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Ministro Celso de Mello: como sua saída do STF afeta Bolsonaro, Lula e a Lava Jato
Ministro Celso de Mello anunciou que se aposentador em 13 de outubro.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

A aposentadoria do ministro Celso de Mello no Supremo Tribunal Federal (STF) e a sua substituição por Kassio Nunes Marques aumentam a incerteza sobre julgamentos e investigações que têm potencial para mexer nos rumos da política brasileira. Celso de Mello é responsável pela condução de um inquérito que investiga o presidente Jair Bolsonaro, peça importante em um julgamento envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), além de geralmente ter participação decisiva em casos envolvendo a Lava Jato.

A saída de Celso de Mello e a provável entrada de Kassio Nunes Marques no STF embaralham o desfecho desses casos por dois principais motivos: não se sabe exatamente qual será a posição do novo ministro, e tampouco se ele vai herdar todos os processos que hoje estão com Celso de Mello.

Além disso, é provável que processos e inquéritos que fiquem com Kassio Nunes Marques sofram um atraso em seu trâmite. Primeiramente, seu nome terá de ser aprovado pelo Senado – num procedimento que tem de seguir determinados ritos, que podem ser lentos. Além disso, após tomar posse, ele terá de se inteirar de detalhes desses casos para tomar decisões.

A investigação contra Bolsonaro

Celso de Mello é o relator do inquérito que apura a suposta interferência de Bolsonaro na Polícia Federal, conforme denúncia feita pelo ex-ministro da Justiça Sergio Moro. Esse caso, em tese, dependendo das conclusões da investigação, pode levar à cassação de Bolsonaro.

Até agora, já foram colhidos uma série de depoimentos no inquérito – inclusive o de Moro. Ministros do governo, delegados da PF e até a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) também prestaram depoimento durante as investigações.

Ainda falta o depoimento de Bolsonaro para que as investigações possam ser encerradas. Em decisão recente, Celso de Mello determinou o depoimento presencial de Bolsonaro, contrariando pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) de que a oitiva fosse por escrito. Aliados do presidente veem o depoimento presencial como mais danoso à imagem do presidente do que o por escrito.

A Advocacia Geral da União (AGU) recorreu pedindo o depoimento por escrito. Como Celso de Mello restava de licença médica, o recurso ficou com o ministro Marco Aurélio Mello – que decidiu adiar o depoimento, que deveria ocorrer entre 21 e 23 de setembro. Uma nova data não foi marcada.

Quando a licença de Celso de Mello se encerrou, ele decidiu levar a decisão – se o depoimento de Bolsonaro será presencial ou por escrito – ao plenário virtual do STF. Mas, pouco depois, voltou atrás e decidiu que o caso será julgado no plenário real, por videoconferência.

A questão é que faltam menos de duas semanas para ele se aposentar (a data que Celso de Mello agendou para sair do STF é 13 de outubro). E o julgamento no plenário ainda tem de ser agendado pelo presidente do Supremo Luiz Fux.

Ainda que o STF decida logo como e quando será o depoimento de Bolsonaro, é muito improvável que o inquérito sobre a suposta interferência na PF seja concluído por Celso de Mello.

O regimento interno do Supremo prevê que o ministro que vai substituí-lo – no caso, Kassio Nunes Marques – herde todos os casos de Celso de Mello. Ou seja, um ministro indicado por Bolsonaro assumiria a relatoria do inquérito que investiga o presidente.

No entanto, é possível que o presidente da STF, Luiz Fux, sorteie outro ministro para o caso. Nos bastidores do Supremo existe a preocupação de que a Corte sofra desgaste caso o inquérito contra Bolsonaro seja conduzido justamente por um ministro indicado por ele.

O regimento interno do STF prevê que o presidente do Tribunal pode determinar a redistribuição de casos urgentes a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) ou de outras partes interessadas. Mas isso, em tese, só pode ocorrer se o cargo estiver vago por mais de 30 dias.

A aprovação do nome de Kassio Nunes Marques pelo Senado, contudo, pode ser mais rápida do que o normal. Isso porque Bolsonaro formalizou a indicação de seu escolhido nesta sexta-feira (1.º), antes mesmo da aposentadoria de Celso de Mello – o que não costuma ser a praxe.

