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O deputado Fábio Trad (PSD-MS) afirmou que a declaração do presidente Jair Bolsonaro sobre a Justiça Eleitoral – o chefe do Executivo disse ter provas de que as urnas eletrônicas são fraudadas e que ele teria vencido a disputa de 2018 no primeiro turno – “reforça a tese que alguns sustentam que o presidente desistiu de unir o Brasil”.

Trad classificou a manifestação de Bolsonaro como um “escândalo de proporção mundial”, e expôs que essa definição vale tanto para o caso de o presidente conseguir provar a fraude, quanto se isso não ocorrer. “Como é que um presidente vocaliza uma acusação dessa natureza, dessa magnitude, que atinge instituições democráticas, e não apresenta provas”, questionou o parlamentar, em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo.

O deputado também disse que confia nas urnas eletrônicas brasileiras. Na quarta-feira (10), Bolsonaro havia dito, em reforço à fala anterior: "quero que me ache um brasileiro que confia no sistema eleitoral". “Confio nas urnas eletrônicas e nas autoridades da Justiça Eleitoral brasileira. Não há nenhuma razão para eu descrer. Se houver um problema operacional, ele é tópico, é periférico, nada que atinja a integridade do sistema”, apontou Trad.

Coronavírus: Bolsonaro precisa se ajustar à realidade
Em relação à pandemia do coronavírus, o deputado elogiou a postura do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, ao lidar com a situação, mas criticou o presidente. “Acho que o ministro [da Saúde, Luiz Henrique] Mandetta está agindo positivamente. Ele não desespera a população, ele é muito sereno, ele é seguro, passa essa segurança para todos”, disse Trad.

“Agora, algumas declarações do presidente Bolsonaro precisam se ajustar à realidade”, criticou o parlamentar. “Cada relação dele que incendeia o quadro político contribui para desestabilizar a economia e quem perde com isso? Os pobres, os vulneráveis”, afirmou.

Orçamento impositivo é saudável para democracia
Outro assunto em evidência nas últimas semanas é o orçamento impositivo. O governo fez um acordo com o Congresso pela manutenção de um veto que devolveu ao Executivo o controle de R$ 30 bilhões do orçamento, mas o presidente tem reclamado da tentativa do Congresso em interferir no orçamento e chamou manifestações para o próximo domingo (15) como forma de pressionar os parlamentares.

“Qual o selo que garante a efetividade de um acordo? O cumprimento da palavra. E quando a palavra é seguida de uma assinatura, mais valiosa a palavra se torna. Se você nega a assinatura, e portanto a palavra, claro que fica difícil”, criticou Trad. “Quando o povo nas ruas vai defender a ruptura do sistema democrático é preocupante. Então eu acho que a história, lá na frente, vai se reportar a esse dia 15 como um momento não de ruptura, mas um momento muito claro: quem está a favor da democracia e quem está contra a democracia”, completou.

Para o deputado, o orçamento impositivo é benéfico para a democracia, porque desestimula o toma-lá-dá-cá entre Poder Executivo e o Congresso Nacional. “Emenda impositiva é saudável para a democracia. Porque combate o fisiologismo, combate o toma-lá-dá-cá, a partir do momento em que você dá ao Legislativo a autonomia para que os deputados destinem [emendas] sabendo que isso vai ser liberado. Então ele não vai precisar trocar o voto de consciência por uma questão de natureza conjuntural e financeira que seria nociva, como sempre foi nociva essa prática do orçamento impositivo, e isso tende a acabar”, disse.

Ele também criticou a postura do presidente em tentar desfazer o acordo feito com o Congresso sobre o tema. “Se o próprio presidente assinou o acordo no sentido de que R$ 15 bilhões ficariam com o poder Legislativo e os outros R$ 15 bilhões com o poder Executivo, eu não vejo razão para que ele negue a própria assinatura”, disse.

