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Governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), conseguiu um habeas corpus no STF que o desobriga de comparecer à CPI da Covid no Senado.
Governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), conseguiu um habeas corpus no STF que o desobriga de comparecer à CPI da Covid no Senado.| Foto: Bruno Batista/ VPR

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que desobrigou o governador do Amazonas de prestar depoimento à CPI da Covid, nesta quinta-feira (10), atingiu em cheio a estratégia governista de envolver estados e municípios na investigação sobre ações e omissões do poder público na pandemia. Senadores mais alinhados ao Palácio do Planalto temem que outros governadores sigam o mesmo caminho judicial de Wilson Lima (PSC) e também não compareçam ao colegiado.

"Eu espero que isso não abra precedente para os outros governadores — e para os prefeitos também. Essa decisão de hoje frustrou o povo brasileiro", disse, em entrevista coletiva, o senador Eduardo Girão (Podemos-CE). Na mesma linha, o senador Luis Carlos Heinze (PP-RS) afirmou esperar que “isso [o habeas corpus] não se torne rotina para outros governadores, outras pessoas”.

Alessandro Vieira (sem partido-SE), em coletiva após a sessão da CPI desta quinta, declarou que a ausência de Lima não interfere na convocação de outros governadores. O senador Rogério Carvalho (PT-SE) foi na mesma linha: "a ausência do governador não atrapalha em nada o andamento dos trabalhos da CPI". O petista apresentou a sugestão de fazer com que a comissão transforme os requerimentos de convocação dos governadores em convites, assim evitando impedimentos jurídicos.

A autorização para que Wilson Lima não comparecesse à CPI foi concedida pela ministra do STF Rosa Weber em decisão liminar na quarta-feira (9), véspera do dia marcado para o depoimento. A magistrada alegou que o governador já é investigado, no âmbito da Operação Sangria, e que sua presença à CPI equivaleria a uma condução coercitiva — prática vetada pelo tribunal em 2018. Lima alegou que poderia "sofrer constrangimentos físicos ou morais" em sua presença no Congresso.

A Operação Sangria investiga denúncias de corrupção na saúde pública do Amazonas e teve sua quarta fase deflagrada no último dia 2. A ação levou à prisão de Marcellus Campêlo, que até então exercia o cargo de secretário de Saúde do estado e que também está convocado para falar à CPI.

O presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), anunciou que recorrerá da decisão de Weber. O tema ainda deve ser analisado pelo plenário do STF.

A CPI da Covid tem agendados os depoimentos de outros sete governadores: Helder Barbalho (MDB-PA), no dia 29; Wellington Dias (PT-PI), no dia 30; Ibaneis Rocha (MDB-DF), no dia 1º de julho; Mauro Carlesse (PSL-TO), em 2 de julho; Carlos Moisés (PSL-SC), em 6 de julho; Antônio Denarium (PSL-RR), em 7 de julho; e Waldez Góes (PDT-AP), em 8 de julho.

Uma ação conjunta no STF contesta a convocação de governadores. Dezoito estados pedem para que a corte proíba a CPI da Covid de convocar chefes de Executivos estaduais a depor. A relatora do caso é a ministra Rosa Weber.

Nesta quinta-feira, a Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestou na ação defendendo a regularidade na convocação de governadores pela CPI. Rosa deve decidir nos próximos dias se concede um "'salvo-conduto" aos chefes de Executivos estaduais a exemplo do que fez com Wilson Lima.

Convocação de governador é "cabo de guerra" histórico da CPI

A presença de governadores entre os depoentes da CPI da Covid é um dos temas de maior controvérsia da comissão, e que sempre motivou embate entre os senadores que apoiam e os que fazem oposição ao governo Jair Bolsonaro.

Os parlamentares bolsonaristas entendem que os principais problemas na gestão do combate à pandemia no Brasil se deram por corrupção ou aproveitamento inadequado de verbas que o governo federal enviou a estados e municípios. Já a oposição acredita que os equívocos foram cometidos por Palácio do Planalto e Ministério da Saúde, e que o direcionamento do debate sobre estados e municípios é uma "cortina de fumaça" para desviar o foco do presidente da República.

"A gente sempre soube, desde o início, que a convocação de governadores seria muito difícil pela CPI, porque eles têm um foro específico, um Parlamento específico para fazer comissões parlamentares de inquérito no âmbito estadual, que são as Assembleias Legislativas", declarou Rogério Carvalho.

Outro argumento apresentado por opositores é o de que a Constituição e o Regimento do Senado impedem que a Casa faça investigações sobre assuntos relacionados aos estados. Como resposta, os governistas alegam que o envio de verbas federais "nacionaliza" a discussão e permite a atuação da CPI.

