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Eduardo Leite, governador do Rio Grande do Sul.
Eduardo Leite, governador do Rio Grande do Sul, assinou manifestação de estados contra Bolsonaro.| Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

A relação do presidente Jair Bolsonaro com os governadores azedou no início de fevereiro com a publicação de mensagens no Twitter em que ele questionou as alíquotas do ICMS sobre os combustíveis. Disse que pretendia encaminhar um projeto de lei ao Congresso para alterar a forma de cobrança do imposto estadual que incide sobre a gasolina e o diesel. Na prática, jogou a culpa da alta no preço dos combustíveis nos estados e recebeu como resposta o repúdio de 22 governadores.

Eduardo Leite (PSDB), governador do Rio Grande do Sul, estava entre eles. Para o tucano, o ambiente virtual não é instância para discutir a questão e esse tipo de tratamento de Bolsonaro serve apenas para estremecer a relação federativa entre entes federados e a União. "O presidente da República não manda no país, ele é subordinado à Constituição Federal", disse Leite em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo.

"Se ele quer resolver esse tema, e todos nós queremos reduzir custos ao cidadão, convoque uma reunião e vamos conversar”, enfatizou Leite sobre a questão do ICMS. “Não é adequado que uma relação federativa se dê por declarações à imprensa e por manifestações em rede social. Se tem algum ponto a ser debatido, [que Bolsonaro] chame os governadores e vamos todos sentar e discutir esses pontos para encontrarmos juntos as soluções”, afirmou.

Na última segunda-feira (17), em outro manifestação pública, 20 governadores, entre eles Leite, criticaram Jair Bolsonaro por ter acusado a "PM da Bahia do PT" pela morte do ex-PM Adriano da Nóbrega, miliciano que é citado em investigação sobre "rachadinha" que envolve o senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ).

ICMS deve ser discutido na reforma tributária

Durante o Fórum dos Governadores, o ministro da Economia, Paulo Guedes, destacou que a intenção do presidente com os tuítes era mostrar que a energia está super tributada e merece atenção, segundo Leite. Porém, tanto os ministro quanto os governadores concordam que o âmbito para o tema seja abordado é o da reforma tributária.

“Não tem como os governos estaduais fazerem redução abrupta do ICMS”, diz o tucano. No caso do Rio Grande do Sul, a redução representaria cortar “cerca de R$ 6 bilhões que são essenciais à manutenção de serviços públicos e dos quais 25% vão para os municípios”.

Para ele a própria Lei de Responsabilidade Fiscal impede a redução do ICMS. “Você não pode isentar, tirar um imposto sem apresentar como é que você vai compensar essa redução, seja em outros impostos, ou em redução de despesas. O estado não tem espaço para reduzir R$ 6 bilhões no seu orçamento, cerca de 20% da receita de ICMS nos estados são em função de combustíveis. Agora, concordamos que tem que ser feita uma discussão sobre esse tema e faremos, convocados pelo governo federal, no âmbito da reforma tributária.”

Eduardo Leite é cotado como opção do centro para a Presidência

Jovem e político de primeiro mandato, o governador do Rio Grande do Sul vem se firmando como um dos principais nomes da nova geração do PSDB. Elogiado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, Leite é apontado como opção do centro para o Palácio do Planalto em 2022, ofuscando o colega de partido e governador de São Paulo, João Doria, outro pré-candidato.

Crítico da reeleição, Eduardo Leite diz que não pretende concorrer uma segunda vez ao governo do Rio Grande. Acha “muito precipitado” falar sobre as eleições: “2022 está muito distante e qualquer pretensão política que qualquer pessoa tenha dependerá dos resultados que ela tiver apresentado no seu âmbito de governo. Então não há que se pensar em qualquer aspiração ou pretensão pessoal, e eu não as tenho. E mesmo que as tivesse estaria completamente equivocado se mirasse nisso, antes de mirar nos resultados da minha administração.” Apesar disso, garantiu que estará com o PSDB e partidos de centro para “construir um projeto que nos represente”.

Reforma do funcionalismo foi aprovada no estado

Eduardo Leite conseguiu aprovar uma dura reforma estrutural e do funcionalismo no Rio Grande do Sul em tempo recorde. A promessa e a “absoluta convicção”, nas palavras dele, da necessidade da reforma foi anunciada ainda no período da campanha. Leite herdou o estado com “maior déficit previdenciário do Brasil e a maior razão de dependência entre aposentados e servidores em atividade no Brasil também”.

