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Qual a chance de o fim da reeleição ser aprovado e Bolsonaor não poder concorrer em 2022
Bolsonaro com a faixa presidencial: possibilidade de reeleição está em risco?| Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) disse, em artigo publicado no último domingo (6) nos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo, que errou ao defender a reeleição no Brasil para presidente, governadores e prefeitos. O artigo de FHC abriu um debate, ao menos nas redes sociais, que costuma reaparecer de tempos em tempos. E seu partido insinuou que pode tentar retomar a discussão sobre o fim da reeleição no Congresso – num movimento visto nos bastidores como uma ação antibolsonaro.

O mea culpa de FHC, que hoje se diz contra a reeleição, foi endossado pelo presidente nacional do PSDB, Bruno Araújo. Ele disse em entrevista à CNN Brasil que as reeleições causaram "um grande dano" ao Brasil e que a maior parte dos tucanos é favorável ao fim da possibilidade de reeleição.

Apesar disso, o congresso nacional do PSDB de 2019 defendeu a reeleição, o que reforçou a percepção de que a discussão sobre o assunto, neste momento, tem como alvo o atual presidente Jair Bolsonaro – que vê seus índices de popularidade aumentarem.

De qualquer modo, Bolsonaro em princípio não tem com o que se preocupar. Os parlamentares não vêm demonstrando interesse em colocar o assunto em discussão. E, mesmo que o fim da reeleição viesse ser aprovado, dificilmente tiraria de Bolsonaro a chance de tentar um segundo mandato.

Reeleição foi aprovada em 1997 e beneficiou FHC

A reeleição para cargos do poder Executivo foi instituída pela Congresso em 1997. A emenda constitucional garantiu um novo mandato ao próprio FHC um ano depois.

Todos os presidentes do Brasil que se candidataram à reeleição, aliás, venceram a disputa: Fernando Henrique Cardoso em 1998, Lula em 2006 e Dilma em 2014. Isso demonstra como o ocupante do cargo já larga com vantagem na eleição seguinte.

Várias PECs tramitam no Congresso

Caso o PSDB queira passar do discurso ao apoio formal à extinção da reeleição, não precisa apresentar uma nova proposta de emenda constitucional (PEC) ao Congresso. Diversas propostas tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado.

Os projetos – alguns tramitando há mais de cinco anos – abordam não apenas o fim da reeleição, mas também a modificação no tempo dos mandatos eletivos, a coincidência das eleições ou mesmo a proibição de que uma pessoa concorra novamente a um cargo que já exerceu, ainda que de modo não consecutivo.

Porém, apesar do grande número de propostas, o Congresso não tem tratado o assunto como prioridade. Projetos do Senado sobre o fim da reeleição tiveram avanço quase nulo entre 2015 e os dias atuais. Na Câmara, a proposta que mais andou é de 2009. Mas está paralisada desde junho do ano passado.

As explicações para a dificuldade de as discussões avançarem estão tanto na conjuntura política atual quanto em debates que remetem a anos anteriores.

Entre as barreiras atuais estão as outras agendas prioritárias da Câmara e do Senado, que vão se alternando ao longo dos anos. Atualmente, as duas Casas discutem também o tema reeleição, mas em outra esfera – a possível renovação de mandato de seus presidentes, o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) e o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Um semestre de eleições como o atual, em que haverá escolha de prefeitos e vereadores, também interfere na produtividade do Congresso. E há ainda a pandemia de coronavírus, que modificou as pautas de Câmara e Senado e paralisou as comissões, que são as portas de entrada dos diferentes projetos.

Profunda diferença de opiniões tende a deixar tudo como está

Além disso, quando o fim da reeleição foi debatido anteriormente, houve grande diversidade de opiniões sobre o tema – o que indica que o tema não teria uma apreciação rápida no Congresso.

Os parlamentares não apenas divergem entre si em relação à reeleição, mas também é comum que as lideranças políticas mudem de opinião sobre o assunto ao longo dos anos.