Apesar dos polos opostos, a presença de Lima na CPI contraria a regra por conter elementos que interessam tanto a governistas quanto a oposicionistas. Os governistas querem a apuração sobre o dinheiro repassado pelo governo federal ao Amazonas. Os adversários de Bolsonaro querem ouvir do governador amazonense informações sobre a crise da falta de oxigênio no estado no início do ano, que se deu principalmente em Manaus.

O episódio tem sido recorrentemente abordado na CPI e, para oposicionistas, revela a incompetência do governo federal e o interesse em investir em teses controversas contra a Covid-19, como o "tratamento precoce" e a "imunidade de rebanho".

Foi a crise de Manaus que levou à divulgação do TrateCov, o polêmico aplicativo que o Ministério da Saúde teria desenvolvido para auxiliar médicos no tratamento de pacientes com Covid-19. O aplicativo, quando tornado público, sugeria a indicação de cloroquina para pacientes de todos os perfis, o que não é recomendado pelas autoridades de saúde. O ministério afirmou que o vazamento foi fruto de ação de hackers.

O relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), foi um dos poucos senadores que elogiou a decisão de Rosa Weber de permitir que Lima não fosse a CPI. O emedebista chamou a medida de "decisão coerente" e falou que "o Senado não pode ultrapassar sua própria competência" ao querer investigar o governador. Na mesma linha, o senador Fabiano Contarato (Rede-ES) declarou que a medida da ministra do STF se conecta com a expressão "cada macaco no seu galho".

O senador Humberto Costa (PT-PE) disse que a CPI pode, se a vedação da presença de governadores for ampliada, estudar a convocação de secretários ou outros gestores estaduais, que poderiam falar sobre a gestão das verbas nos estados.

Rogério Carvalho declarou que pretende "apresentar um requerimento de convite para todos os presidentes dos consórcios de governadores de todas as regiões do país para que espontaneamente, prestem esclarecimentos sobre as dificuldades em atuar no controle da pandemia, com o governo federal agindo na direção contrária, ou seja, para expandir o vírus no país".

PGR não vê irregularidade na convocação de governadores pela CPI

A Procuradoria-Geral da República defendeu em parecer enviado ao gabinete da ministra Rosa Weber, no STF, a regularidade na convocação de governadores para prestar depoimento na CPI da Covid no Senado.

Assinada pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, a manifestação aborda dois pontos: a competência do Congresso Nacional para investigar autoridades estaduais e a imunidade, prevista na Constituição, que garante aos chefes do Poder Executivo o direito de silenciar em comissão parlamentares.

Na avaliação de Aras, governadores podem ser convocados para prestar informações ao Senado porque a investigação da CPI da Covid tem interesse na aplicação de recursos federais, o que está na esfera de competência no Congresso. Ele afasta a tese de violação ao pacto federativo.

"Fixadas essas premissas — a de que o Congresso Nacional tem competência para fiscalizar a aplicação dos recursos federais e a de que qualquer pessoa que utilize, guarde, gerencie ou administre bens da União tem o dever de prestar contas —, a convocação de governadores de estado para prestar depoimento em comissão parlamentar de inquérito instalada em uma das casas do Congresso Nacional é decorrência lógica, desde que circunscrita à prestação de contas da aplicação dos recursos federais repassados", escreveu.

O procurador-geral também rebateu o argumento de que o direito ao silêncio em comissões parlamentares, garantido ao presidente pelo artigo 50 da Constituição, valeria também para governadores. Aras afirma que, por simetria, as autoridades estaduais só podem fazer uso da prerrogativa quando convocadas pelas Assembleias Legislativas.

Em manifestação enviada ao Supremo, a Advocacia-Geral do Senado também defendeu os depoimentos. No documento, o Senado diz que "nenhuma autoridade ou poder está acima da lei" e afirma que as convocações não merecem "censura constitucional".

"A oitiva desses atores é fundamental para o êxito do objetivo da CPI, que também envolve apurar os resultados e a efetividade de transferências voluntárias federais feitas aos demais entes federados, a fim de aperfeiçoar a regulação do tema", defendeu a Casa Legislativa.

CPI promove audiência com especialistas nesta sexta

Sem o depoimento de Wilson Lima, a CPI fez nesta quinta uma sessão para debate e votação de requerimentos. O resultado foi a aprovação da quebra de sigilos de pessoas que ocupam ou ocuparam cargos-chave no governo Bolsonaro.

Entre os alvos, estão os ex-ministros Eduardo Pazuello (Saúde) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores); Mayra Pinheiro, secretária de Gestão do Trabalho e Educação do Ministério da Saúde, conhecida como "Capitã Cloroquina" e o assessor internacional da Presidência da República, Filipe Martins. Também estão no foco membros do suposto "gabinete paralelo" da saúde, como o empresário Carlos Wizard Martins e o virologista Paolo Zanotto.

Nesta sexta-feira (11), a CPI faz audiência com a microbiologista Natalia Pasternak e com o médico Cláudio Maierovich, ex-presidente da Anvisa.

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