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Lava Jato
Segunda Turma do STF considerou que o ex-juiz da Lava Jato Sergio Moro agiu de modo parcial no processo do tríplex do Guarujá: decisão passa sinais negativos ao Brasil e ao mundo.| Foto: Carl de Souza/AFP

No aniversário de sete anos da operação, a Lava Jato recebeu um “presente de grego”. A declaração de suspeição do ex-juiz federal Sergio Moro no processo do tríplex do Guarujá abre caminho para uma derrocada em todos os processos da Lava Jato julgados pela 13ª Vara de Federal de Curitiba. Enquanto esteve à frente da 13ª Vara, Moro condenou cerca de 140 pessoas no âmbito do petrolão.

Em julgamento nesta terça-feira (23), a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, por três votos a dois, que Sergio Moro não foi imparcial no julgamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no caso tríplex. O pedido de suspeição do ex-juiz havia sido impetrado pela defesa de Lula em novembro de 2018, dias depois de Moro aceitar o convite para assumir o Ministério da Justiça do governo de Jair Bolsonaro.

O caso começou a ser julgado no mês seguinte e logo de largada teve dois votos contra o pedido de suspeição de Moro. Retomado mais de dois anos depois, terminou com uma virada no placar e no posicionamento da ministra Cármen Lúcia, que havia votado contra Lula no início do julgamento e mudou o voto nesta terça-feira (23).

Um fato novo pode ter influenciado os votos de alguns ministros. Mensagens obtidas por hackers com supostas trocas de informações entre Moro e procuradores da força-tarefa da Lava Jato ao longo da operação macularam a credibilidade da operação, embora os procuradores tenham sempre negado a veracidade dos diálogos.

Decisão pode provocar efeito cascata

A expectativa agora é que os condenados por Sergio Moro na Lava Jato entrem com o mesmo pedido de parcialidade no STF. Uma ação com o mesmo teor já havia sido impetrada, por exemplo, pelo ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha.

Segundo a defesa de Cunha, houve um "conluio" entre as partes para condenar réus como o ex-deputado. Preso desde 2016 e condenado por Moro no âmbito da Lava Jato no ano seguinte, Cunha pretende que todos os atos praticados pelo ex-juiz nos seus processos sejam anulados.

O ex-presidente da Câmara foi condenado a 14 anos e seis meses de prisão por corrupção passiva em irregularidades envolvendo a Petrobras, e está preso preventivamente por lavagem de dinheiro e evasão de divisas por recebimento de propinas em contas mantidas na Suíça. Desde março do ano passado, Cunha cumpre prisão domiciliar com uso de tornozeleira eletrônica pelo risco de contaminação pelo novo coronavírus na cadeia.

Recentemente, o ex-coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba Deltan Dallagnol argumentou que a suspeição de Moro seria mais grave que a decisão proferida pelo ministro do STF Edson Fachin que anulou as condenações de Lula. No começo de março, Fachin anulou as condenações do ex-presidente sob a argumentação de que a 13ª Vara de Curitiba não teria condições de julgar as ações do petista já que elas não teriam ligações diretas com o escândalo de corrupção na Petrobras.

“O pano de fundo dessa decisão (de Fachin) era a perspectiva de declaração de suspeição do ex-juiz federal Sergio Moro, que teria consequências mais graves ainda para esses e talvez outros casos (da Lava Jato). Pessoalmente, discordo de ambas as teses, de incompetência e de suspeição, mas a primeira é menos danosa e deveria prejudicar o exame da segunda”, afirmou Dallagnol ao jornal O Estado de São Paulo.

Apesar de anular as condenações que já haviam sido proferidas por Moro, a decisão de Fachin remeteu os processos para a Justiça Federal de Brasília. Nesse caso, as provas colhidas pela Lava Jato poderiam ser aproveitadas em um novo julgamento.

Com a suspeição de Moro, todas as decisões contra Lula, sejam elas decisórias ou não, deverão ser necessariamente anuladas pelo próprio Supremo. Com isso, os casos voltam à estaca zero, sem qualquer chance de aproveitamento das provas obtidas pelo Ministério Público.

“Essas mensagens, com origem criminosa e que foram editadas e distorcidas, são apenas parte do arsenal utilizado, na reação contra a operação. Essas pessoas procuram pelo em ovo nas mensagens, editando-as ou distorcendo-as para gerar notícias, minar a credibilidade e cavar nulidades. Passados dois anos, nunca as mensagens foram usadas para apontar a inocência de ninguém, mas sim para alegar supostos excessos que ninguém jamais demonstrou nos atos e decisões. Tudo sempre foi revisado e confirmado por três instâncias independentes do Judiciário”, argumentou Dallagnol ao Estadão.

Condenados querem acesso a mensagens hackeadas da Lava Jato

Agora, os defensores dos demais condenados buscam saber se há algo nos diálogos que possa favorecer seus clientes e, no limite, gerar anulação de condenações. Principal defensor da suspeição de Moro, o ministro do STF Gilmar Mendes chegou a argumentar durante o julgamento na Segunda Turma que as conversas entre procuradores da Lava Jato se tratava do “maior escândalo judicial da história brasileira".

As defesas do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto e do ex-presidente da Eletronuclear Othon Silva pediram acesso à íntegra das mensagens. Roberto Podval, responsável pela defesa do ex-ministro José Dirceu, já sinalizou que também pretende solicitar os diálogos.

No caso de Vaccari, por exemplo, já foram sete condenações proferidas pela 13ª Vara de Curitiba. No entanto, uma sentença acabou sendo anulada pela segunda instância. Em um dos processos, o ex-tesoureiro do PT foi acusado de ter intermediado pagamento de R$ 2,4 milhões feito a uma gráfica, a pedido do PT, pelas empresas Setec e SOG Óleo e Gás, do empresário Augusto Ribeiro de Mendonça Neto, um dos primeiros delatores da Lava Jato. Ele foi preso em 2015, mas deixou a prisão em setembro de 2019, quando foi beneficiado por um indulto natalino do ex-presidente Michel Temer.

“Ou o brasileiro acorda ou, quando perceber, teremos regressado 30 anos no tempo no combate à corrupção e à lavagem de dinheiro. A quem interessa isso? Há uma reação contra a Lava Jato com uma série de mudanças já feitas ou sendo articuladas que desmontam o modelo de combate à corrupção que permitiu o sucesso da operação. Será uma tragédia que anunciamos desde 2015, quando alertamos para o perigo de acontecer no Brasil o mesmo que ocorreu na Itália, após a Operação Mãos Limpas”, completou Dallagnol.

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