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Urnas eletrônicas usadas nas eleições.| Foto: André Rodrigues/Gazeta do Povo / Arquivo

Muitas mudanças eleitorais foram, e ainda estão sendo, discutidas pelo Congresso brasileiro ao longo de 2021. Mas poucas propostas foram aprovadas pelo Congresso a tempo de valer para as eleições de 2022. Como neste sábado (2) o país estará a exatamente um ano do primeiro turno das eleições, somente aquilo que foi aprovado pelos parlamentares até agora vai valer na disputa do ano que vem. Isso porque a legislação exige que mudanças nas eleições têm de ser aprovadas com pelo menos um ano de antecedência.

O Código do Processo Eleitoral, por exemplo, que traria as alterações mais substanciais, ainda está em tramitação no Senado. Mas o pleito do ano que vem terá algumas novas normas. A principal delas, segundo especialistas em Direito Eleitoral ouvidos pela Gazeta do Povo, é a que dá peso maior para os votos obtidos por mulheres e negros para calcular, posteriormente, a distribuição da verba dos fundos eleitoral e partidário. O objetivo da nova lei é incentivar candidaturas desses grupos minoritários na representação política. 

Confira a seguir o que mudará nas eleições do ano que vem, o que já foi aprovado para valer em outras eleições que não a de 2022, o que ainda está em discussão e quais as proposições que foram descartadas.

O que muda para as eleições de 2022

Incentivo financeiros às candidaturas de mulheres e de negros

Os votos obtidos por candidatos negros e mulheres à Câmara de Deputados terão peso duplicado no cálculo de distribuição dos fundos partidário e eleitoral. A contagem em dobro, porém, valerá apenas uma vez. Ou seja, uma candidata negra não terá os votos duplicados duas vezes por ser mulher e negra. A medida vale para as eleições de 2022 até as de 2030. O objetivo da nova regra é incentivar que os partidos invistam nas candidaturas desses grupos.

Para o advogado especialista em Direito Eleitoral Francisco Emerenciano, essa é a principal mudança que entrará em vigor nas eleições de 2022 e que pode ter o efeito de reduzir as chamadas “candidaturas laranjas” – quando mulheres são formalizadas como candidatas apenas para cumprir a cota obrigatória de gênero, sem nem mesmo fazer campanha.

Essa mudança consta da Emenda Constitucional da Reforma Eleitoral.

Fidelidade partidária mais flexível

Deputados federais, estaduais, distritais e vereadores poderão deixar o partido pelo qual foram eleitos sem perder o mandato, caso a legenda concorde com a saída – um entendimento que já vinha sendo adotado pela Justiça Eleitoral. Essa mudança consta da Emenda Constitucional da Reforma Eleitoral.

Essa possibilidade se soma a outras justificativas já previstas na Constituição para que um parlamentar deixe o partido sem perder o mandato: grave discriminação política pessoal contra o legislador; mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário;  incorporação, fusão do partido ou criação de novo partido; e a chamada “janela partidária”, período de 30 dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, que ocorre seis meses antes do pleito.

Federação partidária para salvar pequenos partidos

As coligações de partidos para as eleições de deputado e vereador não voltaram a ser permitidas. Mas a Lei 14.208 permite que partidos políticos criem federações partidárias – um novo dispositivo legal que permite que as legendas se unam e atuem como se fossem uma única agremiação partidária. A principal diferença em relação às coligações é que, sob a federação, os partidos deverão atuar juntos, tanto na eleição quanto na legislatura, permanecendo filiados à federação por pelo menos quatro anos. A mudança deve beneficiar partidos pequenos

A lei determina que as federações terão abrangência nacional e devem respeitar as normas que regem as atividades dos partidos políticos no que diz respeito às eleições, “inclusive no que se refere à escolha e registro de candidatos para as eleições majoritárias e proporcionais, à arrecadação e aplicação de recursos em campanhas eleitorais, à propaganda eleitoral, à contagem de votos, à obtenção de cadeiras, à prestação de contas e à convocação de suplentes”.