Propagação de fake news por empresários é crime contra segurança nacional
O deputado também classificou como “gravíssima” a suspeita de que empresários brasileiros estariam pagando impulsionamento de postagens com notícias falsas nas redes sociais. Para ele, trata-se de um crime contra a segurança nacional.

“Trata-se, no meu sentir, de uma organização criminosa rica que está financiando a prática de crimes. Que tipo de crimes? Tráfico? Não. Crime de estupro? Não. Crime contra a ordem democrática. Portanto, isso tem a ver com a Lei de Segurança Nacional. Isso é crime que tangencia a segurança nacional”, disse.

O deputado também rechaçou a acusação de governistas de que a CPMI das Fake News promove censura e uma tentativa de terceiro turno das eleições. “Eu penso assim: crime não tem se é de direita ou de esquerda, é crime. Então tem que ser apurado”, disse “O regime democrático brasileiro tem que estar centrado na boa fé dos argumentos, nos bons propósitos das discussões, em uma civilidade republicana do debate público”, completou.

Prisão em segunda instância
Trad é relator da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da segunda instância. O deputado garante que terá um relatório pronto para ser votado na comissão especial da Câmara até o início de abril. Ele ressalta que a PEC vai abranger todas as áreas do direito, não apenas para casos criminais. “Ela não é mais a PEC da prisão em segunda instância, ela é muito mais do que isso. Estavam querendo dar um choque, vamos supor, mínimo, agora vamos dar um choque máximo na Justiça brasileira. Um choque de efetividade, um choque positivo, para melhorar a Justiça”, disse o parlamentar.

O relator do projeto já recebeu sugestões do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, e do ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso, sobre o tema. Ele afirma que vai buscar um consenso na comissão em relação a entrada em vigor das novas regras. “A tendência da maioria [dos deputados] é que a PEC produza seus efeitos apenas em relação aos processos iniciados após sua vigência”, disse.

Segundo Trad, o motivo não é político, mas jurídico. “Não é interessante do ponto de vista jurídico você fazer pesos desiguais. Para o crime, que é a liberdade, o bem maior depois da vida, imediatamente. E para os negócios, que relacionam-se ao patrimônio e portanto tem um status qualitativo inferior à liberdade, vai ter um tempo maior. Isso seria até iníquo. Então a ideia é fazer a PEC produzir os efeitos em relação aos processos iniciados a partir da sua promulgação”, afirmou.

Novo CPP vai trazer inovação para crimes cibernéticos e fake news
O deputado é também o presidente da comissão que discute a modernização do Código de Processo Penal (CPP) na Câmara. Ele diz que o relatório final da comissão está 90% pronto para ser votado e destaca inovações importantes, como crimes cibernéticos. “Se nós virarmos as costas para o que está acontecendo hoje na realidade digital nós estaremos evidentemente envelhecendo aquilo que vai nascer e nós não queremos que isso ocorra”, disse o deputado. Neste sentido, o novo CPP também deve contar com contribuições da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News, que se desenrola no Congresso.

Para Trad, ainda, o Congresso deve derrubar o veto do presidente Jair Bolsonaro ao dispositivo do pacote anticrime que triplicou a pena para crimes contra a honra cometidos na internet. “Eu acho até que o Congresso vai derrubar o veto do presidente que impediu que se aumente até o triplo a pena daqueles que praticam fake news injuriando, difamando e caluniando as pessoas. Porque há realmente uma tendência no sentido de se modernizar a legislação na área digital”, disse.

Confira a entrevista completa:

O Congresso se movimenta muito de acordo com as demandas da sociedade. A segunda instância apareceu quando o ex-presidente Lula foi solto.  Agora o assunto some de pauta, por conta de corona, orçamento e outros temas. Como fazer a segunda instância avançar?

