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Incoerências eleitorais em 2020: Flávio Bolsonaro, Rogério Marinho e o prefeito Waguinho (MDB), que será apoiado pelo PT
Flávio Bolsonaro, o ministro Rogério Marinho e o prefeito de Belford Roxo (RJ), Waguinho (MDB), que será apoiado pelo PT na tentativa de reeleição.| Foto: Prefeitura de Belford Roxo/divulgação

A decisão do PT de aprovar a coligação do partido com o MDB no município de Belford Roxo (RJ) ainda repercute entre militantes da sigla. Isso por causa de um fato que costuma marcar as eleições municipais: as incoerências eleitorais. A união fará com que o partido endosse a candidatura à reeleição do prefeito Waguinho (MDB), que é apoiador do presidente Jair Bolsonaro – recentemente, o emedebista participou de um evento público com o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e com o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, e disse que nenhum governo anterior ajudou tanto a cidade. A coligação em Belford Roxo motivou uma carta de repúdio que foi assinada por todos os ex-presidentes vivos do PT, à exceção de Luiz Inácio Lula da Silva.

A aliança não gerou críticas apenas na esquerda. Bolsonaristas do Rio também questionaram a coligação, por entender que Waguinho não deveria receber a chancela de candidato "oficial" do presidente da República na cidade. O deputado Carlos Jordy (PSL-RJ) foi um dos que questionou a parceria.

O caso do Rio de Janeiro é exemplo de um fenômeno que se repete à época das eleições municipais, e que começa a ser visto também em 2020: coligações nas cidades que contrariam as direções nacionais e candidatos que, mesmo sem aliança formal, buscam se aproximar de um integrante de uma legenda adversária para se aproveitar de sua popularidade.

Segundo o presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, o tamanho do Brasil e a complexidade do sistema político explicam aquilo que é visto por grande parte dos eleitores como incoerências eleitorais. "Pela dimensão do país, por nossas diferenças regionais, é impossível ter um total controle sobre alianças que são firmadas. A não ser em casos muito específicos", afirma.

Há ainda, segundo Siqueira, questões bem específicas da dinâmica local: "pode acontecer de uma pessoa nacionalmente se identificar mais com o PSB. Mas lá, na cidade, ela não consegue achar espaço no PSB local. Então acaba indo para outro partido, ainda que sua identificação seja com o PSB".

No Congresso Nacional, o Partido Socialista Brasileiro é uma das legendas de oposição à gestão Bolsonaro. Mas o partido de Siqueira se vê diante de uma suposta contradição na principal cidade do país. O ex-governador Márcio França, pré-candidato do PSB à prefeitura de São Paulo, participou de um evento público com Bolsonaro na cidade de São Vicente, litoral do estado. E, em entrevista recente ao jornal Valor Econômico, disse ter "afinidades" com o presidente da República.

A aproximação entre o pré-candidato do PSB e o bolsonarismo foi criticada por integrantes do PDT paulista, partido que também faz oposição a Bolsonaro no plano nacional. Antes do episódio, os pedetistas paulistanos haviam garantido apoio a França na disputa municipal.

Siqueira contesta que esteja se formando um vínculo entre o presidente e o ex-governador de São Paulo. "França quer o voto do eleitor do Bolsonaro, como todos os outros candidatos também querem. Isso não quer dizer que exista qualquer vinculação política. Todos os candidatos vão atrás de quem votou no Bolsonaro, no [Fernando] Haddad, no Ciro [Gomes], etc. Márcio França está no partido desde sua fundação e eu tenho inteira confiança nele", diz o presidente nacional do PSB.

Siqueira avalia que a eleição municipal forma novas lideranças políticas e aproxima os cidadãos do dia a dia partidário. Mas, para ele, em termos de coligações e alianças, seus efeitos para as disputas nacionais e estaduais são pequenas.

"Salvo nos grandes centros, como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife e outros, as eleições municipais têm um caráter muito paroquial. O peso delas não necessariamente reflete na disputa seguinte. Nós víamos isso quando o PT vencia as eleições presidenciais e, nas municipais, quem mais fazia prefeituras era sempre o PMDB. São dinâmicas diferentes", afirma Siqueira.

