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Congresso e TSE criaram grupo de trabalho para discutir o adiamento das eleições de 2020 em tempos de pandemia.
Adiamento das eleições é debatido no Congresso| Foto: Arquivo/Gazeta do Povo

Em um ano típico de eleições, esse seria o período em que as articulações políticas estariam se intensificando, com reuniões cada vez mais frequentes, notícias de negociações entre lideranças partidárias e rumores de quem sai ou não candidato em outubro. Mas 2020, definitivamente, está longe de ser um ano eleitoral típico.

A pandemia do novo coronavírus colocou o país – e o mundo – em suspenso, impondo o isolamento social e paralisando uma série de atividades. Ainda sem uma perspectiva clara de quando a epidemia irá perder força e quais seus desdobramentos futuros, a realização do pleito no dia 4 de outubro, para escolher novos prefeito e vereadores, é uma possibilidade cada vez mais distante.

Em entrevista coletiva no último dia 26 de maio, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, afirmou que o órgão está se preparando para realizar as eleições na data marcada. Porém, ressaltou que “a imprevisibilidade é a marca deste momento”. “As pessoas estão procurando estudar as curvas da doença para saber quando ela vai começar a decrescer, mas há risco de segunda onda. Não estamos lidando com uma doença conhecida e, portanto, estamos tratando com muita cautela, e uma das cautelas é não fazer previsões para um futuro muito distante”, disse.

Barroso não estipulou um prazo para definir se o pleito será mantido ou adiado, limitando-se a dizer que “o limite será as autoridades sanitárias relevantes dizerem ao TSE e ao Congresso Nacional que há um risco grande para a saúde pública na realização das eleições”. No Congresso Nacional, foi criada uma comissão mista, formada por deputados e senadores, para discutir em conjunto com o TSE qual a decisão a ser tomada. Já há propostas tramitando nesse sentido, prevendo apenas o adiamento ou estendendo o mandato de prefeitos e vereadores nos mais de 5,5 mil municípios brasileiros.

As propostas para adiar as eleições que estão na mesa

A realização das eleições municipais no primeiro domingo de outubro está regulamentada no artigo 29 da Constituição Federal. Portanto, para que essa data seja alterada, é necessária a aprovação de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) em quatro votações, duas no Senado e duas na Câmara Federal. Quatro PECs nesse sentido já foram protocoladas no Senado, duas delas apenas adiando a votação e as outras duas propondo a prorrogação dos mandatos de prefeitos e vereadores.

De autoria do senador José Maranhão (MDB/PB), a PEC 22/2010 propõe que as eleições sejam adiadas pelo período de dois meses, com o primeiro turno se realizando no primeiro domingo de dezembro e o segundo turno, onde houver, no último domingo do mês. “O que dará condições a que, inclusive, sejam respeitados os mandatos dos atuais prefeitos, vice-prefeitos e vereadores”, justifica o autor do projeto.

Já a PEC 18/2020, do senador Randolfe Rodrigues (Rede/AP), é mais específica: transfere o pleito para 6 de dezembro e, onde houver segundo turno, para o dia 20 do mesmo mês. Isso também sem alteração dos mandatos e da posse dos eleitos, no dia 1º de janeiro de 2021. “Esses dois meses de adiamento serão tempo primordial para que seja possível a previsão e o estímulo para que, caso seja necessário, as reuniões, visitas e comícios e debates ocorram de forma não presencial”, diz Randolfe na justificativa da PEC.

As outras duas propostas são mais polêmicas, já que incluem, além do adiamento, a prorrogação de mandatos. A PEC 16/2020, protocolada pelo senador Marcelo Castro (MDB/PI), “autoriza o Tribunal Superior Eleitoral a adiar as eleições municipais de outubro de 2020, em caso de necessidade”, sem estabelecer uma data ou prazo de adiamento. Apesar de manter os mandatos atuais, estende os dos eleitos por mais dois anos, até 2026, a fim de unificar as eleições gerais. “Nesse novo modelo, os partidos se tornarão naturalmente mais orgânicos e programáticos, uma vez que serão forçados a ter propostas uniformes e coerentes para todos os entes da Federação”, sustenta Castro.