Fábio Trad: É fazer o que estamos fazendo na comissão, estamos impulsionando os trabalhos e eu posso assegurar a vocês, de acordo com o que me disse o presidente da comissão, Marcelo Ramos (PL-AM): primeira semana de abril nós já teremos o relatório. Eu já tenho um relatório esboçado. Já tenho as principais partes do relatório já decididas na minha cabeça. Só quero que o presidente Marcelo Ramos designe a data para que a gente possa votar.

Isso mesmo com coronavírus e essas restrições que podem ser impostas ao Congresso, como evitar reuniões, sessões solenes?

Fábio Trad: A não ser que o presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ) suspenda as atividades da Casa, porque aí não temos o que fazer. Mas enquanto a Casa estiver funcionando a comissão estará funcionando e eu já quero apresentar o relatório. É uma demanda legítima da sociedade.

O senhor disse que já tem os principais pontos do relatório decididos. O ministro [da Justiça], Sergio Moro, apresentou algumas sugestões, o ex-ministro [do STF], Cezar Peluso, também esteve aqui e conversou com o senhor. O que foi sugerido por eles e o que dessas sugestões o senhor deve acatar no relatório?

Fábio Trad: Tanto o ministro Sergio Moro quanto o ex-ministro Peluso deixaram muito claro que são favoráveis à essência da PEC. Eles apresentam detalhes, sugestões periféricas. Nós estamos incorporando uma e outra no relatório. Mas o principal é que vai sair a PEC da segunda instância, pelo menos na comissão. Aí a bola é com o Rodrigo Maia (DEM-RJ) para que ele paute em plenário. E o que é a PEC da segunda instância? Ela não é mais a PEC da prisão em segunda instância, ela é muito mais do que isso. Estavam querendo dar um choque, vamos supor, mínimo, agora vamos dar um choque máximo na Justiça brasileira. Um choque de efetividade, um choque positivo, para melhorar a Justiça. Então todas as áreas do direito, desde a previdenciária até a criminal, as decisões de segunda instância vão ter executoriedade imediata.

Isto está pacificado entre os membros da comissão?

Fábio Trad: Está pacificado. Eu vejo consenso entre os membros da comissão no sentido de que ou se estende para todas as áreas, ou não se estende. Como eu entendo que deve se estender, então chegamos a esse consenso.

Moro e Peluso discordam, por exemplo, a partir de quando isso deve valer para todos. Peluso diz que a regra não pode retroagir, Moro discorda. Qual a opinião do senhor?

Fábio Trad: Ministro Moro defende que a PEC deva ser aplicada já para os processos pendentes. O ex-ministro Cezar Peluso entende que uma regra de transição seria benéfica. O que eu estou fazendo como relator, eu estou ouvindo os membros do colegiado para encontrar um ponto que pacifique, porque eu não quero apresentar um relatório para ficar truncado e não sair a PEC da segunda instância. A tendência da maioria é que a PEC produza seus efeitos apenas em relação aos processos iniciados após sua vigência. Mas não por uma razão política. Porque muitos dizem 'ah, é o Lula. Pega o Lula ou não pega o Lula?’. Não é por isso. É porque a partir do momento em que nós decidirmos que a PEC deve se estender para as outras áreas, previdenciária, cível, tributária e trabalhista, se você apresentar a PEC produzindo imediatamente seus efeitos, não vai dar tempo para comerciantes, empresários, os próprios reclamantes da Justiça do Trabalho, os reclamados, os que ingressam na Justiça Previdenciária, não dá tempo da coisa começar imediatamente. E também não é interessante do ponto de vista jurídico você fazer pesos desiguais. Para o crime, que é a liberdade, o bem maior depois da vida, imediatamente. E para os negócios, que relacionam-se ao patrimônio e portanto tem um status qualitativo inferior à liberdade, vai ter um tempo maior. Isso seria até iníquo. Então a ideia é fazer a PEC produzir os efeitos em relação aos processos iniciados a partir da sua promulgação.

Um argumento que é muito citado pelo pessoal que é contra é a questão do aprisionamento em massa que há no Brasil. Como o senhor responde a isso?

