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Despesas de senadores com passagens aéreas despencaram depois do início da pandemia: economia aos cofres públicos.
Despesas de senadores com passagens aéreas despencaram depois do início da pandemia: economia aos cofres públicos.| Foto: Marcos Oliveira/Marcos Oliveira/Agência Senado

A deflagração da pandemia de coronavírus, ainda no primeiro semestre, gerou a necessidade de mais dinheiro para a rede pública de saúde do Brasil. Uma alternativa de financiamento aventada logo no início foi cortar despesas com a classe política, reduzindo os salários de parlamentares e os fundos partidário e eleitoral. As iniciativas, porém, não avançaram no Congresso.

Mas o fato de o "corte na carne" não ter prosperado não significa que os congressistas não reduziram suas despesas nestes meses de quarentena. Levantamento feito pela Gazeta do Povo nos portais de transparência da Câmara e do Senado identificou que houve diminuição nos gastos dos parlamentares.

A contenção de despesas se deu principalmente na "cota para exercício da atividade parlamentar", o chamado cotão, que é uma verba oferecida a deputados e senadores para gastos com itens como passagens de avião, contratação de serviços de consultoria, manutenção de escritório de apoio em suas bases eleitorais e locação de veículos, entre outros. O valor do cotão é variável de acordo com o estado de origem dos parlamentares, por causa dos diferentes preços dos bilhetes aéreos.

Já a verba de gabinete, que é o recurso que os deputados federais dispõem para a contratação de funcionários para a sua equipe, não passou por alterações durante o período de quarentena. Os valores gastos ao longo dos meses do ano permaneceram próximos da casa de 90% de tudo o que a Câmara oferece aos deputados na rubrica. A manutenção dos valores se deve ao fato de que os gabinetes alegam que não efetuaram dispensas de funcionários no período, apenas promoveram o remanejamento temporário para o trabalho remoto.

Passagens aéreas puxaram queda

A queda nas despesas da cota parlamentar se explica principalmente pela abrupta diminuição dos gastos com passagens aéreas, resultado da adoção das medidas de distanciamento e da implantação de sessões remotas.

No Senado, os custos com passagens despencaram: de R$ 520 mil em fevereiro passaram para pouco mais de R$ 14,2 mil em abril. Na Câmara, a diminuição aparentemente foi tão grande que fez com que as despesas com passagens saíssem do portal da transparência da Casa — segundo a assessoria do órgão, o sistema que contabiliza os recursos insere automaticamente no campo "outros" qualquer gasto inferior a 5% do total da cota. As despesas com passagens vêm sendo contabilizadas em "outros" desde o mês de abril.

A Câmara promoveu também uma diminuição nas despesas com locação ou fretamento de veículos: o custo foi de R$ 2,26 milhões em fevereiro para R$ 1,76 milhão em julho.

Os gastos do Senado com passagens aéreas vivem, porém, uma trajetória de evolução desde abril. A despesa em agosto foi de R$ 79,3 mil, a maior desde o início da pandemia. O cálculo contabiliza todos os senadores exceto quatro que não cumpriram a totalidade do mandato neste ano: Cid Gomes (PDT-CE), Rose de Freitas (Podemos-ES) e Lucas Barreto (PSD-AP), que se desligaram temporariamente por motivos de saúde, e Carlos Fávaro (PSD-MT), que só assumiu a função em abril, após a cassação da antiga titular, Selma Arruda (Podemos).

Já em outras áreas, a economia promovida por deputados e senadores não foi tão significativa. Na Câmara, por exemplo, as despesas com "divulgação da atividade parlamentar" foram bem parecidas na comparação entre os períodos janeiro–março e abril–julho: R$ 3.678.552,98 para o primeiro intervalo e R$ 3.642.489,45 para o segundo. Esta rubrica permite que os parlamentares contratem serviços de mídia e também de atuação em redes sociais. O senador Jader Barbalho (MDB-PA) utilizou R$ 25 mil para serviços de divulgação no mês de julho. Foi a única ocasião em que ele investiu recursos do Senado neste campo em 2020.

Outro segmento em que não houve economia foi o da contratação de serviços de consultoria — neste caso, na Câmara dos Deputados, o quadro foi de elevação de despesas, quando se faz o comparativo entre os períodos janeiro–março e abril–julho. Foram R$ 1,58 milhão investidos no primeiro trimestre e R$ 1,61 milhão nos quatro meses seguintes.