Um histórico de incoerências eleitorais

Eleições para as prefeituras (e mesmo para governos estaduais, que são realizadas nos mesmos anos da disputa presidencial) costumam ter coligações que desafiam a lógica.

Em 2016, as eleições municipais ocorreram pouco após a conclusão do processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. O afastamento detonou a aliança que PT e MDB (então PMDB) haviam firmado seis anos antes, e fez com que petistas passassem a chamar os emedebistas de "golpistas".

As animosidades no plano nacional não impediram que a aliança PT-MDB fosse a mais repetida nas eleições municipais daquele ano. Levantamento feito pelo jornal O Globo em 2016 identificou que o PT apoiava o MDB em 648 municípios, e que em 30% das coligações em que o MDB estava presente, o PT também compunha o grupo.

Não raras foram as ocasiões, em eleições municipais, em que PT e PSDB – partidos que rivalizavam na disputa pela Presidência da República até a ascensão do bolsonarismo – estiveram juntos. Em 2008, por exemplo, tucanos e petistas se apoiaram em 20% dos municípios do país, segundo levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo na época.

As circunstâncias locais também fazem com que parceiros históricos não estejam do mesmo lado em disputas municipais. Em Teresina (PI), nas eleições de 2016, o PCdoB integrou a coligação do prefeito Firmino Filho (PSDB), reeleito naquele ano.

Presidente do PCdoB no Piauí, José Carvalho alega que a decisão tomada à época se explicou por um cálculo eleitoral. "Nós tínhamos a meta de fazer ao menos um vereador, e entendemos que a aliança com o prefeito nos favorecia", disse. Segundo ele, pesou também o fato de Firmino não ter defendido abertamente o impeachment de Dilma Rousseff. "Isso foi um gancho que garantiu a nós que não teríamos um desconforto muito grande na coligação", declarou.

Para 2020, o PCdoB local seguirá um rumo mais habitual e apoiará em Teresina a candidatura de Fábio Novo (PT). Carvalho disse que o partido, no Piauí, terá como prioridade a construção de alianças com outras legendas que combatam o governo Bolsonaro. "Essa é a orientação geral para todo o estado. Pode ser que em algum município apareça alguma questão local, e aí analisaremos caso a caso", disse.

Resoluções são ferramentas dos partidos

A cúpula dos partidos tem uma ferramenta para tentar evitar alianças eleitorais nos municípios que fortaleçam grupos políticos adversários no plano nacional: as resoluções.

Elas são lançadas pelos partidos para tentar alcançar uma uniformização de suas rotinas, o que nem sempre ocorre. Em tese, um descumprimento dessas resoluções pode até levar a punição aos filiados que as descumprem – o que poderia evitar as incoerências eleitorais.

No caso da aliança do PT com um aliado de Bolsonaro em Belford Roxo (RJ), os ex-presidentes do partido e os militantes petistas que protestam contra a coligação alegam justamente que esse apoio contraria uma resolução editada pela direção nacional do partido no início do ano.

No texto, o PT determina que as coligações devem ser priorizadas com PCdoB, Psol, PDT, PSB, Rede, PCO e UP. Parcerias que não forem com esses partidos só podem ser firmadas se o candidato a ser apoiado "tenha compromisso expresso com a oposição a Bolsonaro e suas políticas e não tenha práticas de hostilidade ao PT e aos presidentes Lula e Dilma".

O partido é ainda mais explícito em outro trecho do texto, quando diz que "o PT Nacional decide que não ocorram alianças com os partidos que sustentam o projeto ultraneoliberal (DEM, PSDB) e veta qualquer aliança com aqueles que representam o extremismo de direita em nosso país".

O PSB também editou uma resolução, de teor semelhante, para evitar as incoerências eleitorais: "sobre coligações para as eleições municipais de 2020, a comissão executiva nacional resolveu proibir o apoio ou coligação com os candidatos vinculados politicamente ao Presidente Jair Bolsonaro".

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