Fábio Trad: Primeiro, o Brasil prende muito, é também verdade que prende mal, mas se você observar proporcionalmente ao número de habitantes o Brasil não é o terceiro país que mais prende, fica lá em 16.º, 17.º lugar nos países. Então o que nós temos que observar, que isso não pode ser pretexto para a gente deixar a Justiça brasileira morosa, inefetiva. Não é justo uma pessoa entrar na Justiça e só ter o seu direito depois de 20 anos. Toda audiência pública que a gente faz tem um exemplo dessa natureza, ou do expositor ou de um deputado: ‘meu assessor entrou com uma ação na Justiça Trabalhista há 25 anos e não recebe’. Por que? O sujeito entra com recurso em cima de recurso, embargos, embargos, embargos e a coisa nunca acontece. Então agora vamos fazer com que a efetividade seja uma realidade concreta da Justiça. A questão do encarceramento eu também devo dizer o seguinte: é preocupante essa questão, mas nós aprovamos no pacote anticrime alguns institutos que vão ajudar a diminuir o encarceramento no Brasil. Por exemplo, o acordo de não persecução penal ajuda. No Código de Processo Penal que vai ser aprovado, tenho absoluta convicção, vamos incluir o plea bargain do sistema norte-americano regulamentado. Então eu penso que no fim das contas, entre avanços e alguns recuos, o saldo final é positivo para a Justiça, imensamente positivo.

O senhor mencionou o CPP, o senhor é presidente da comissão. Como está o trabalho da comissão? Existe uma expectativa de quando isso vai ao plenário? E quais as principais mudanças que estão sendo feitas?

Fábio Trad: Acabo de receber um comunicado por Whatsapp do relator João Campos (Republicanos-GO) dizendo que já está com o relatório 90% pronto aguardando apenas ouvir os últimos sub-relatores para encontrar o termo final e eventualmente, porque essa é a ideia dele, ser aprovado por unanimidade. É importante destacar o seguinte: o Código de Processo Penal atual é 1941. Ele não responde mais às exigências da sociedade contemporânea. Ele precisa se adequar. Só que este projeto com o qual nós estamos trabalhando é de 2009, então ele ainda tem um perfume do século XX. Nós precisamos fazê-lo século XXI. Para isso, o deputado João Campos está chamando ainda alguns juristas para tentar, por exemplo, disciplinar o processamento dos crimes cibernéticos. Hoje a criminalidade é digital. Pode observar, hoje crime contra a honra, muitas provas são apuradas via digital, então é uma nova realidade. Ele precisa fazer essa adequação para encontrar unanimidade na comissão.

A gente pode dizer então que um dos destaques do CPP é justamente tentar trazer crimes cibernéticos bem regulados?

Fábio Trad: Exatamente. Até porque se nós virarmos as costas para o que está acontecendo hoje na realidade digital nós estaremos evidentemente envelhecendo aquilo que vai nascer e nós não queremos que isso ocorra.

E aí entra também as fake news?

Fábio Trad: Sim, com certeza. Eu acho até que o Congresso vai derrubar o veto do presidente que impediu que se aumente até o triplo a pena daqueles que praticam fake news injuriando, difamando e caluniando as pessoas. Porque há realmente uma tendência no sentido de se modernizar a legislação na área digital.

Ainda sobre as fake news, a CPMI deve ter um papel importante na discussão do novo CPP?

Fábio Trad: Eu estou apostando muito na CPMI das Fake News. Agora descobriram que poderosos empresários brasileiros estariam financiando a indústria de fake news contra instituições democráticas. Gravíssimo. Trata-se, no meu sentir, de uma organização criminosa rica que está financiando a prática de crimes. Que tipo de crimes? Tráfico? Não. Crime de estupro? Não. Crime contra a ordem democrática. Portanto isso tem a ver com a Lei de Segurança Nacional. Isso é crime que tangencia a segurança nacional. É gravíssimo, eu até postei no meu Twitter. Agora, eu só queria fazer uma complementação: nós vamos aprovar na Câmara dos Deputados o crime de stalking. Em vários estados dos Estados Unidos já é crime há muito tempo. É a perseguição obsessiva, seja praticada por mulher contra homem, homem contra homem, homem contra mulher. Isso é um avanço porque também tem a ver com realidade digital.