O déficit previdenciário, ou seja, o que falta pagar e não o custo da Previdência em si, no Rio Grande do Sul é de R$ 12,3 bilhões, que são custeados pelo Tesouro, pelos recursos dos impostos. Cerca de 80% da arrecadação está comprometida com pagamento de salários. Entre os professores são 58 mil em atividade e mais de 100 mil inativos, já na Polícia Militar são 16 mil em atividade e o dobro de inativos.

Chamado de “Reforma RS”, o plano teve sete propostas aprovadas. O único projeto retirado do pacote foi o da Previdência dos militares. Mas houve mudança nos planos de carreira de professores, servidores civis e militares. O valor esperado de economia em dez anos é de R$ 18 bilhões.

Foram oito meses de análise e quatro de discussões. No final de janeiro, após três dias de votação, parte dos projetos que compõem a reforma foi aprovada. Outra parte já havia sido aprovada no final de 2019.

Votação "serena" e greve: como foi a aprovação do Reforma RS

O governador Eduardo Leite classificou a votação como “serena”, em comparação com outros estados. Mas a insatisfação de parte do funcionalismo fez com que quase metade dos professores estaduais ficasse em greve por quase dois meses, além de protestos de servidores e policiais.

“Evidentemente houve greve, houve manifestações, respeitamos o direito de greve, mas fomos também rigorosos. Descontamos os dias parados e não negociamos, e avisei isso de antemão. Os professores que estiveram em greve não receberam e não receberão pelos dias parados, tiveram seu salário descontado. O que não era uma prática no estado, geralmente chegava ao final de uma greve negociando-se os dias parados com os professores. E eles acabam recebendo pelos dias que tiveram em greve. E aqui não, no nosso governo, não.”

O tucano diz que o máximo de negociação feita foi permitir que os servidores recebessem um salário em folha suplementar e o desconto fosse feito em seis parcelas. “Mas há desconto, porque o serviço não foi prestado e se não foi prestado, se não trabalhou, se corta o ponto”, ressalta.

Diálogo com deputados ajudou Eduardo Leite a aprovar reforma

Eduardo Leite convidou todos os deputados para apresentar o projeto antes das votações. Foram dois encontros no Palácio do Piratini, sede do governo gaúcho.

“Comecei a preparar nossa base para que recebesse esse debate sem preconceito, de braços abertos, disposta a discutir esses temas e dedicamos o primeiro semestre do ano passado para fazer a reforma que possibilitaria as privatizações de empresas, então aprovamos mudanças de constituição e autorização para vender empresas de energia do estado. E aí, no segundo semestre, assim que foi feita a aprovação da reforma da Previdência federal, nós fizemos um encaminhamento dos nossos projetos”, afirma.

Além dos parlamentares, representantes dos sindicatos foram chamados para falar sobre os projetos. “Permitimos que houvesse uma interferência, que eles pudessem opinar, criticar, fizemos algumas alterações, ajustes, construímos uma forma que, evidentemente, não conquistou apoios de sindicatos, mas eu tenho certeza que ajudou a distensionar o cenário para que pudéssemos fazer a mais profunda reforma de carreiras e de previdência entre os estados no Brasil e talvez uma das mais serenas.”

“Nós não precisamos tirar a sessão da Assembleia, não houve esvaziamento do plenário, tudo transcorreu de forma relativamente serena. Claro, com manifestações contrárias, mas sem problemas”, disse. No Paraná, por exemplo, os deputados tiveram que mudar o local de votação devido à pressão popular, o receio era enfrentar uma nova invasão à Assembleia.

Adesão ao regime de recuperação fiscal do governo federal 

O governo apresentou um plano para aderir ao regime de recuperação fiscal do governo federal. Com a adesão, o estado é autorizado a não pagar as contas por três anos, renováveis pelo mesmo período. Até o momento, apenas o Rio de Janeiro faz parte desse plano de socorro. Independentemente da adesão, o Rio Grande do Sul segue cumprindo uma agenda própria para tentar sair do atoleiro, explicou Leite. Uma liminar concedida pelo Supremo Tribunal Federal suspendeu o pagamento da dívida do estado com a União.

