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Como o Congresso pode ser mais econômico e produtivo no "novo normal"
Vista aérea do Congresso Nacional e da Esplanada: Legislativo custa R$ 30 milhões por dia| Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

O quadro criado por causa da pandemia de coronavírus levou o Congresso Nacional a realizar votações em dias pouco habituais, como segundas-feiras, sextas-feiras e até um sábado. A implementação de sistemas virtuais para coleta de votos e pronunciamentos na Câmara e no Senado tem ampliado o quórum de parlamentares e permitido maior produtividade. Outro efeito do momento atual é a redução nas despesas: os gastos de deputados e senadores caíram pela metade desde o início da pandemia.

O panorama abre caminho para que parlamentares e membros da sociedade civil repensem a estrutura do Congresso e questionem se o "novo normal" – conceito em voga, que discute a realidade após o término da pandemia – pode ter um parlamento mais enxuto, mais econômico e mais produtivo.

"É um momento de repensarmos gastos de todos os poderes", afirma o secretário-geral da ONG Contas Abertas, o economista Gil Castello Branco. Segundo ele, não há nenhuma instância de poder no Brasil que tenha gastos que a diferenciem das demais. O economista vê na implementação do teletrabalho, em prática atualmente na quase totalidade dos órgãos públicos, um procedimento que pode levar à redução da necessidade de manutenção de sedes físicas e aluguel de imóveis. Ele disse que alguns postos de trabalho também podem ser repensados, em especial os de funcionários terceirizados, como os de secretária, garçom ou copeira.

Para o economista, se a necessidade de conter os gastos públicos já é relevante em qualquer circunstância, na atual a condição se acentua. "O Brasil vai sair da pandemia com um endividamento brutal. Para que não haja aumento de impostos, a revisão dos gastos públicos é um caminho. Ficou claro que a administração pública consegue funcionar tão bem – ou tão mal – com os pequenos ajustes necessários para o trabalho à distância", diz Gil Castello Branco.

O que pode ser cortado no Congresso

O Congresso Nacional tem um custo de R$ 30 milhões por dia. O valor inclui a manutenção do espaço, a remuneração dos funcionários, despesas extras e também o salário dos parlamentares, que atualmente é de R$ 33.763 – tanto para senadores quanto para deputados federais.

Os congressistas ainda dispõem de verbas para a contratação de funcionários e da cota parlamentar, o chamado "cotão", que é uma quantia para uso em despesas como aluguel de carros, manutenção de escritório, contratação de consultorias e assinatura de jornais, entre outros serviços.

Parte expressiva do "cotão" é destinado à compra de passagens aéreas. O sucesso das sessões virtuais é um dos componentes que mais explica a diminuição nas despesas de deputados e senadores nas últimas semanas. Afinal, as viagens a Brasília se mostram menos necessárias, o que agrada a alguns parlamentares.

"É uma agonia ter que sair do estado toda semana para muitas vezes não resolver nada em Brasília, sendo que nossa base está aqui, nós somos eleitos para representar o povo daqui", afirma o deputado Giovani Cherini (PL-RS).

O parlamentar diz que o momento atual está fazendo os deputados "trabalharem mais do que antes" e que a pandemia pode criar um novo parâmetro nas atividades do Congresso. "Se antes eu falasse para nós trabalharmos em casa, certamente ia 'levar pau'. Mas atualmente estamos produzindo mais", diz o parlamentar, que considera "faraônica" a estrutura da Câmara.

Cherini diz ainda que as sessões virtuais estão reduzindo a morosidade das sessões de votação, que se dão principalmente quando deputados contrários a projetos de lei lançam mão de recursos regimentais como obstrução e pedido de retirada da proposta de pauta. O parlamentar é também da opinião de que o momento atual revela que as comissões da Câmara são ambientes de pouca produtividade. Os colegiados não chegaram a avançar nos trabalhos em 2020, em virtude da pandemia.

"A pandemia gera oportunidades para repensarmos certos gastos, que poderiam ser otimizados daqui para a frente, no chamado 'novo normal'. É possível que, no pós-pandemia, alguns gastos não voltem", afirma o deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA). Para ele, o sucesso das sessões virtuais pode servir de estímulo para que os parlamentares reduzam os deslocamentos – e também as despesas – em seus estados de origem. "Podemos também fazer reuniões e encontrar a população via internet."

O deputado Márcio Labre (PSL-RJ) acredita que a criação de um novo cotidiano na Câmara, inspirado no modo como o parlamento agiu durante a pandemia, estará entre as prioridades dos deputados. "Isso vai estar na pauta do segundo semestre", diz. O parlamentar, no entanto, chama de "folclore" parte do debate em torno dos gastos públicos. "Falam como se fosse algo do tipo 'não gastou a cota parlamentar, o dinheiro vai direto para a merenda escolar'. Isso não existe. É uma verba constitucional", ressalta. Ou seja, o dinheiro do Congresso é do Congresso.

Diminuição de parlamentares pode ser caminho?

O debate sobre a estrutura do Congresso Nacional chega também a abordagens acerca do número de parlamentares em atividade. Algumas proposições sugerem a diminuição no total de senadores e deputados federais. Uma delas foi apresentada em março do ano passado pelo senador Alvaro Dias (Podemos-PR), que sugeria o corte em um terço no número de senadores e deputados. A proposta está parada na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado desde outubro. Com a pandemia, são poucas as perspectivas de votação ainda em 2020.

A ideia divide opiniões. O comunista Daniel Almeida e o bolsonarista Márcio Labre são contrários. Labre avalia que o correto seria o aumento no número de representantes da população. Já Almeida não relaciona a diminuição com ganhos à sociedade. "Acho que isso não é um bom debate. O Brasil é muito grande, tem estados muito diversos entre si. Diminuir a representação não vai melhorar a qualidade das deliberações do parlamento", diz.

Chierini, por outro lado, defende a realização de um estudo sobre o tema e critica o que considera hoje um descompasso entre a população de alguns estados e o número de representantes. "É errado um deputado de São Paulo precisar de 500 mil votos para ser eleito e um de Roraima, apenas de 5 mil. A Câmara não precisa desse tipo de compensação, que o Senado já faz", afirma.

A Câmara tem 513 integrantes e o Senado, 81. O número de deputados na Câmara é proporcional à população de cada estado, com o mínimo de oito (total que se aplica a Acre, Amazonas, Amapá, Distrito Federal, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Norte, Rondônia, Roraima, Sergipe e Tocantins); e o máximo de 70, que vale apenas para São Paulo. Já no Senado são três membros para cada estado e para o Distrito Federal, independentemente da população de cada localidade.

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