Em relação à CPMI das Fake News: o pessoal do governo fala que é uma CPMI do terceiro turno, CPMI da censura. Como o senhor responde a isso?

Fábio Trad: Totalmente despropositada essa observação. Se encontrarem indícios de prática de crime relacionada à campanha da oposição que fez ao presidente Jair Bolsonaro, vamos também apurar e defender o mesmo rigor na aplicação da lei. Eu penso assim: crime não tem se é de direita ou de esquerda, é crime. Então tem que ser apurado. Fake News pode matar uma pessoa. Já aconteceu isso no Brasil, de uma pessoa ser linchada, parece que foi uma mulher. Colocaram uma foto dela dizendo que praticava bruxaria e matava crianças. A mulher estava andando na rua desprevenida e mataram a mulher. Fake news. E isso precisa ser combatido de forma dura pelo regime democrático brasileiro. O regime democrático brasileiro tem que estar centrado na boa fé dos argumentos, nos bons propósitos das discussões, em uma civilidade republicana do debate público. Hoje você entra no Twitter e posta qualquer coisa e é xingado. Eu não falo de mim, que sou deputado federal, mas eu vejo outras pessoas também, professores. Postam qualquer coisa, não vem um argumento à altura, já vem um xingamento pejorativo, enfim.

Como o senhor avalia esses documentos que têm chegado à CPMI que ligam gabinetes dentro do Congresso a esse disparo?

Fábio Trad: Gravíssimo. Porque relaciona o uso da atividade pública, parlamentar, para prática de crimes. Muito grave.

Como o senhor está avaliando a conduta do governo brasileiro até o momento em relação ao coronavírus?

Fábio Trad: Eu louvo a atitude do governo brasileiro. Acho que o ministro [da Saúde, Luiz Henrique] Mandetta está agindo positivamente. Ele não desespera a população, ele é muito sereno, ele é seguro, passa essa segurança para todos, e já se antecipou. Foi ele que disse que a OMS já deveria ter decretado o estado de pandemia e agora a OMS vem e confirma. Muito preparado. Então o governo está indo bem. Agora, algumas declarações do presidente Bolsonaro precisam se ajustar à realidade. A gente tem boa vontade. A gente quer o Brasil bem, a gente quer o Brasil funcionando. Essa briga de poder, eu sei que tem deputados que priorizam a briga de poder em relação ao país, mas não é nosso caso. Mas o presidente tem que ajudar a estabilizar a relação política. Cada relação dele que incendeia o quadro político contribui para desestabilizar a economia e quem perde com isso? Os pobres, os vulneráveis.

O senhor é de um estado de fronteira [MS]. Em relação ao coronavírus, isso traz uma preocupação adicional?

Fábio Trad: Traz. Eu defendo que o Ministério da Saúde monitore de forma efetiva se houver aumento. Aí a União vai ter que adotar providências mais enérgicas. Mas sempre em conjunto com os outros países. Esse negócio de fechamento de fronteira tem que ser bilateral, tem que ter uma conversa, porque é de cá para lá e de lá para cá. E por isso a situação é alarmante, mas não é desesperadora. Precisa ser enfrentada com seriedade, serenidade, responsabilidade. As pessoas precisam colaborar, fazer o que é certo. Então eu vejo com muita preocupação. Sobretudo o impacto no meu estado em relação às commodities. Meu estado é exportador: café, soja, boi. Isso pode impactar. Isso é muito ruim para o meu estado, principalmente.

