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CPI
CPI da Covid aprovou até agora 137 requerimentos de convocação e convite, mas só 46 depoentes realmente falaram aos senadores.| Foto: Pedro França/Agência Senado

Aprovar a convocação ou convite de uma testemunha na CPI da Covid do Senado não significa, necessariamente, que a pessoa citada comparecerá à comissão. Estatisticamente falando, a chance maior é do oposto. Levantamento feito pela Gazeta do Povo sobre os registros dos trabalhos do colegiado identificou que cerca de dois terços dos nomes aprovados não precisaram falar aos senadores.

Entre 27 de abril, quando a CPI iniciou seus trabalhos e recebeu seus primeiros requerimentos, e o dia 17 de setembro, foram aprovados pedidos para convocação ou convite a 137 pessoas. Destas, 46 foram à CPI, e as outras 91 ainda aguardam uma definição. A agenda da CPI é feita pelo presidente da comissão — no caso, o senador Omar Aziz (PSD-AM) — e ele não precisa, obrigatoriamente, cumprir de forma estrita a lista de convocações e convites.

As convocações que não se confirmaram se deram por diferentes motivos. Um deles foi a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de conceder aos governadores de estado o direito de escolher se querem ou não comparecer à CPI. A medida foi determinada pelo Judiciário após requisição do governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), que deveria comparecer à comissão no início de junho. Ele optou por não ir e frustrou os senadores

A oitiva com Lima abriria uma série de depoimentos com governadores. A CPI chegou a aprovar, além da oitiva com o gestor amazonense, o depoimento com outros oito governadores: Waldez Góes (PDT-AP); Ibaneis Rocha (MDB-DF); Hélder Barbalho (MDB-PA); Marcos Rocha (sem partido-RO); Antonio Denarium (PP-RR); Carlos Moisés (PSL-RS); Mauro Carlesse (PSL-TO); e Wellington Dias (PT-PI). A investigação de supostas irregularidades nos estados e municípios é uma das principais demandas dos senadores da CPI que são apoiadores do governo de Jair Bolsonaro. Para eles, os problemas que o Brasil vive por conta da pandemia de coronavírus são decorrentes de desvios cometidos por prefeitos, governadores e outros gestores locais.

As "ondas" da CPI

O motivo principal que leva a CPI a não efetivar as convocações aprovadas, porém, é a escolha do comando da comissão de privilegiar determinados assuntos em detrimento de outros. Ao longo dos quase cinco meses de trabalhos da comissão, a CPI se viu envolvida em algumas “ondas” de temas que marcaram os trabalhos da comissão — e influenciaram tanto nas convocações colocadas em pauta quanto nos depoimentos que foram efetivamente promovidos.

Por exemplo, a CPI prioriza, desde meados de junho, a investigação sobre o suposto esquema de corrupção que operava dentro do Ministério da Saúde para privilegiar a compra de determinadas vacinas. O sistema tem revelado um grande número de personagens, o que se reflete em muitas testemunhas e depoimentos, e acabou por praticamente impedir o debate de outros temas.

Neste contexto, testemunhas que tiveram a convocação aprovada quando o foco da comissão estava em temas como o tratamento precoce e o gabinete paralelo — uma suposta estrutura que influenciaria em decisões do presidente Bolsonaro sobre o combate à Covid-19, de forma desconectada das instâncias formais — acabaram não depondo.

Entra nessa relação, por exemplo, o virologista Paolo Zanotto, que frequentou reuniões com Bolsonaro e ganhou notoriedade após a divulgação de um vídeo de setembro do ano passado em que defendia a instalação de um “gabinete das sombras” para a discussão da pandemia. A convocação de Zanotto foi aprovada em 30 de junho, e segue sem definição de data para oitiva.

Outro exemplo de chamados que corresponderam a “ondas passageiras” da CPI foi uma série de convites apresentados pelo relator da comissão, o senador Renan Calheiros (MDB-AL). O parlamentar propôs — e a CPI aprovou — a presença de cientistas como a professora Deisy Ventura, da Universidade de São Paulo (USP), e o médico Drauzio Varella. Entre maio e junho, a comissão realizou sessões que tiveram caráter mais científico do que político, com nomes como a bióloga Natália Pasternak e o médico Ricardo Ariel Zimmerman. Parlamentares apresentaram mais nomes com este perfil à comissão, mas os depoimentos não foram efetivados.

A dinâmica da CPI mostra que o agendamento de depoimentos também atende a critérios políticos. Nisso se incluem desde oitivas marcadas "a jato" quanto o resgate de algumas que estavam adormecidas e foram resgatadas.

Entre as que registraram a maior brevidade está a sessão com o policial militar Luiz Paulo Dominguetti. O depoimento dele foi pedido em 29 de junho pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e dois dias depois disso, em 1º de julho, ele já falava aos parlamentares. Dominguetti atuava como representante comercial da empresa Davati, que dizia ser intermediária da fabricante de vacinas Astrazeneca, e denunciou ter recebido um pedido de propina de US$ 1 dólar por dose comercializada entre a companhia e o Ministério da Saúde.

Já a fala do ministro Wágner do Rosário, da Controladoria-Geral da União (CGU), seguiu dinâmica oposta. O requerimento que pedia sua presença foi proposto em maio e aprovado em 10 de junho. Mas ele só veio prestar depoimento à CPI na última terça-feira (21), mais de três meses depois da aprovação.

O mesmo vai acontecer na próxima quarta-feira (29) com o empresário Luciano Hang, dono das lojas Havan. O requerimento de convocação dele está aprovado desde 30 de junho. A comissão quer ouvi-lo sobre a defesa do tratamento precoce e o atendimento prestado pelo hospital da rede Prevent Senior à mãe do empresário, que faleceu neste ano em virtude da Covid-19 após se submeter a tratamentos e remédios sem eficácia comprovada.

Calendário apertado

Atualmente, a CPI tem na realização de depoimentos um dos seus principais pontos de debate. O relator Renan Calheiros disse, por diversas ocasiões, que desejaria entregar o seu parecer — o que levaria ao término das atividades do colegiado — até o fim deste mês. Alguns senadores, porém, defendem que "fatos novos" justificam um prolongamento das ações.

A comissão aprovou recentemente a realização do depoimento da advogada Ana Cristina Valle, ex-mulher de Bolsonaro e mãe de Jair Renan. A oitiva não encontra unanimidade nem entre os adversários do presidente — foi proposta por Alessandro Vieira e Randolfe Rodrigues e criticada por Humberto Costa (PT-PE), que vê pouca conexão entre as acusações que envolvem Valle e o objeto da CPI.

O encaixe de outros depoimento será um dos fatores que levará ou não a comissão a se estender para além do prazo estipulado por Renan. A CPI está autorizada a funcionar até 5 de novembro.

Mais exemplos

Além das já citadas, outras personalidades que tiveram o pedido de convocação ou convite aprovado pela CPI, mas não foram — e nem devem ir — prestar depoimento à comissão:

  • Filipe Martins, assessor internacional da Presidência da República;
  • Átila Iamarino, biólogo e divulgador científico;
  • Marcos Erald Arnoud, o "Markinhos Show", ex-assessor do Ministério da Saúde;
  • Arthur Weintraub, ex-assessor da Presidência da República e irmão do ex-ministro Abraham Weintraub;
  • Representantes das empresas de tecnologia Google, Facebook e Twitter.
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