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Presidente Jair Bolsonaro cercado por generais em cerimônia no Palácio do Planalto.
Presidente Jair Bolsonaro cercado por generais em cerimônia no Palácio do Planalto.| Foto: Isac Nóbrega/PR

O governo federal mudou quatro dos sete membros que compõem a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos. Um ex-assessor da ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, dois militares e um deputado do PSL substituíram quatro nomes indicados por governos anteriores.

A mudança na comissão ocorre logo depois de uma declaração polêmica do presidente Jair Bolsonaro sobre Fernando Augusto Santa Cruz de Oliveira, militante antiditadura que desapareceu em fevereiro de 1974, no Rio de Janeiro. Fernando era pai de Felipe Santa Cruz, atual presidente da Ordem dos Advogados do Brasil. Bolsonaro disse: "Um dia, se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, conto pra ele. Ele não vai querer ouvir a verdade."

A ex-presidente da CEMDP, a procuradora da República Eugênia Gonzaga, criticou Bolsonaro por essa declaração três dias antes de ser exonerada. Em seu lugar, assumiu a presidência da Comissão o advogado Marco Vinicius de Carvalho, que era assessor de Damares.

Rosa Maria Cardoso da Cunha, que já foi advogada da ex-presidente Dilma Rousseff, foi substituída por Weslei Antônio Maretti, coronel reformado do Exército, que já defendeu Carlos Brilhante Ustra, oficial do Exército que foi reconhecido pela Justiça como torturador.

João Batista da Silva Fagundes, único militar que ocupava um posto na comissão (há uma vaga obrigatória reservada a um membro do Ministério da Defesa), deu lugar a Vital Lima Santos, tenente-coronel e ex-assessor do chefe de gabinete do atual ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva. Com isso, dois militares passam a compor a comissão.

Por fim, trocou-se PT por PSL: o deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) foi substituído pelo deputado federal Filipe Ribeiro (PSL-PR), na vaga que é destinada à Câmara dos Deputados.

O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos indicou em nota que a mudança na comissão, apesar de concluída só agora, no auge da polêmica, foi solicitada no dia 28 de maio. Segundo o ministério, a decisão foi tomada para "otimizar os trabalhos" da comissão, com o interesse de "acelerar o serviço para que os familiares requerentes obtenham as respostas sobre o paradeiro de seus entes queridos".

O presidente Bolsonaro, em declaração nesta quinta-feira (1º), no Palácio da Alvorada, foi mais direto sobre os motivos da mudança: "é que mudou o presidente. Agora é o Jair Bolsonaro, de direita. Ponto final."

Primeiro passo concreto para mudar narrativa sobre golpe de 1964

A mudança na comissão é mais um gesto do presidente Jair Bolsonaro no empenho de mudar a narrativa imperante sobre a época do regime militar, que vigorou no Brasil entre 1964 e 1985. Desde a década de 1990, Bolsonaro defende publicamente esse período da história política do Brasil.

Em 2012, parlamentares do PSOL e do PT pediram a abertura de processo disciplinar contra o então deputado Bolsonaro, por ter tentado impedir uma reunião em que testemunhas de violência da ditadura militar davam depoimentos na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. Em 2014, também na Câmara, Bolsonaro pediu a realização de uma sessão para comemorar o regime militar. O pedido foi negado pelo então presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (MDB-RN).

Em março deste ano, Bolsonaro causou polêmica ao dizer em entrevista a José Luiz Datena, da Band, que nunca houve ditadura militar no Brasil. Uma frase parecida havia sido dita por ele em 2016, pelo Twitter.

A decisão tomada nesta quinta-feira é simbólica porque Bolsonaro saiu do discurso e tomou pela primeira vez uma medida concreta para promover a mudança de narrativa sobre a ditadura. Mas, desde que assumiu a presidência da República, já tinha dado alguns sinais de que tomaria medidas nesse sentido.

No início de seu mandato, falou que a Comissão de Anistia, que está sob a responsabilidade do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, restringiria a concessão de indenizações para perseguidos políticos. De fato, até agora, há mais indenizações sendo negadas do que em governos anteriores. Além disso, em março, o governo anunciou oficialmente que o Ministério da Defesa poderia voltar a comemorar o golpe de 31 de março de 1964. Celebrações pela data haviam sido vetadas em 2011, pela então presidente Dilma Rousseff.

Em abril, pouco antes de deixar o cargo de ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez afirmou que os livros didáticos do país teriam seus conteúdos alterados para deixar de classificar como ditadura o período do regime militar. No entanto, em entrevista ao Estado de S.Paulo dada logo depois de substituir Vélez no ministério, Abraham Weintraub disse que não queria entrar nessa discussão.

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