E o senhor acha que o país está preparado para lidar com a crise do coronavírus tanto do ponto de vista de saúde, para atender todas as pessoas infectadas, sem criar um pânico, e também do ponto de vista econômico? Como o senhor falou, a economia do Brasil depende de importações e exportações. Nós temos condições de lidar com isso?

Fábio Trad: Nenhum país está preparado. Mas eu vejo e percebo claramente que o ministro da Saúde já se antecipa. Então ontem mesmo, já antevendo o que acontecerá, requereu ao Congresso uma liberação de R$ 5 bilhões, 5,8 bi. Nós vamos passar por um processo angustiante nos próximos meses, mas nós temos que enfrentar. É uma realidade. E eu vejo positivamente as ações preventivas que o governo Bolsonaro está tomando através do ministro Mandetta.

E a economia?

Fábio Trad: Com relação à economia, o Brasil não está preparado. Vamos aguardar as próximas manifestações do ministro Paulo Guedes. Agora, eu tenho convicção, eu conheço pessoalmente o presidente Rodrigo Maia: ele é colaborativo com o governo.  Ele não quer tomar espaço do presidente. O que está acontecendo é que as reformas têm que ser aprovadas, o governo tem que enviá-las, para que o Congresso possa impulsioná-las, e ele está fazendo o papel dele. Tanto que ele podria muito bem, nas últimas declarações, ser incendiário, aprofundar essa aparente tensão entre Executivo e Legislativo, e nós só estamos observando declarações contemporizadoras dele.

Qual a leitura que o senhor fez de todo esse episódio envolvendo Congresso, Planalto e Orçamento Impositivo? Na opinião do senhor, como deveria se dar a distribuição das emendas?

Fábio Trad: Emenda impositiva é saudável para a democracia. Porque combate o fisiologismo, combate o toma-lá-dá-cá, a partir do momento em que você dá ao Legislativo a autonomia para que os deputados destinem [emendas] sabendo que isso vai ser liberado. Então ele não vai precisar trocar o voto de consciência por uma questão de natureza conjuntural e financeira que seria nociva, como sempre foi nociva essa prática do orçamento impositivo, e isso tende a acabar. Em relação a esse último episódio, eu defendo um acordo, uma harmonização entre poder Legislativo e Executivo. E lamento que tenha chegado a esse ponto: uma queda de braço que só faz a população brasileira perder, porque não encontra uma definição e, se não houver esse acordo, que seja votado. Se o próprio presidente assinou o acordo no sentido de que R$ 15 bilhões ficariam com o poder Legislativo e os outros R$ 15 bilhões com o poder Executivo, eu não vejo razão para que ele negue a própria assinatura. Mas se ele o fizer, que apresente justificativa, e voltemos à mesa para encontrar um ponto consensual. O que não pode é a população achar que, por causa de dinheiro, o Brasil não anda. E isso é ruim. Tanto para ele, quanto para o parlamento.

Fábio Trad: E o senhor vai votar a favor dos PLNs do orçamento?

Fábio Trad: Se o presidente mantiver o acordo, vou votar favorável. 

É difícil negociar com o presidente nessas situações? Porque houve uma negociação em torno do veto, embora ele tenha agido contra o PLN?

Fábio Trad: Qual o selo que garante a efetividade de um acordo? O cumprimento da palavra. E quando a palavra é seguida de uma assinatura, mais valiosa a palavra se torna. Se você nega a assinatura, e portanto a palavra, claro que fica difícil. 

Como o senhor viu as declarações de Bolsonaro que questionaram a lisura do processo eleitoral?

Fábio Trad: Eu fiquei espantado. Vamos ver as provas. Primeiro também é preciso entender: quando ele recebeu essas provas? De quem ele recebeu essas provas? E quais são essas provas? Se de fato elas existirem, e confirmarem a fraude eleitoral, será um escândalo de proporção mundial. Agora… eu, nesse momento, estou perplexo. Quero saber até que ponto o presidente vai estender esse assunto, que compromete a lisura do processo que o elegeu. 

