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A Esplanada dos Ministérios, em Brasília: reforma ministerial está sendo gestada, apesar das negativas públicas de Bolsonaro.| Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

O deputado federal João Roma (Republicanos-BA) assume nos próximos dias o Ministério da Cidadania, que é responsável pelas políticas de desenvolvimento e assistência social, como o Bolsa Família. A pasta era comandada até então por Onyx Lorenzoni, que agora exercerá o cargo de ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República. Esta é a primeira troca da reforma ministerial prevista na Esplanada dos Ministérios, que, segundo afirmam à Gazeta do Povo interlocutores do Palácio do Planalto e lideranças do governo no Congresso, virá a conta-gotas para controlar a fidelidade do Centrão.

Apesar das tentativas do presidente Jair Bolsonaro de minimizar a existência da reforma ministerial, ela não é negada por assessores, vice-líderes e líderes nos bastidores. Esses interlocutores reconhecem que é uma estratégia do governo para evitar transparecer o “toma-lá-dá-cá" tão criticado por Bolsonaro antes e até durante parte do mandato. A autopreservação, contudo, é apenas um dos motivos pelo qual o governo não dará prosseguimento a outras trocas de comando na Esplanada.

Outro motivo para segurar as mudanças é a espera pela resposta que o Congresso dará a pautas prioritárias do governo. Bolsonaro apresentou aos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), uma lista com 35 projetos de interesse. Para a eleição de ambos e as recentes sinalizações de comprometimento com a agenda econômica, Bolsonaro deu sinal verde para o loteamento do Ministério da Cidadania. A entrega de outras pastas a partidos aliados fica, portanto, condicionada à produtividade de projetos aprovados.

O compromisso é explicado por interlocutores palacianos. “Não tem outra [mudança] no radar. Mas é óbvio que, mais para frente, pode acontecer”, explica um assessor. “O governo não vai entregar tudo, vai esperar a coisa andar. Como vão rodar as pautas no Congresso? As reformas estão saindo, estão andando. Pode ser que, mais para frente, com a entrega de projetos de interesse do governo, o presidente faça uma mudança pontual”, reforça outro assessor.

No Congresso, o discurso está alinhado. Lideranças do governo nas duas Casas reconhecem que a única troca prevista para agora é a entrega do Ministério da Cidadania para o Republicanos.

Especulações como a transferência da ministra da Agricultura, Tereza Cristina, deputada federal licenciada do DEM, para o Ministério das Relações Exteriores, chefiado pelo chanceler Ernesto Araújo, estão descartadas. “A Tereza, onde ela está, faz mais do que precisa, porque representa a agricultura e os interesses comerciais do Itamaraty. Ela vai ficar quieta lá e o Ernesto fica onde está”, sustenta um segundo vice-líder.

Orçamento é outro motivo para cautela com a reforma ministerial

Além da autopreservação do governo e do condicionamento da aprovação de matérias da agenda econômica apoiada pelo governo, outro motivo explica a cautela na condução da reforma ministerial: o Orçamento. Algumas sugestões estudadas dentro do Planalto apontam para o desmembramento do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), criado pela fusão dos Ministérios das Cidades e da Integração Nacional.

O desmembramento do Ministério da Justiça e Segurança Pública em duas pastas é outro que chegou a ser sinalizado por Bolsonaro, ainda em 2020. A divisão de pastas, contudo, não é algo simples. Ao fundir ministérios, a própria Secretaria-Geral, para onde Lorenzoni será transferido, trabalhou para enxugar os gastos com a fusão de estruturas equivalentes, como os departamentos de recursos humanos e comunicação social. Recriar ministérios implicaria em estudar a viabilidade orçamentária para tal.

Com um déficit em 2020 de R$ 743 bilhões e diante da iminente recriação de um auxílio emergencial, que será discutido no Congresso, todo cuidado com o Orçamento de 2021 é pouco. Mas o desmembramento do MDR, comandado por Rogério Marinho, não está completamente descartado. O Ministério das Cidades, que comanda políticas como o Casa Verde e Amarela (o antigo Minha Casa, Minha Vida), sempre tão requisitado por partidos políticos, poderia ir para o partido PL.

Já a recriação do Ministério da Segurança Pública, existente na gestão Temer, é um pedido da bancada da bala, que integra dezenas de aliados de primeira hora de Bolsonaro. Desavenças entre o presidente da República e o ex-deputado federal Alberto Fraga (DEM-DF), cotado para assumir a pasta, esfriaram as discussões. O governo citou impeditivos como a questão orçamentária e, segundo afirmam parlamentares da bancada à Gazeta do Povo, os dois romperam relações após isso.

