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Congresso Nacional
Congresso Nacional: PEC 5, que enfraquecia o MP, deixou de ser aprovada por apenas 11 votos| Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

Por uma margem de apenas 11 votos, a Câmara dos Deputados rejeitou na última quarta-feira (20) a proposta de emenda à Constituição n.º 5/2021 (PEC 5), que modificava a composição do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). O texto foi apelidado de "PEC da vingança" por permitir a ampliação da interferência política na atuação do MP e era visto como uma resposta de políticos contra ações como as da operação Lava Jato. A derrota da PEC, porém, não enterra a agenda de propostas que enfraquecem o combate à corrupção no Congresso – que têm tramitado de forma muito mais rápida e com mais efetividade em 2021 do que os projetos que tentam coibir os desvios no poder público.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), um dos patrocinadores da PEC 5, já ensaia "ressuscitar" a proposta por meio de uma manobra regimental para levá-la a votação novamente nos próximos dias – e, assim, conseguir aprová-la.

A "pressa" em aprovar a PEC 5, aliás, foi alvo de discussões dentro da Câmara. O deputado Marcel van Hattem (Novo-RS) chegou a bater boca com Arthur Lira. O parlamentar gaúcho contestou a velocidade da tramitação da PEC 5, que iniciou sua trajetória legislativa em março deste ano e já se via pronta para votação em plenário. É pouco habitual no Congresso a votação de um projeto e principalmente uma emenda à Constituição em tão pouco tempo. Van Hattem também questionou por que a PEC 5 havia "furado a fila" de projetos que estão tramitando há mais tempo e que atualmente estão engavetados, como a proposta que autoriza a prisão de condenados em segunda instância judicial – que, ao contrário da PEC 5, é vista como um mecanismo de combate à corrupção.

Lira respondeu que a pauta de votações da Câmara é uma atribuição pessoal dele e que não há uma determinação para que as votações sigam uma ordem cronológica dos projetos protocolados na Casa. Na prática, a lista dos projetos que vão a plenário é estabelecida de acordo com conveniências políticas e o entendimento de que um projeto tenderia a ser mais bem-sucedido.

O fato é que os projetos que são criticados por enfraquecerem o combate à corrupção ou por facilitar ilícitos têm tramitado nos últimos tempos de forma mais rápida do que os que tentam coibir desvios da administração pública. Veja, abaixo, exemplos de projetos aprovados ou em fase de discussão nos últimos meses pelo Congresso Nacional que são apontados como possíveis enfraquecedores do combate à corrupção.

PROJETOS APROVADOS

Nova Lei de Improbidade

Senado e Câmara aprovaram, entre o fim de setembro e começo de outubro, um projeto que mudou a Lei de Improbidade Administrativa e que reduziu as possibilidades de punição a agentes públicos.

Pela nova norma, só pode ser enquadrado pela lei um político que agiu com dolo – ou seja, que teve a intenção de fazer mal ao poder público. A regra anterior previa a punição também da improbidade culposa (não intencional). Especialistas em combate à corrupção dizem que é muito difícil provar a intenção de um agente público causar danos ao poder público – o que tende a aumentar a impunidade.

A proposta havia sido apresentada originalmente em 2018 pelo deputado federal Roberto de Lucena (Podemos-SP) e permaneceu sem tramitações significativas até o primeiro semestre de 2021, quando passou a ter tratamento prioritário e avançou rapidamente na Câmara e Senado. Agora, aguarda análise do presidente Jair Bolsonaro, que pode sancioná-la ou vetá-la.

Candidaturas de políticos com contas irregulares

O Congresso aprovou recentemente, e Bolsonaro sancionou, um projeto que diminuiu a lista de causas de inelegibilidade e que abre caminho para a candidatura de políticos com contas irregulares – o que pode estimular a má gestão dos recursos públicos.

A nova norma tirou das causas de inelegibilidade a existência de contas irregulares em casos em que não houve prejuízo aos cofres públicos e nos quais o agente público foi punido apenas com multa. Pela legislação anterior, o gestor que fizesse isso ficava inelegível por oito anos.

Bolsonaro sancionou a norma em setembro, mesmo mês em que o Senado concluiu a votação do texto. A Câmara havia finalizado a apreciação em junho.

PROJETOS QUE ESTIVERAM PERTO DA VOTAÇÃO OU DE VIRAR LEI

PEC da impunidade para políticos

No início de 2021, a Câmara esteve perto de votar uma PEC que modificava as normas que envolvem a prisão de deputados e senadores. A proposta, apelidada de PEC da Impunidade, previa que prisões de parlamentares só poderiam ocorrer em flagrante, em casos de crimes inafiançáveis e que não poderiam ser determinadas por decisões monocráticas de autoridades do Judiciário. Além disso, o texto estabelecia que parlamentares detidos deveriam permanecer reclusos dentro das dependências do próprio Congresso até que uma decisão definitiva sobre a prisão fosse estabelecida.