Ele disse que não há nenhum brasileiro que confia nas urnas. O senhor confia nas urnas eletrônicas?

Fábio Trad: Confio nas urnas eletrônicas. Confio nas urnas eletrônicas e nas autoridades da Justiça Eleitoral brasileira. Não há nenhuma razão para eu descrer. Se houver um problema operacional, ele é tópico, é periférico, nada que atinja a integridade do sistema. 

O senhor disse que se for comprovada a alegação do presidente, seria um escândalo de proporção mundial. E se ele não tiver provas?

Fábio Trad: Escândalo de proporção mundial. É óbvio. Como é que um presidente vocaliza uma acusação dessa natureza, dessa magnitude, que atinge instituições democráticas, e não apresenta provas? Isso comprova, reforça a tese que alguns sustentam que o presidente desistiu de unir o Brasil. E o presidente não pode desistir de unir o Brasil. Muitos dizem que ele é sedutor, no sentido político da palavra; que use essa sedução para unir o Brasil, para que o Brasil tenha uma coesão social que possibilite a aprovação estável de algumas reformas necessárias para o Brasil crescer. Enquanto essas declarações ocorrerem, essas declarações incendiárias, panfletárias e lamentáveis que o presidente Bolsonaro frequentemente vem se utilizando para o debate público, perde o Brasil.

O Aliança Pelo Brasil não concorrerá nas eleições de 2020 e o Brasil vive uma crise econômica. O senhor acredita que o presidente Bolsonaro é favorito à reeleição em 2022?

Fábio Trad: Depende da economia. Se ele chegar com ritmo de crescimento consistente lá em 2022, ele é favorito. Caso contrário, naturalmente, até lá vão surgir nomes que vão ser opositores ao governo e terão chances.

O que o senhor acha da convocação do presidente para manifestações contra o Congresso?  O presidente e o perfil oficial da Secom convocaram para as manifestações.

Fábio Trad: Alguém duvida que não vá surgir faixas pedindo o fechamento do Congresso e do Supremo lá? Ninguém duvida. Então, o que eu penso: povo nas ruas é bom no sistema democrático? É. Mas quando o povo nas ruas vai defender a ruptura do sistema democrático é preocupante. Então eu acho que a história, lá na frente, vai se reportar a esse dia 15 como um momento não de ruptura, mas um momento muito claro: quem está a favor da democracia e quem está contra a democracia. 

E o papel do presidente nesse processo?

Fábio Trad: É o que eu falo: ele poderia usar o poder político de sedução que ele tem, que muitos aderem a essa sedução presidencial, para unir o país. Sabe por que? Porque pessoalistas, petistas, gente de esquerda também pagam tributos. Eles têm o direito de ter um presidente que una o Brasil. Porque eles não querem ocupar toda a energia deles para ficar debatendo política. Eles querem trabalhar, querem prosperar. Querem cuidar dos filhos, querem ver os filhos crescer. Não ficar toda hora no Twitter, indo nas ruas, debatendo. Isso, na realidade, é a expressão de uma necessidade. Então eu penso: quanto mais o presidente Bolsonaro insistir na tática do “nós contra eles”, mais o Brasil vai perder. Nós vamos transformar politicamente o Brasil numa terra arrasada, e isso não é bom para a democracia.

Gostaria que o senhor fizesse uma análise do peso das redes sociais para o mandato parlamentar. É mesmo onde está a pressão política? Como é esse contato com os eleitores?