FHC, por exemplo, foi a favor da reeleição quando era presidente. Hoje é contra. Bolsonaro costumava ser crítico da reeleição – chegou a condenar a possibilidade de um segundo mandato presidencial na campanha eleitoral de 2018. Mas, agora, tem dito que vai se candidatar em 2022. O PT dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff também mudou de opinião sobre o assunto ao longo dos anos.

"Existe muita divisão em torno desse tema", diz o senador Reguffe (Podemos-DF), autor de uma PEC que extingue a reeleição. "Toda vez que se fala em reforma política, há uma grande preocupação dos parlamentares com seus interesses eleitorais próximos." Segundo Reguffe, que está no Senado desde 2015, não há diferença entre os atuais congressistas e os anteriores em relação ao assunto.

Reeleição de Bolsonaro seria "direito adquirido"

Uma eventual aprovação do fim da reeleição dificilmente iria tirar de Bolsonaro a possibilidade de disputar um segundo mandato. Os parlamentares, inclusive os independentes e da oposição, entendem que esse é um "direito adquirido" pelo atual presidente.

"Minha proposta não muda a regra do jogo. Quem foi eleito com o direito da reeleição permanece com esse direito. A proibição valeria para o sucessor", afirma o senador Reguffe.

"Nós consideramos que o direito a uma reeleição foi aprovado, e que Bolsonaro desfruta dele. Nosso problema com ele [Bolsonaro] é outro", diz o deputado federal Afonso Florence (PT-BA). Segundo o deputado do PT, o ex-presidente FHC defende o fim da reeleição para tentar inviabilizar uma nova candidatura de Bolsonaro. "Parece que FHC quer impedir Bolsonaro de tentar um novo mandato, para que o PSDB ocupe o lugar do centro", diz.

O Congresso, em tese, poderia votar uma modificação na Constituição ainda antes do fim do primeiro mandato de Bolsonaro, para proibir a reeleição, mas garantindo ao atual presidente o direito adquirido anteriormente. "Os legisladores poderão definir na proposta de emenda à Constituição a partir de qual eleição a nova regra tornar-se-á válida, ou lhe dar eficácia imediata para o próximo pleito", explica o advogado Renato Ribeiro de Almeida, membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político.

Parlamentares questionam capacidade de FHC influenciar o debate

O artigo publicado por FHC repercutiu nas redes sociais e foi mencionado por lideranças políticas de diferentes partidos. As abordagens variavam entre valorizar a "nobreza" de Fernando Henrique ao reconhecer um suposto erro e criticar a "hipocrisia" do tucano – já que ele foi beneficiado diretamente com a implantação da reeleição.

O deputado federal bolsonarista Márcio Labre (PSL-RJ) disse que "o debate está sendo colocado agora pelo FHC com o objetivo de inviabilizar o governo".

A possibilidade de FHC influenciar o debate sobre reeleição também é vista com ceticismo entre parlamentares. "Nem o próprio PSDB presta muito atenção em FHC. Logo, o que ele diz é irrelevante na realpolitik. Não influencia o Congresso. Além disso, a visão dele é míope, pois o problema do Brasil não é a reeleição, mas sim a falta de uma ampla reforma política que mude as regras do jogo, as quais influenciam em muito no resultado", afirma o deputado Marco Feliciano (Republicanos-SP).

Opositor tanto de FHC quanto do governo Bolsonaro, o deputado federal Afonso Florence (PT-BA) não identifica uma alteração nos rumos motivada pelo ex-presidente: "FHC não tem força política para estimular debate de nada. Ele é um ex-presidente sem densidade eleitoral, que tentou entrar no bolsonarismo e ficou no quinto escalão".

"É difícil dizer se ele [FHC] tem capacidade de influenciar ou não. Mas toda declaração que aborde o debate sobre reforma política é bem-vinda", rebate o senador Reguffe.

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