"As coligações partidárias sempre foram muito criticadas por representarem alianças de conveniência para as eleições, sem compromisso ideológico ou programático”, diz Luiz Eduardo Peccinin, advogado especialista em Direito Eleitoral. Ele lembra também que elas confundiam o eleitor, já que os votos de um candidato ou partido poderiam ajudar a eleger concorrentes de outras siglas – que nem sempre tinham a mesma orientação ideológica.

“As federações, por sua vez, impõem um compromisso nacional a esses partidos, que perdura por toda a legislatura, estimulando um compromisso duradouro e programático das agremiações, que não se encerra com as eleições”, diz Peccinin.

Já Francisco Emerenciano afirma que a criação das federações partidárias dá sobrevida a pequenos partidos que, com a extinção das coligações, corriam o risco de perder recursos do fundo partidário e tempo de propaganda gratuita em rádio e televisão. O PCdoB, por exemplo, é apontado como um dos principais beneficiários da nova lei, tendo liderado os esforços para que o veto do presidente fosse derrubado.

Contudo, o especialista lembra que a lei vai na contramão da tentativa de reduzir o número de partidos políticos no Brasil. Essa foi a justificativa dada pelo presidente Jair Bolsonaro ao vetar integralmente o projeto das federações partidárias – o veto, contudo, foi derrubado pelo Congresso.

“A vedação às coligações partidárias nas eleições proporcionais, combinada com as regras de desempenho partidário para o acesso aos recursos do fundo partidário e à propaganda gratuita no rádio e na televisão, tiveram por objetivo o aprimoramento do sistema representativo, com a redução da fragmentação partidária e, por consequência, a diminuição da dificuldade do eleitor de se identificar com determinada agremiação. Assim, a possibilidade da federação partidária iria na contramão deste processo, o que contraria interesse público”, escreveu Bolsonaro na justificativa do veto.

Improbidade sem prejuízo aos cofres públicos não resulta em inelegibilidade

Gestores públicos que tiveram suas contas rejeitadas por ato de improbidade administrativa, mas que não geraram prejuízo aos cofres públicos ou que foram punidos apenas com o pagamento de multa, não perderão o direito de concorrer a cargos públicos.

A lei foi sancionada na quinta-feira (30) por Bolsonaro, que argumentou que é preciso “evitar sanções desproporcionais para quem foi punido por infrações meramente formais, com pequeno potencial ofensivo, que não tenham causado danos ao Erário nem enriquecimento ilícito aos agentes”.

Até então, a legislação previa a inelegibilidade, por oito anos, dos gestores que tiveram suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por “ato doloso de improbidade administrativa e por decisão irrecorrível do órgão competente”.

Sobras eleitorais

O Congresso aprovou outra lei que muda regras eleitorais, sancionada por Bolsonaro nesta sexta-feira (1.º). Ela altera aspectos da distribuição das chamadas “sobras eleitorais”, que são as cadeiras do legislativo não preenchidas pelos critérios do sistema proporcional.

Essas sobras são disputadas pelos partidos que não atingiram o quociente eleitoral (número de votos válidos dividido pelo número de lugares a preencher em cada circunscrição eleitoral – Câmara dos Deputados, assembleias legislativas e câmaras municipais – desprezada a fração).

A nova lei prevê que poderão concorrer a essas cadeiras apenas partidos que alcançarem pelo menos 80% do quociente eleitoral, e os candidatos que tenham obtido votos em número igual ou superior a 20% desse quociente. Se nenhum partido alcançar o quociente eleitoral, serão eleitos os candidatos mais votados.

O texto também determina que cada partido poderá registrar candidatos para a Câmara dos Deputados, a Câmara Legislativa, as Assembleias Legislativas e as Câmaras Municipais no total de até 100% do número de lugares a preencher mais um – na lei até então em vigor, o número era de 150%.

