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Recém-saído da prisão, ex-presidente Lula é uma das estrelas do 7º Congresso do PT, que apresenta nova cartilha de teses para 2020.
Recém-saído da prisão, ex-presidente Lula é uma das estrelas do 7º Congresso do PT, que apresenta nova cartilha de teses para 2020.| Foto: Ricardo Stuckert/Twitter

O PT abriu nesta sexta-feira (22) e promove até domingo (24) a sétima edição de seu congresso nacional, em São Paulo, quando apresenta um novo caderno de "teses" produzidas por membros do partido. Intitulado "Lula Livre", o evento tem como finalidade a discussão, pelo partido, de seus planos, o realinhamento de sua militância e também a eleição de seu novo presidente nacional. Concorrem ao posto o professor Valter Pomar, e os deputados federais Margarida Salomão (MG), Paulo Teixeira (SP) e Gleisi Hoffmann (PR), atual presidente e favorita para exercer mais um mandato de quatro anos.

O congresso estava agendado para novembro desde o início do ano, mas ganhou importância após a recente libertação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que permanecera preso por mais de um ano, em Curitiba. Lula participou nesta sexta e é esperado em todos os dias do evento.

Os debates previstos para o congresso devem girar em torno de três grandes eixos: a preparação do PT para as eleições municipais de 2020, o posicionamento da legenda na oposição ao governo de Jair Bolsonaro e o futuro da própria sigla.

As discussões devem ser norteadas por teses produzidas por membros do PT. Tradição nas convenções do partido, as teses são apresentadas com antecedência (em 2019, foram protocoladas em julho) e debatidas durante o congresso, quando é eleita uma "tese guia".

As teses de 2019 dão um indicativo de que o PT pode partir para uma guinada radical à esquerda em sua atuação política nos próximos anos. Os textos falam de temas como a necessidade de combate ao capitalismo e a busca pelo fortalecimento do Foro de São Paulo, mencionam que o Brasil vive um "Estado de exceção" e celebram as manifestações populares de cunho esquerdista registradas no Chile e na Bolívia.

O histórico do partido, porém, sugere que a força das teses pode não necessariamente nortear a atuação dos petistas. Propostas com teor mais radical foram frequentes mesmo quando o PT ocupava a Presidência da República, entre 2003 e 2016. As sugestões de cunho mais esquerdista não impediram que o PT se coligasse com partidos de centro e que os governos do partido adotassem ações criticadas pelos seus próprios militantes, como as políticas de ajuste fiscal empreendidas pelo ex-ministro Joaquim Levy (Fazenda) no início do segundo mandato de Dilma Rousseff.

Teses de 2019 falam de "golpe", imperialismo e criticam próprio partido

São nove as teses apresentadas para a convenção de 2019. À exceção dos deputados federais Paulo Pimenta (RS) e Paulo Teixeira (SP), nenhum dos demais autores dos trabalhos exercem, atualmente, mandatos na esfera federal. São dirigentes internos do partido, além de pré-candidatos para as próximas eleições e dos ex-deputados federais Ricardo Berzoini e Luiz Eduardo Greenhalgh.

Em linhas gerais, os textos abordam três grandes temas. Um é a conjuntura internacional, em que são citadas as vitórias da direita em diferentes países e festejadas as mobilizações nas nações da América do Sul. Outro tema é a política nacional, que concentra críticas ao governo Bolsonaro e ao que chamam de "mídia hegemônica". Por fim, a terceira temática é a organização interna da legenda – e aí não faltam ataques à estrutura partidária e a uma suposta "burocratização" vivida dentro do PT.

Na tese "Lula Livre! Fora Bolsonaro! Governo Democrático e Popular!", de Carlos Árabe, Renato Simões e Vilson Oliveira, é dito que o "PT reafirma seu apoio à luta contra o bloqueio econômico à Cuba, em defesa da soberania e do direito à autodeterminação das nações, e defesa da Revolução Cubana, cujo caráter antimperialista, internacionalista e socialista foi e é fundamental para a luta dos povos latino-americanos. Afirma também seu apoio a Evo Morales e ao povo boliviano que sofre brutal ataque chancelado pela OEA que, uma vez mais, promove o golpismo tal como fez ao longo das décadas de 1960 e 1970."

