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No momento em que a Lava Jato enfrenta a maior carga de pressão desde a deflagração, em 2014, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem pela frente ao menos sete julgamentos decisivos para o futuro da operação e do combate à corrupção no país.

O Supremo deve se posicionar sobre temas que interessam diretamente aos procuradores da Lava Jato e ao ex-juiz do caso, o ministro da Justiça, Sergio Moro, como a prisão em segunda instância, a suspeição da força-tarefa e de Moro, a anulação de sentenças em primeira instância e o compartilhamento de dados de órgãos de controle.

1) Anulação de sentença de Moro… no caso Banestado

A Segunda Turma está julgando no plenário virtual até quinta-feira (19) um recurso de um doleiro condenado por Moro no caso Banestado. O julgamento pode ser um termômetro para o futuro da Lava Jato nos casos que o colegiado vai analisar em relação à operação.

No caso em questão, os ministros vão analisar argumentos da defesa de que Moro desempenhou funções típicas da acusação ao longo da fase processual – argumento muito parecido com o que está sendo usado agora pelas defesas de réus da Lava Jato, a partir da divulgação de mensagens no Telegram atribuídas a Moro e outros integrantes da Lava Jato em Curitiba.

A defesa do doleiro Paulo Roberto Krug pede a nulidade do processo “diante do claro e inequívoco impedimento” de Moro. Os advogados argumentam que já na fase de investigação do caso, o então juiz participou ativamente da produção de provas da acusação.

Além disso, Moro teria juntado uma série de documentos nos autos depois de encerrado o prazo para as alegações finais das defesas – última oportunidade de os acusados se defenderem das acusações antes da sentença. O ex-juiz também teria colhido depoimentos de outro doleiro, Alberto Youssef, para firmar o acordo de delação – o que é atribuição do Ministério Público. 

2) Anulação de sentença do sítio em Atibaia

Recentemente, a Segunda Turma do STF surpreendeu ao anular pela primeira vez uma sentença de Moro na Lava Jato. Os ministros analisaram um recurso da defesa do ex-presidente da Petrobras, Aldemir Bendine, e anularam a condenação de 11 anos imposta a ele pelo ex-juiz da Lava Jato. O argumento da defesa, aceito por três dos quatro ministros presentes na sessão, era de que os réus que firmaram acordo de delação deveriam entregar as alegações finais – último argumento pela absolvição antes da decisão do juiz – antes dos demais réus acusados no processo.

O relator da Lava Jato na turma, Edson Fachin, ficou isolado em sua posição contrária à argumentação da defesa. A surpresa no placar ficou por conta da ministra Cármen Lúcia, que geralmente vota junto com Fachin a favor das teses da Lava Jato. Neste caso, porém, ela acompanhou a opinião dos ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, críticos ferrenhos dos métodos da operação.

A força-tarefa da Lava Jato em Curitiba argumenta que a decisão pode ter um efeito cascata nas sentenças proferidas em primeira instância. Um levantamento exclusivo da Gazeta do Povo mostra que pelo menos 32 sentenças, com mais de 100 réus condenados, podem ser anuladas se o precedente aberto pelas Segunda Turma do STF for aplicado em outros casos.

A defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no processo do sítio em Atibaia, havia feito um pedido idêntico ao de Bendine, para alterar a ordem de apresentação das alegações finais no processo. O processo é um dos 32 que podem ser revistos pelo STF.

A Segunda Turma vai analisar o pedido de Lula no dia 24 de setembro. No habeas corpus, a defesa pede a anulação da sentença, já que o prazo para entrega de alegações finais foi o mesmo para delatores e delatados.

A defesa também pede a discussão da eficácia de liminar do Comitê de Direitos humanos da Organização das Nações Unidas (ONU). Os advogados alegam que houve constrangimento ilegal, uma vez que o processo não foi suspenso até o pronunciamento final do comitê sobre violação de direitos do ex-presidente.

3) Plenário vai analisar o precedente Bendine

Recentemente, o relator da Lava Jato enviou para discussão no plenário do STF o recurso do ex-gerente de Empreendimentos da Petrobras Márcio de Almeida Ferreira, feito com base na decisão sobre Bendine. Apesar de Fachin ter feito esse movimento para tentar impedir a anulação da condenação, o posicionamento do colegiado pode ser na direção oposta.

Parte dos ministros tem se sentido incomodada com as revelações trazidas em reportagens do site The Intercept Brasil, junto com outros parceiros na grande imprensa. As reportagens mostram conversas no Telegram atribuídas a membros da força-tarefa e ao ex-juiz Sergio Moro, com supostas irregularidades na condução das investigações da Lava Jato.

4) Suspeição de Moro para julgar Lula

As divulgações do Intercept também podem influenciar outro julgamento, na Segunda Turma do STF. Os ministros devem retomar em breve a análise de um recurso da defesa de Lula que pede a suspeição do ex-juiz Sergio Moro e a anulação do processo do tríplex no Guarujá. Lula está preso e cumprindo pena com base na condenação em segunda instância nesse caso.