“Nós fizemos várias reuniões com a equipe do Ministério da Economia e com a Secretaria do Tesouro Nacional. Eles já deram várias declarações públicas destacando o Rio Grande do Sul como um exemplo importante de governo determinado a recuperar as contas. O Rio Grande do Sul tem uma agenda muito clara de equilíbrio fiscal em curso e eles elogiaram as ações do nosso governo”.

O governo de Eduardo Leite também discute o plano Mansueto (Plano de Promoção de Equilíbrio Fiscal) para socorrer estados em situações financeira complicada. A proposta foi enviada ao Congresso, mas ainda não começou a tramitar. “Esse plano de equilíbrio fiscal [Mansueto] será um momento em que eles vão também discutir o próprio regime de recuperação fiscal, à luz do exemplo da experiência do Rio de Janeiro e também da demanda de Minas Gerais e Goiás, além do Rio Grande do Sul.”

“O Rio Grande do Sul portanto continuará fazendo o seu plano e tomando as providências para equilíbrio fiscal e aguardando e acompanhando e trabalhando para que o congresso decida sobre o plano de equilíbrio fiscal em regime de recuperação fiscal o mais rápido possível que a gente imagina que eu conversei na semana passada posso acontecer nos próximos dois ou três meses.”

Reforma dos militares estaduais sai em 2020

O projeto de previdência dos militares gaúchos foi adiado e retirado da convocação extraordinária porque houve uma insegurança da base aliada na Assembleia local de que poderia haver um conflito entre esse projeto e o que já foi aprovado no Congresso Nacional, de uma alíquota unificada para os militares no Brasil, explicou o governador.

“O tema continua tramitando na Assembleia, nós não desistimos de discuti-lo, mas preferimos antes entrar com uma ação junto ao Supremo Tribunal Federal. O relator, o ministro [Luís Roberto] Barroso, é quem vai se pronunciar sobre a legalidade deste ato da União, que na verdade acabou legislando sobre alíquotas”. A partir da decisão do ministro, o encaminhamento do projeto será decidido.

O governador não é contra as compensações recebidas pelos militares. O que não considera razoável é que eles tenham ainda um outro benefício, que seja uma alíquota de contribuição menor. “Entendo que os militares, e especialmente as polícias militares, pela natureza da sua atividade, de grande exposição da própria vida em risco, eles merecem compensação. É de interesse público que haja uma compensação... Os militares são os únicos que têm paridade e integralidade nos seus vencimentos na aposentadoria”.

Mas disse que a reforma é crucial para a saúde previdenciária da própria categoria. “Porque isso torna o sistema mais caro, compromete o próprio pagamento dos seus salários e ainda dificulta a situação fiscal do governo para os próprios investimentos em segurança pública. A gente não pode ter algo que não se sustenta financeiramente e consequentemente punir de outro lado os próprios servidores, os próprios servidores da segurança com precarização de investimentos, vai significar maior exposição deles ao risco”.

Projetos da Reforma RS

Aprovados

  • PEC 285/2019: atualiza regras previdenciárias e altera carreiras dos servidores. Aprovada em primeiro turno por 35 votos favoráveis a 16 contrários e, em segundo turno, por 36 a 16.
  • PLC 2/2020: atualiza o estatuto dos servidores públicos civis do Estado. Recebeu 36 votos a favor e 17 contrários.
  • PL 3/2020: altera o Estatuto do Magistério. Aprovado por 32 votos a favor e 19 contrários.
  • PLC 503/2019: adequa as regras de previdência dos servidores civis gaúchos à legislação federal. Aprovado em dezembro por 38 a 15.
  • PLC 4/2020: modifica a remuneração mensal dos servidores do Instituto-Geral de Perícias (IGP). Aprovado por unanimidade, com 53 votos.
  • PLC 509/2019: modifica a aposentadoria especial de policiais civis e agentes penitenciários. Recebeu 49 votos favoráveis e 3 contrários.
  • PLC 6/2020: altera o Estatuto dos Militares. Aprovado por 37 votos favoráveis e 16 contrários.

Não foi apreciado

  • PLC 5/2020: modifica a previdência dos militares estaduais

Outros projetos aprovados 

  • PL 500/2019: permite a dação em pagamento de bens imóveis pertencentes ao Estado para quitação de débitos com os municípios na área da Saúde. Aprovado por unanimidade, com 53 votos.
  • PL 1/2020: altera o sistema de incentivo para programas sociais, da Cultura e do Esporte e da Assistência Social. Aprovado por unanimidade, com 51 votos.
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