Pandemia não impediu gastos altos

A análise dos gastos dos senadores revelou que alguns parlamentares foram "contra a maré" e executaram seus maiores gastos em 2020 justamente durante o período de pandemia. Foi o caso de Marcos Rogério (DEM-RO), que teve despesas de R$ 40.819,66 em julho, Plínio Valério (PSDB-AM), com custos de R$ 43.825,13 em agosto, e Mecias de Jesus (Republicanos-RR), que despendeu R$ 42.532.32 em maio. Esses valores contabilizam tanto o cotão quanto o que o Senado chama de "gastos não inclusos nas cotas para exercício da atividade parlamentar", que são verbas de viagens oficiais, combustíveis, uso de correios e "outros materiais".

A assessoria de Marcos Rogério apontou que a explicação para a maior despesa em julho é o início do contrato com uma empresa que será responsável pela divulgação da atividade parlamentar, que terá duração de um ano. A de Plínio Valério relatou que "o senador fez os gastos de sempre e em relação à cota que tem direito geralmente são baixos". Já a assessoria de Mecias de Jesus não retornou ao contato da Gazeta do Povo.

Outros parlamentares, embora não tenham efetuado seus maiores gastos durante o período de pandemia, tiveram nos últimos meses custos superiores a R$ 45 mil. São Márcio Bittar (MDB-AC), que teve despesas de R$ 52.504,25 em maio; Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB), com R$ 49.671.56, em julho; e o líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO), com R$ 45.522,23 em junho.

A assessoria de Bittar não retornou ao contato da reportagem. Vital do Rêgo informou, via assessoria, que o aumento dos custos em julho ocorreu "em atendimento a uma solicitação dos estudantes das universidades públicas da Paraíba, no que se refere à doação de um instrumento extremamente útil e que muitas vezes torna-se inacessível, sobretudo aos estudantes mais carentes, por conta do seu valor elevado nas livrarias: o Vade Mecum". O senador teve despesas de R$ 30.671,56 com Correios em julho de 2020.

Já a assessoria de Eduardo Gomes informou que os gastos são feitos dentro da normalidade e dos valores indicados pelo Senado, e seguem o fluxo das atividades efetuadas pelo parlamentar, e que não houve redução do trabalho durante o período da pandemia.

Entre "pré-candidatos" a presidir a Câmara, Ramos tem maiores despesas

A Câmara vive um cenário de disputa em virtude da proximidade da eleição para a presidência da Casa, que acontece em fevereiro. As regras atuais impedem o presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ) de disputar um novo mandato. Até o momento, são poucos os deputados que falam abertamente em concorrer ao comando da Casa. Mas articulações de bastidores apontam alguns nomes que largariam na frente.

Entre eles, Arthur Lira (PP-AL), o líder do chamado Centrão, é o que registrou os menores custos. Ele utilizou R$ 64 mil da cota parlamentar ao longo do ano. A maior parte da verba foi investida com a locação de veículos, que consumiu R$ 40,6 mil. São R$ 5,8 mil gastos com o item todos os meses, a partir de janeiro.

Já a maior despesa vem de Marcelo Ramos (PL-AM). O deputado, que é presidente da comissão especial que avalia a prisão dos condenados em segunda instância, usou pouco mais de R$ 332 mil da cota parlamentar em 2020. Seus maiores investimentos são em divulgação das atividades e na contratação de serviços de consultoria — R$ 92,7 mil e R$ 88 mil, respectivamente.

"Bancada da economia" tem sete integrantes

Em meio aos altos custos, há um grupo de congressistas que não utilizou nenhum centavo sequer de sua cota parlamentar em 2020. A lista tem o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), os senadores Reguffe (Podemos-DF), Eduardo Girão (Podemos-CE), Leila Barros (PSB-DF) e Jorge Kajuru (Cidadania-GO) e os deputados federais Paula Belmonte (Cidadania-DF) e Hercílio Coelho Diniz (MDB-MG).

Os parlamentares não chegam a representar "custo zero" ao Parlamento porque mantêm seus salários e as verbas de gabinete. No caso dos senadores, houve ainda a utilização dos "gastos não inclusos nas cotas para exercício da atividade parlamentar". O montante correspondeu a R$ 63,16 no caso de Kajuru e R$ 31,10 para Reguffe.

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