O habeas corpus foi protocolado no ano passado e começou a ser julgado no final do ano, mas foi interrompido por um pedido de vistas do ministro Gilmar Mendes. Neste ano, a defesa do ex-presidente acrescentou aos argumentos da suspeição de Moro parte das conversas divulgadas pelo Intercept.

O caso foi retomado na Segunda Turma do STF na última sessão antes do recesso. Por conta de seu voto extenso, Gilmar Mendes sugeriu que a Turma concedesse uma liminar para libertar Lula até que o mérito do caso terminasse de ser julgado. O placar foi de 3 a 2 contra a concessão do habeas corpus. O ministro Celso de Mello, que votou contra a liminar, esclareceu que seu voto no mérito do processo pode ser diferente, dando indicativos de que pode reverter o placar a favor de Lula quando o caso for retomado.

5) Suspeição de procuradores

A defesa de Lula também entrou com um pedido de habeas corpus que pede que os procuradores da força-tarefa da Lava Jato sejam declarados suspeitos para atuar nos processos envolvendo o ex-presidente, além da anulação da condenação do petista no caso do tríplex no Guarujá.

A defesa lista uma série de fatos que, segundo os advogados, indicam a motivação pessoal e política dos membros do Ministério Público Federal (MPF) na condução dos casos. A defesa usa as mensagens no Telegram atribuídas a membros da força-tarefa para alegar que Lula foi alvo de uma conspiração.

Um dos argumentos para demonstrar que a força-tarefa foi parcial ao investigar Lula é uma postagem do coordenador do grupo, Deltan Dallagnol, no Twitter. Ele disse que oraria e jejuaria para que o STF não concedesse um habeas corpus ao ex-presidente. O procurador ressalta, porém, que o jejum foi por causa da votação sobre prisão após julgamento na segunda instância e que estava se referindo a corruptos de diferentes partidos, e não especificamente ao ex-presidente.

O pedido também é baseado em fatos como a coletiva de imprensa concedida pelo MPF para apresentação da denúncia contra Lula no caso do tríplex no Guarujá, em que os procuradores fizeram uma apresentação em power point para detalhar as suspeitas contra o ex-presidente.

A defesa também reclama de declarações à imprensa concedidas durante as investigações e manifestações dos procuradores nas redes sociais. A tentativa dos procuradores de criar uma fundação com recursos bilionários da Petrobras também foi apontada pela defesa para pedir a suspeição da força-tarefa.

A defesa requer, ainda, que o STF autorize o compartilhamento de provas obtidas na Operação Spoofing, que mira os suspeitos de hackear celulares de autoridades públicas e obter conversas privadas no Telegram, com a defesa. Em decisão liminar, o ministro Edson Fachin negou os pedidos da defesa no dia 29 de agosto.

6) Prisão após condenação em segunda instância

O presidente do STF, Dias Toffoli, também já deu sinais de que pretende pautar novamente o tema da possibilidade de prisão após condenação em segunda instância. O caso é muito caro à Lava Jato, que defende a prisão para cumprimento de pena antes do trânsito em julgado dos processos judiciais – quando não cabe mais recurso.

Os ministros já apresentaram muitas idas e vindas em relação ao tema. No último julgamento envolvendo condenação em segunda instância, uma maioria apertada, de 6 votos a 5, acabou permitindo a prisão nesses casos.

Lula e outros réus da Lava Jato foram presos com base nesse precedente. Se o STF mudar de ideia, todos os réus que cumprem pena antes do trânsito em julgado deverão ser soltos.

Desde a última vez que o tema foi discutido no plenário do STF, alguns ministros que votaram a favor da previsão de prisão em segunda instância já admitiram ter mudado de ideia. Entre eles, está o ministro Gilmar Mendes.

7) Uso de dados do Coaf e Receita Federal

Também está previsto para esse ano a análise em plenário da decisão liminar do ministro Dias Toffoli, que suspendeu investigações com base em dados detalhados de órgãos de controle sem autorização judicial. O ministro atendeu a um pedido do filho do presidente da República, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), para paralisar investigações contra ele com base em informações do Coaf – atual Unidade de Inteligência Financeira (UIF), vinculada ao Banco Central.

Os ministros vão decidir se órgãos como UIF e Receita Federal podem compartilhar informações detalhadas com o Ministério Público sem autorização judicial. O ex-presidente do Coaf, Roberto Leonel, criticou a decisão de Toffoli e acabou exonerado do cargo depois de pressões do presidente Jair Bolsonaro. O ministro Sergio Moro também conversou com Toffoli sobre a decisão e gerou mal estar em sua relação com o Palácio do Planalto.

A Lava Jato argumenta que a decisão inviabiliza investigações sobre corrupção em todo o país. A Receita Federal, por exemplo, é uma das instituições que fazem parte da força-tarefa da Lava Jato. Muitas investigações do caso tiveram o apoio de relatórios do Coaf e da Receita.

Deltan Dallagnol fala das ameaças à Lava Jato e dos vazamentos do Intercept

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