Recriação de ministérios é entrave; quais outros podem entrar na reforma

As dificuldades de recriar ministérios são alguns dos fatores que até ajudam a explicar por que o Republicanos vai assumir todo o Ministério da Cidadania, e não desmembrar a pasta — que, atualmente, unifica os ex-ministérios do Desenvolvimento Social e dos Esportes. “É mais fácil trocar um por outro”, diz um interlocutor do governo. Por isso, futuras mudanças no comando de ministérios podem ocorrer mediante a troca de um nome por outro, sem malabarismos.

Assim, em vez de dividir o MDR e deixar o ministro Rogério Marinho no comando de uma das estruturas que seriam recriadas e acomodar um aliado em um segundo ministério, é mais provável que, havendo o entendimento de colocar a pasta na reforma ministerial, Marinho seja substituído. Por ora, contudo, não há previsão dessa substituição. O ministro é ex-deputado federal e ex-filiado ao PSDB. Por ora, ele se encontra sem partido, ou seja, é da “cota direta” de Bolsonaro.

Além do MDR, outros ministérios estudados para entrar na reforma ministerial são os de Minas e Energia, da Educação e da Saúde. Nenhum deles é ocupado por algum apadrinhado político. O senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), ex-presidente do Senado, tem interesse no MDR ou nas Minas e Energia. O PP pode assumir a Saúde após o atual ministro, Eduardo Pazuello, ao menos deixar encaminhada a campanha de vacinação contra a Covid-19, inclusive com a produção de vacinas e insumos.

Por que a reforma ministerial é discutida?

A saída de Lorenzoni da Cidadania já era precificada e ficou mais clara com a aproximação do Centrão. Desde o início do governo, quando assumiu, primeiramente, a Casa Civil, sua indicação preenchia uma “cota direta” do presidente Jair Bolsonaro. Ou seja, mesmo tendo sido eleito deputado federal pelo DEM, ele não foi uma indicação do partido, tal como Rogério Marinho, no Desenvolvimento Regional.

No presidencialismo de coalizão, um partido indica um apadrinhado para ocupar uma estrutura no governo. Com aval do presidente da República, em troca dessa confiança, a legenda atua no Congresso para “entregar os votos” esperados pelo Planalto em pautas de interesse do presidente da República. No caso de Lorenzoni, por ser uma indicação de Bolsonaro, ele tem pouca influência sobre os votos do DEM na Câmara e no Senado. E ocupa uma pasta de muita relevância para não garantir esses votos.

Só em 2020, o Ministério da Cidadania executou R$ 330,40 bilhões do Orçamento, a maior parte referentes aos R$ 321,8 bilhões das nove parcelas do auxílio emergencial. Partidos políticos gostam de ter o controle, sobretudo, de ministérios com orçamentos volumosos. Na política, executar políticas públicas com a distribuição de recursos pelo país ajudam filiados a associarem para si tais feitos. Além disso, ter afilhados no comando, em tese, agilizam a execução de emendas parlamentares e no atendimento de reuniões a congressistas.

Bolsonaro nega reforma ministerial, mas se contradiz desde 2019

A mudança no Ministério da Cidadania foi oficializada quatro dias depois de o presidente da República negar categoricamente a existência de uma reforma ministerial. “Não existe isso”, disse Bolsonaro, na segunda-feira (8). Como discurso de autopreservação, ele rebateu críticas sobre ter negociado apoio de partidos do Centrão em troca de cargos no governo. “Não é hora de trocarmos ninguém aqui para atender interesses políticos”, disse.

A questão é que, desde o início do governo, Bolsonaro se contradiz sobre a acomodação de aliados políticos no primeiro escalão do governo. Inicialmente, ele falava abertamente em não ceder ao famigerado “toma-lá-da-cá” na relação com o Congresso e partidos políticos. Agora, o cenário mudou.

Em maio de 2020, por exemplo, o ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, ainda detinha outra estrutura: a das Comunicações. A imprensa informava que ele seria substituído para acomodar alguém do PSD. Bolsonaro classificou como mentirosa a informação e seus interlocutores tentaram desconversar sobre a redução de poderes de Pontes. Um mês depois, o governo recriou o Ministério das Comunicações, entregando a pasta para o deputado federal Fábio Faria (PSD).

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