Apesar do apoio explícito de Arthur Lira e do Centrão, a iniciativa recebeu muita resistência e foi retirada de pauta. Acabou remetida a uma comissão especial e, desde então, não teve mais avanços.

APEC foi apresentado por causa do caso de Daniel Silveira (PSL-RJ), deputado que foi preso em fevereiro por ter veiculado um vídeo com ameaças a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Na ocasião, mesmo parlamentares que discordaram do posicionamento de Silveira entenderam que a prisão havia sido arbitrária e que representava uma interferência do Judiciário sobre o Legislativo.

À época de sua tramitação, a proposta recebeu críticas pelo teor e também pela sua inserção como um das prioridades da Câmara. Parlamentares contrários à proposta diziam que o Legislativo deveria se ocupar em discutir temas ligados à pandemia de coronavírus e à crise econômica, e não a prisão de congressistas.

Revogação da lei que pretendia restringir os partidos de aluguel

Recentemente, a Câmara aprovou uma lei que permitia a volta das coligações nas eleições proporcionais (para deputados e vereadores). Mas a proposta só não virou lei porque o Senado rejeitou o projeto.

Na prática, o projeto aprovado pelos deputados revogava outra lei, aprovada pelo próprio Congresso em 2017, que proibia as coligações. O objetivo dessa lei de 2017 era reduzir o número dos chamados “partidos de aluguel”.

Segundo especialistas em combate à corrupção, esse tipo de partido muitas vezes é utilizado por dirigentes apenas para receber verbas públicas de financiamento partidário em proveito próprio e para negociar, com outras legendas, a "venda" de tempo na propaganda eleitoral na TV em troca de futura indicações para cargos públicos.

Fundão Eleitoral de R$ 5,7 bilhões

Existe uma máxima de que, quanto maior é o dinheiro em circulação na esfera pública, maior é o risco de corrupção. E o Congresso aprovou, dentro do projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), um valor de R$ 5,7 bilhões para o Fundão Eleitoral das eleições de 2022 – quase o triplo do que havia sido liberado no pleito de 2018. O presidente Jair Bolsonaro vetou esse trecho da LDO. Mas o veto ainda não foi apreciado pelo Congresso. Ou seja, o valor de R$ 5,7 bilhões ainda pode valer para as eleições de 2022.

PROJETOS EM DISCUSSÃO

Novo Código de Processo Penal

Pontos do projeto de reformulação do Código do Processo Penal (CPP) são vistos dentro do Ministério Público como um caminho para reduzir as possibilidades de atuação da instituição. A norma restringe investigações criminais e diminui o prazo para inquéritos policiais.

A proposta permaneceu parada por anos no Congresso, mas foi retomada nos últimos meses, com discussões lideradas por um grupo de trabalho na Câmara.

Nova Lei de Lavagem de Dinheiro

A Câmara instalou em setembro do ano passado um grupo de trabalho, composto por juristas, para discutir a reformulação da legislação brasileira sobre lavagem de dinheiro. O grupo tem entre seus integrantes advogados de réus da Lava Jato – o que ligou o sinal de alerta do Ministério Público para possíveis retrocessos. A composição do grupo foi sugestão do ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia (DEM-RJ), que chegou a ser investigado pela Lava Jato. Apesar disso, nos últimos tempos a discussão não teve avanços significativos.

No Senado, poucos avanços no combate à corrupção

A Câmara concentra mais críticas quando o assunto é o enfraquecimento do combate à corrupção, mas o Senado também executou ações que receberam contestações. Presidente da Casa entre 2019 e 2021, Davi Alcolumbre (DEM-AP) foi continuamente criticado por parlamentares, em especial os do grupo Muda Senado, por barrar os pedidos de abertura da CPI da Lava Toga – cujo objetivo era investigar suspeitas de corrupção no Poder Judiciário.

Comunidade internacional vê retrocesso no combate à corrupção

A aprovação, ou discussão em estágio avançado, de propostas que enfraquecem o combate à corrupção preocupou entidades internacionais. Em março, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o “clube dos países ricos”, divulgou que o Brasil havia retrocedido em ações de enfrentamento do combate a desvios no poder público. Essa manifestação foi endossada em relatório da Transparência Internacional. As duas instituições também apontaram o fim da operação Lava Jato como um fator de preocupação.

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