Câmara quanto no Senado. A autorização via STF seria um caminho mais rápido.

O advogado Eduardo Tavares explica que a pauta do STF é definida pelo presidente da Corte, que não necessariamente tem que se ater ao calendário de outras instituições. Portanto, o atual chefe do Supremo, Luiz Fux, não teria a obrigatoriedade de concluir o processo antes de fevereiro.

"Porém, a razoabilidade e a segurança jurídica são princípios que devem ser observados, e por isso é possível que o processo seja levado a julgamento antes do recesso forense", diz Tavares, que é especialista em Direito Eleitoral e membro fundador da Academia Brasileira Eleitoral. "A celeridade na tomada de decisões que atingem a sociedade brasileira e impactam situações emergentes permitem a adoção de pauta imediata."

Caso não haja uma definição sobre alterações – nem com a aprovação de uma PEC, nem com a conclusão do julgamento do Supremo – fica valendo a proibição atual. Com isso, Alcolumbre e Maia permaneceriam impedidos de concorrer a um novo mandato.

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