O presidente, porém, vetou dois trechos que haviam sido aprovados pelo Congresso, os quais possibilitavam que partidos registrassem candidatos no total de até 150% das respectivas vagas em unidades da Federação com menos de 18 cadeiras na Câmara dos Deputados ou em municípios com menos de 100 mil habitantes. Esses vetos ainda precisam ser apreciados pelo Congresso.

Mudanças aprovadas que só valem depois das eleições de 2022

Consultas populares sobre decisões de Câmaras Municipais

Consultas populares locais sobre questões aprovadas pelas Câmaras de Vereadores poderão ser realizadas junto com as eleições municipais. As consultas precisam ser encaminhadas à Justiça Eleitoral 90 dias antes do dia das eleições. Contudo, manifestações contrárias ou favoráveis a essas propostas não poderão ser promovidas em propagandas gratuitas no rádio e na televisão.

Data de posse para presidentes e governadores

A partir das eleições de 2026, o presidente e o vice eleitos tomarão posse em 5 de janeiro do ano seguinte ao pleito eleitoral. Os governadores e seus vices, por sua vez, começarão seus mandatos em 6 de janeiro.

A data da posse de presidente e governadores eleitos em 2022 continua sendo 1.º de janeiro.

Propostas eleitorais ainda em debate

As mudanças eleitorais mais extensas e significativas estão no projeto que cria o Código do Processo Eleitoral, mas ele não foi aprovado a tempo de valer nas eleições do próximo ano.

Entre as principais propostas em discussão estão:

  • Tipificação do crime de caixa dois, com pena de dois a cinco anos de prisão e multa – mais leves do que as que vinham sendo aplicadas no âmbito da Lava Jato em algumas situações em que a prática era considerada como corrupção.
  • Proibição da divulgação de pesquisas eleitorais na véspera e dia das eleições.
  • Criminalização da divulgação sistemática de notícias falsas que questionem a integridade do processo eleitoral, com pena de um a quatro anos de prisão.
  • Descriminalização do transporte de eleitores, punindo o ato apenas com aplicação de multa – a legislação atual prevê prisão de até seis anos, além de multa.
  • Descriminalização da propaganda eleitoral de boca de urna, os comícios, as carreatas e o uso de alto-falantes para fazer campanha política no dia da eleição.
  • Utilização de recursos do fundo partidário para “gastos de interesse partidário” – o que pode abrir brecha para que dirigentes usem a verba para seu próprio proveito, como compra de bens.
  • Contratação de empresas privadas, pelas legendas, para auditoria de contas dos partidos políticos – o que é feito atualmente pela Justiça Eleitoral.
  • Redução do prazo, de cinco para dois anos, para a Justiça Eleitoral analisar a prestação de contas dos partidos.
  • Redução do valor da multa aplicada a partidos em caso de reprovação das contas apresentadas, com teto de R$ 30 mil para multas.
  • Permissão para que o Congresso casse decisões do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), caso entenda que as regulamentações do órgão estejam em desacordo com o Código.
  • Quarentena eleitoral de cinco anos para militares, policiais, juízes e membros do Ministério Público, após afastamentos dos cargos públicos. Ou seja, eles não poderia disputar eleições por pelo menos cinco anos depois de deixar seus cargos.

O texto do Código Eleitoral, com mais de 900 artigos, foi aprovado pela Câmara dos Deputados em 9 de setembro. E agora está sendo analisado pelo Senado.

Temas que ficaram de fora

Durante o ano também foram discutidas outras possibilidades de alteração das regras eleitorais, como a volta das coligações partidárias nas eleições de deputado e vereador e até mesmo uma proposta que previa acabar com o segundo turno das eleições para presidente, governadores e prefeitos a partir de 2024. Essas propostas não foram aprovadas pelo Congresso.

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