Fábio Trad: Rede social é importante, mas não é determinante. É um fator que agrega, que qualifica o mandato, essa comunicação permanente, transparência, isso é fundamental. A disposição do parlamentar de debater civilizadamente com os cidadãos, isso é fundamental. Agora, existem bolhas. E muitas delas são superficiais. Por exemplo: bolhas superficiais criminalizaram o fundo eleitoral. E eu defendo o fundo eleitoral, como uma medida extremamente benéfica à democracia brasileira. Porque é preferível você ser financiado pelo Estado do que você ser um refém de empresa, refém de um setor privado. Você vai transformar o seu mandato numa forma de escravidão. É isso que o eleitor quer? As redes sociais, muitas vezes superficialmente, produzem bolhas. E as pessoas, sobretudo eu vejo aqui alguns deputados, temem essas bolhas. E vão na onda. E isso é ruim. E a independência? Ele se elegeu para quê, para ficar olhando para onde estão indo as bolhas e se submeter a elas? Isso não é correto. Eu acho que nunca se exigiu tanta coragem e independência como valores fundamentais para o exercício da atividade parlamentar como agora. Ainda que isso cause desgaste. Você tem que exercer o mandato pensando na história, na responsabilidade histórica. Quando eu vejo parlamentar defendendo o fechamento do próprio Congresso, eu fico imaginando: ele está colocando a corda no seu próprio pescoço e vai ver o seu cadáver lá na frente sepultado pela história.

O senhor acredita que as redes sociais têm dificultado o processo de pacificação do país? Elas atrapalham o diálogo?

Fábio Trad: Não vejo as redes como fator de desagregação. Elas espelham muitas coisas, embora haja bolhas superficiais. Eu acho que essa questão da pacificação tem que vir daqui [Brasília]. Poder Executivo, poder Legislativo, poder Judiciário, nos três níveis, têm que dar o exemplo. E nós não estamos dando o exemplo. Infelizmente, nós estamos, hoje, refletindo, e retratando um momento de desagregação. 

O senhor acredita que a classe política falha na comunicação com a sociedade, nesse ponto? Porque são criadas bolhas, e é muito fácil as pessoas acreditarem em coisas que veem nas redes sociais...

Fábio Trad: Por exemplo, eu recebi agora uma pesquisa do Instituto Paraná e eu fiquei muito assustado. 51% dos brasileiros são contra fechar o Congresso. Mas 43% são a favor. É muito alto isso. Então 43% estão pedindo a ditadura? Mas aí você me pergunta: “por que o senhor se assustou?”. Não pelo fato em si. Mas eu atribuo muito a um comportamento da imprensa, já de décadas, que generaliza. Por exemplo, pega um fato, de um deputado, que se corrompeu, e de certa forma repercute com tanto estardalhaço, que faz a população acreditar que todos são iguais a ele. E aí contamina a instituição. E eu acho que a imprensa deveria sempre dizer: a instituição é uma coisa, mas este deputado, este senador, este presidente ou este vereador que praticaram este fato, são outra coisa. Porque na igreja tem bons padres e maus padres; na igreja evangélica tem bons pastores e maus pastores; no jornalismo tem bons jornalistas. Mas nós não generalizamos. E na política é diferente. Isso é perigoso para a democracia. 

O que se pode esperar do PSD para os próximos anos?
Fábio Trad: Equilíbrio, serenidade, defesa da governabilidade, apoio ao presidente Bolsonaro ao que for, segundo o partido, coerente com o nosso programa e bom para o Brasil, e crítica ao que for ruim. É um partido de centro. Você pode observar: se você fizer uma análise da história dos deputados federais, você vai ver no PSD gente de direita, de centro-esquerda e de centro-direita. E isso pode parecer uma incoerência. Mas quando nós estamos discutindo lá, nós amadurecemos muito. Porque tem muitos dogmas da direita, do centro de centro-esquerda que, quando são apresentados à mesa, nos fazem amadurecer para aprimorar nossas conclusões. Então eu hoje posso assegurar a você que, se o presidente Bolsonaro precisar de um partido para assegurar a governabilidade para o Brasil crescer, pode contar com o PSD. Mas não vai contar com o PSD no sentido de endossar qualquer medida de cunho autoritário ou anti-democrático.

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