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Presidente Jair Bolsonaro visitou o colega do STF, Dias Toffoli, na semana passada, para pedir o relaxamentos das regras de isolamento social: pressão sobre o Supremo.
Presidente Jair Bolsonaro visitou o colega do STF, Dias Toffoli, na semana passada, para pedir o relaxamentos das regras de isolamento social: pressão sobre o Supremo.| Foto: Marcos Corrêa/STF

O humor do Supremo Tribunal Federal (STF) com atos do governo federal parece ter mudado em 2020. O presidente Jair Bolsonaro passou a perder mais do que ganha na Suprema Corte, sobretudo após o início da pandemia de coronavírus. Bolsonaro tem reclamado com frequência das decisões do Supremo que o desagradam e chegou a dizer no início do mês que havia chegado a um limite.

No dia 30 de abril, Bolsonaro afirmou em frente ao Palácio do Alvorada que um ato do ministro do STF Alexandre de Moraes quase provocou uma crise institucional entre os poderes.

O presidente se referia à decisão que barrou a nomeação de Alexandre Ramagem para a diretoria-geral da Polícia Federal (PF). O ministro entendeu, a partir de uma reclamação do PDT, que houve desvio de finalidade do ato, “em inobservância aos princípios constitucionais da impessoalidade, da moralidade e do interesse público”, por Ramagem supostamente ser íntimo da família Bolsonaro.

Ramagem havia sido escolhido por Bolsonaro depois da exoneração de Maurício Valeixo, que culminou com o pedido de demissão de Sergio Moro do Ministério da Justiça. Moro alegou que o presidente queria interferir politicamente na PF porque tinha interesse em investigações no STF. Um inquérito foi aberto na Suprema Corte, a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), para investigar essa denúncia.

Recorde a seguir outras derrotas recentes do governo no Supremo Tribunal Federal e algumas poucas vitórias:

Medidas provisórias do governo foram derrubadas pelo STF

Compartilhamento de dados de telefonia com IBGE

Só nas últimas semanas o governo teve três medidas provisórias derrubadas ou modificadas pelo STF. A derrota mais recente foi na quinta-feira (8). Por 10 votos a um, os ministros suspenderam a MP que prevê o compartilhamento de dados de usuários de telecomunicações com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para a produção de estatística oficial durante a pandemia do novo coronavírus. O Supremo entendeu que a medida viola o direito constitucional à intimidade, à vida privada e ao sigilo de dados. A MP já estava suspensa por decisão liminar da ministra Rosa Weber.

Contaminação por Covid-19 é doença ocupacional

No dia 29 de abril, o plenário suspendeu a eficácia de dois dispositivos da medida provisória que autoriza empregadores a adotarem medidas excepcionais em razão do estado de calamidade pública decorrente da pandemia do novo coronavírus.

Por maioria, foram suspensos o artigo 29, que não considera doença ocupacional os casos de contaminação de trabalhadores pelo coronavírus, e o artigo 31, que ​limitava a atuação de auditores fiscais do trabalho à atividade de orientação.

Alterações na Leis de Acesso à Informação

Já no dia 30 de abril, o STF derrubou a medida provisória que fazia alterações na Lei de Acesso à Informação (LAI). A MP limitava o acesso às informações prestadas por órgãos públicos durante a emergência de saúde pública decretada em razão da pandemia do novo coronavírus.

Para o relator, ministro Alexandre de Moraes, a MP instituiu restrições genéricas e abusivas, sem qualquer razoabilidade, em ofensa a princípios constitucionais que consagram a publicidade e a transparência nos órgãos públicos.

Outras derrotas do governo no Supremo

Estados e municípios podem adotar regras de isolamento

Na última quarta-feira (6), o STF decidiu que estados e municípios podem adotar medidas de restrição à locomoção intermunicipal e local para enfrentar a pandemia do novo coronavírus, sem a necessidade de autorização do Ministério da Saúde para a decretação de isolamento, quarentena e outras providências.

Bolsonaro tem reclamado publicamente da impossibilidade de passar por cima de decisões e prefeitos e governadores para decretar o fim do isolamento social. O presidente defende a volta à normalidade para não prejudicar a economia. O isolamento social, porém, é uma recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) para deter o avanço da doença.

Na última quinta-feira (7), Bolsonaro chegou a fazer uma visita surpresa ao STF, acompanhado de ministros e empresários, para pressionar pelo fim do isolamento. O gesto foi interpretado como uma forma de pressionar a Corte a relaxar o distanciamento social. Mas o presidente do STF, Dias Toffoli, rechaçou essa ideia.

Veto à campanha publicitária contra isolamento

O STF também já proibiu a veiculação de uma campanha publicitária do governo contra o isolamento social. Em março, o ministro Luís Roberto Barroso acolheu pedido da Rede Sustentabilidade e proibiu o governo federal de veicular qualquer campanha que pregue o fim do isolamento social como medida de combate à disseminação do coronavírus no país, caso da peça com o mote "O Brasil não pode parar", que chegou a ser divulgada pela Secretaria Especial de Comunicação da Presidência da República e foi suspensa pela Justiça.

Barroso também determinou que a contratação para a campanha seja sustada. Barroso classificou a campanha como "desinformativa" e descompromissada com o interesse da população.

Expulsão de diplomatas venezuelanos de Maduro

No começo de maio, o ministro Luís Roberto Barroso suspendeu a expulsão de funcionários da Embaixada da Venezuela em Brasília e consulados em Belém, Boa Vista, Manaus, Rio de Janeiro e São Paulo. A retirada compulsória do corpo diplomático do ditador Nicolas Maduro havia sido determinada por ato do presidente da República e do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo.

Barroso considerou que pode ter ocorrido violação a normas constitucionais brasileiras, a tratados internacionais de direitos humanos e às convenções de Viena sobre Relações Diplomáticas e Consulares.