Por fim, a PEC 19/2020, do senador Wellington Fagundes (PL/MT), não versa sobre a mudança de data das próximas eleições, mas estende até 2022 o mandato dos prefeitos e vereadores em exercício. Um dos objetivos, de acordo com o parlamentar, é “dar segurança jurídica ao pleito eleitoral municipal previsto para este ano, mas que inevitavelmente deverá ser adiado em razão da calamidade pública desencadeada pela pandemia do Covid-19”.

Mais tempo de mandato?

Apesar de as mudanças estarem ainda em discussão no Congresso, a prorrogação de mandatos, atuais ou futuros, está praticamente descartada. Em entrevistas, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM/RJ), tem afirmado que é “quase unanimidade” entre os parlamentares o adiamento das eleições sem prorrogação de mandatos. Posicionamento defendido também pelo presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, para quem “a periodicidade das eleições e a alternância no poder são dois ritos vitais para a democracia”.

“É preciso fazer uma separação bem clara entre adiar e unificar as eleições. Esse discurso que defende a unificação, usando um argumento de que reduziria os custos, beira à simplicidade e não tem nenhuma base teórica. Fazer uma mudança dessas nesse momento representaria um sério prejuízo à democracia”, afirma o presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-PR, Leandro Souza Rosa.

Para o advogado, é possível adiar a realização das eleições por um período curto, sem que isso traga prejuízos para os mandatos, tanto atuais como os futuros. “Com a regulamentação de uma PEC estabelecendo novas datas para a votação, todos os prazos do calendário eleitoral seriam automaticamente ajustados, preservando os princípios constitucionais. São ajustes possíveis e importantes para proporcionar a tranquilidade necessária”, avalia.

Como fica o calendário das eleições

Além das propostas para realizar as eleições no dia 6 de dezembro, há também uma sugestão do presidente da Câmara, Rodrigo Maia – não formalizada –, para que o primeiro turno ocorra no dia 15 de novembro. Independentemente da data a ser escolhida, o ideal é que uma definição ocorra até o início de julho, na opinião de David Fleischer, professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB). “Em julho começam as convenções partidárias, em que são definidos os candidatos. Uma mudança com esse calendário já em andamento pode trazer prejuízos para as outras etapas, como a propaganda eleitoral”, ressalta.

Pelo calendário atual, as convenções estão marcadas para o período entre 20 de julho e 5 de agosto. A propaganda eleitoral, por sua vez, estaria liberada a partir do dia 16 de agosto, enquanto o horário eleitoral no rádio e na televisão teria início no dia 28. O Instituto Liberdade Digital, organização que coordena pesquisas ligadas a tecnologia e políticas públicas, fez simulações do calendário eleitoral considerando três cenários possíveis: 15/11 (1º turno) e 6/12 (2º turno); 6/12 e 27/12; e 6/12 e 20/12.

No primeiro cenário, do dia 15 de novembro, a pesquisa considera que diplomar os candidatos mantendo o atual intervalo temporal não é possível. Nesse caso, a solução seria diminuir o tempo para prestação de contas dos candidatos de 20 para 10 dias. A segunda simulação considera inviável a realização de segundo turno no dia 27 de dezembro, visto que estenderia os mandatos para além de 31 de dezembro. No último cenário, o segundo turno seria possível, porém, com apenas sete dias de propaganda e quatro dias para prestação de contas daqueles que o disputarem.

“Entendemos que é importante tentar respeitar o tempo de campanha, especialmente diante do fato de que podemos ter uma campanha mais digital em um país desigual em termos de acesso à internet. Um tempo de campanha menor deve favorecer aqueles que já ocupam cargo no Legislativo ou Executivo, além daqueles que já têm uma presença digital”, diz o estudo do Liberdade Digital, assinado pelos pesquisadores Diogo Rais, Camila Tsuzuki e Alinne Gomes.

Treinamentos a distância

O presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, informou que, com ou sem adiamento, alguns processos relacionados ao pleito serão realizados a distância. É o caso do contato com os tribunais regionais e o treinamento de mesários, que serão feitos por videoconferência. Barroso disse ainda que o tribunal vai começar a estudar a adoção de ferramentas tecnológicas para baratear o processo eleitoral.

“Vamos investir tempo e energia em mecanismos de utilização de ferramentas que as pessoas já possuem, como celular, tablet ou computador pessoal. Alguns países do mundo já adotam esse modelo a distância. E nós vamos aprender o que tem sido feito pelo mundo afora e desenvolver nossas próprias tecnologias”, afirmou.

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