Além disso, Bolsonaro hoje é aliado do presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), responsável por agilizar ou travar o andamento de qualquer matéria no Senado. E a Gazeta do Povo apurou que a sabatina de Kassio Nunes Marques no Senado, primeira etapa antes da aprovação definitiva no plenário, será em 14 de outubro – apenas um dia após a aposentadoria de Celso de Mello.

Isso indica uma intenção política de apressar a efetivação de Kassio Nunes Marques como ministro do STF. Mas, novamente, Luiz Fux também pode desacelerar esse trâmite. Também é o presidente do Supremo quem agenda a posse de novos ministros da Corte.

A família Bolsonaro também tem outro caso de seu interesse que hoje é de responsabilidade de Celso de Mello e que, eventualmente, poderá vir a ser herdado por Kassio Nunes Marques: as queixas do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente, no caso que ficou conhecido como “rachadinhas”. Celso de Mello já enviou para o plenário do STF a ação que questiona se o senador tem direito a foro privilegiado nas investigações.

Futuro político de Lula também será afetado

A aposentadoria de Celso de Mello e a sua substituição por Kassio Nunes Marques também afetarão o julgamento da ação que pede que seja declarada a parcialidade do ex-juiz Sergio Moro para julgar o ex-presidente Lula. Dependendo do resultado desse julgamento, as sentenças da Lava Lato contra Lula podem ser anuladas e o ex-presidente poderia voltar a poder concorrer em eleições.

O caso da suspeição de Moro está em análise na Segunda Turma do STF, composta por Celso de Mello, Edson Fachin, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski. Fachin e Cármen já votaram e são votos contrários à tese de que o ex-juiz da Lava Jato foi parcial na análise das ações penais envolvendo o petista. Já Lewandowski e Gilmar já indicaram, em votos de outros julgamentos, que vão considerar Moro parcial.

Dessa forma, o voto de minerva caberia à Celso de Mello, o quinto membro da Segunda Turma. Ainda não se sabe como o ministro votaria nesse caso. Celso costuma ser o fiel da balança no colegiado nos temas referentes à Lava Jato, ora votando a favor da operação, ora contra. Em outras ocasiões, Celso de Mello já considerou Moro parcial na condução de processos envolvendo o caso Banestado.

Kassio Nunes Marques em tese vai assumir a vaga de Celso de Mello na Segunda Turma. Se isso ocorrer, ele será ele quem decidirá o destino de Lula e manchará (ou não) a reputação de Moro. Curiosamente, ambos – Lula e Moro – são hoje adversários de Bolsonaro. E qualquer decisão que Marques venha a tomar poderá ser criticada por ele ter sido indicado pelo presidente.

O provável futuro ministro do STF é visto como um juiz "garantista" – ou seja, mais preocupado com os direitos e garantias fundamentais dos réus. Esse posicionamento é parecido com o de Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli, por exemplo. Esse cenário é positivo para Lula.

Kassio Nunes Marques, inclusive, já foi responsável por uma decisão favorável ao petista como desembargador do Tribunal Regional Federal da 1.ª Região (TRF-1). Em 2017, ele votou pela extinção de uma ação popular que pedia a anulação da nomeação do ex-presidente, em 2016, para o cargo de ministro-chefe da Casa Civil, com pedido de ressarcimento aos cofres públicos dos gastos decorrentes do ato da ex-presidente Dilma Rousseff.

Como ficam os casos da Lava Jato na ausência de Celso de Mello

Como Celso de Mello costuma ser o voto de minerva nos casos da Lava Jato na Segunda Turma do STF e não apenas nos processos de Lula, sua aposentadoria também terá efeitos nas ações judiciais decorrentes da operação. Justamente por causa da posição "garantista" de Kassio Nunes Marques – mais alinhada à ala do Supremo que é crítica da Lava Jato.

Internamente, os integrantes do STF afirmam que a chegada de um novo garantista ajudaria a trazer um equilíbrio de forças entre os garantistas e a ala dos "legalistas", que defende respostas mais efetivas da Justiça em processos envolvendo casos de corrupção. A ala dos legalistas é composta por ministros como Cármen Lúcia, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso.

Advogados que atuam no Supremo também viram com bons olhos uma futura indicação de Kassio Marques.

*Com informações de Estadão Conteúdo

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