Negada liminar para encerrar CPI das Fake News

O ministro Gilmar Mendes negou no dia 30 de abril um pedido no qual o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) buscava impedir a prorrogação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News no Congresso e excluir a validade de duas reuniões do colegiado.

O Palácio do Planalto teme que a investigação legislativa possa subsidiar o inquérito no STF que apura a disseminação de fake news e atingir deputados bolsonaristas.

Inquéritos e recursos no STF que incomodam o governo

Weintraub é investigado por suposto racismo contra chineses

O Supremo também tem investigações em aberto que incomodam o governo. Além do inquérito aberto para apurar as denúncias de Moro, o STF também investiga o ministro da Educação, Abraham Weintraub. 

O ministro Celso de Mello determinou a instauração de inquérito contra Weintraub por suposta prática de racismo contra os chineses em uma publicação no Twitter. O pedido de abertura de investigação partiu da PGR.

Na rede social, Weintraub disse que a China vai sair "relativamente fortalecida" da crise do coronavírus e que isso condiz com os planos do país de "dominar o mundo". Na publicação, posteriormente apagada, ele troca a letra “R” pela letra “L”, ironizando o fato de alguns chineses falarem o português desse jeito, conforme a peça apresentada pela PGR.

Disseminação de fake news contra ministros do STF

O STF também tem outros dois inquéritos que podem trazer dor de cabeça para os aliados do governo. Um deles investiga os responsáveis pela disseminação de fake news contra ministros da Corte e outras autoridades políticas. O inquérito é sigiloso e relatado pelo ministro Alexandre de Moraes, que foi escolhido por Toffoli sem sorteio, como é praxe no STF.

O inquérito investiga a participação de políticos na divulgação de notícias falsas, que teriam produção e disseminação articuladas pelo chamado “gabinete do ódio” no Palácio do Planalto. Além de deputados do PSL, a Polícia Federal investiga a participação de Carlos Bolsonaro, o filho "02" do presidente.

Realização de atos públicos que pregam fechamento do Congresso e do Supremo

Outro inquérito, também conduzido por Alexandre de Moraes, foi aberto a pedido da PGR para apurar a participação de parlamentares bolsonaristas na convocação e no financiamento de manifestações antidemocráticas no dia 19 de abril, que tiveram como pauta, além da defesa do presidente e de críticas às medidas de isolamento social adotadas por governadores por conta da pandemia de coronavírus, manifestações de defesa da volta da ditadura e de um novo AI-5.

O presidente chegou a participar de um ato em Brasília, onde discursou aos manifestantes em cima de uma caminhonete em frente ao quartel general do Exército, em Brasília.

Interferência política na PF

O ministro Celso de Mello abriu inquérito para investigar a denúncia do ex-ministro Sergio Moro de que o presidente Jair Bolsonaro tentou interferir politicamente na Polícia Federal ao demitir o diretor-geral da corporação, Maurício Valeixo. Bolsonaro pode ser enquadrado em cinco crimes se as acusações forem confirmadas. Moro já prestou depoimento, assim como delegados da PF envolvidos no caso.

Três ministros militares que participaram de uma reunião em que o ex-juiz da Lava Jato foi pressionado por Bolsonaro a mudar o comando central da PF e a superintendência no Rio de Janeiro devem prestar depoimento. O vídeo dessa reunião foi requisitado pelo STF e é uma das provas materiais do inquérito.

Apresentação dos exames do presidente sobre Covid-19

O ministro Ricardo Lewandowski foi sorteado relator da ação em que o jornal O Estado de S.Paulo pediu que a corte suspenda a decisão do presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), João Otávio de Noronha, que desobrigou o presidente Jair Bolsonaro de apresentar exames feitos para detectar o coronavírus.

Lewandowski pode decidir de forma individual sobre o tema, mas a julgar pelas últimas polêmicas deve remeter o caso para análise do plenário do STF. O jornal recorreu também ao próprio STJ contra a decisão monocrática de Noronha. O recurso será apreciado por um colegiado de ministros do tribunal.

Governo também colheu vitórias, mas foram poucas

Recentemente, o governo tem tido poucas vitórias no STF. No dia 5 de maio, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, afastou decisão da Justiça Federal que determinava a retirada de texto alusivo à ordem do dia 31 de março de 1964 do site do Ministério da Defesa.

A medida cautelar havia sido proferida pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5) e implicava, segundo Toffoli, censura à livre expressão de ministro de Estado no exercício de ato discricionário e rotineiro.

Já no dia 30 de abril, Celso de Mello determinou o arquivamento de um habeas corpus que pedia que fossem invalidadas as exonerações de Sergio Moro do Ministério da Justiça e de Maurício Valeixo da direção-geral da PF e que ambos fossem reintegrados aos cargos.

Mudança no regimento do STF pode vetar "canetadas"

Depois de uma série de decisões monocráticas – quando um único ministro toma a decisão – Marco Aurélio Mello sugeriu uma mudança no regimento interno do STF para que casos envolvendo atos dos poderes Legislativo e Executivo só possam ser analisados em plenário, pelos 11 ministros da Corte.

Diante da possibilidade de um dos integrantes do Supremo, isoladamente, poder suspender ato praticado por dirigente de outro poder, o ministro Marco Aurélio destacou que “esforços devem ser feitos visando, tanto quanto possível, preservar a harmonia preconizada constitucionalmente, surgindo, de qualquer forma, com grande valor, o princípio da autocontenção”, devendo ser conferida “ênfase à atuação colegiada”.

A proposta foi encaminhada ao ministro Luiz Fux, presidente da comissão de regimento do STF. Fux, por sua vez, pediu um parecer da PGR e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) sobre a proposta.

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