Já o trabalho "Lula Livre – Partido é para todos e todas" cita que uma das prioridades da legenda deve ser "fortalecer o Foro de São Paulo, estreitar a relação com os partidos progressistas e de esquerda da Europa, dos BRICS (China, Rússia, Índia e África do Sul e com a África)".

A tese "Em tempos de guerra, a esperança é vermelha", escrita por Natália de Sena, Valter Pomar e Patrick Campos Araújo, afirma que o cenário político atual é oposto ao de 2002, quando o PT venceu, com Lula, as eleições presidenciais pela primeira vez. "O caminho para derrotar Bolsonaro e a coalizão golpista ultraliberal não será o mesmo que adotamos para derrotar FHC e os tucanos neoliberais entre 1995 e 2002. Entre outros motivos, porque a coalizão responsável pelo golpe de 2016, pela prisão e interdição de Lula, e pela vitória de Bolsonaro, não quer apenas nos derrotar, quer destruir a esquerda", relata o texto.

Ataques à operação Lava Jato aparecem na tese "Repensar o PT, para enfrentar o retrocesso, defender a democracia e os direitos do povo. Contribuição ao debate no 7º Congresso do PT", de Jacy Afonso, Ricardo Berzoini, Letícia Espíndola. Segundo o texto, a operação contou "com todo o apoio da mídia", que fazia "campanha permanente" contra o partido.

O trabalho de Afonso, Berzoni e Espíndola também traz críticas ao partido, ao dizer que "precisamos impedir que a vida partidária constitua em veículos de carreiras e carreirismo e coibir a formação de uma 'classe política' interna, constituída de assalariados, dependentes materialmente da vida interna do partido".

As contestações mais duras ao próprio PT vêm, porém, da tese assinada por Markus Sokol, Luiz Eduardo Greenhalgh e Misa Boito. O texto fala sobre a reforma da Previdência e diz: "Aliás, é preciso dizer que foi negativa a ação de três governadores – da Bahia, do Ceará e do Piauí – que pediram voto a favor da PEC 06, para deputados de outros partidos da sua base estadual. E é, em particular, inaceitável a atitude do governador Rui Costa que se mantém na pauta da conciliação, e se lança candidato em 2022, às costas do PT e às expensas da prisão de Lula – uma vergonha que o 7º Congresso discutirá".

Conciliação em baixa, socialismo em alta

Outro ponto comum de críticas ao próprio partido é o de uma suposta "política conciliatória" que o PT teria empreendido quando estava na presidência e mesmo nos dias atuais. A defesa do socialismo é apresentada na maior parte dos trabalhos.

A tese de Sokol, Greenhalgh e Boito diz que "não há mais espaço para conciliação" e que o partido deve ter como meta para as próximas eleições o lançamento de candidaturas próprias ou de alianças apenas com partidos de esquerda, sem a ampliação do leque de coligações feito pelo partido principalmente na década passada.

No trabalho "Chapa Lula Livre – Partido é para todos e todas", a conciliação é também atacada sob a ótica de que o PT cometeu "ingenuidades". Uma citada na tese é que o partido "foi republicano com quem nunca foi republicano com o PT", e aí são citados como exemplos a mídia, o Judiciário, as Forças Armadas e mesmo parte da população - que, na visão dos petistas, embora tenha sido beneficiada com políticas sociais desenvolvidas nos governos de Lula e Dilma, não dedicaram fidelidade ao partido.

Na mesma linha, uma abordagem frequente nas teses é de que o PT jamais chegou ao poder no Brasil – para tanto, os trabalhos citam uma distinção entre "governo" e "poder". Com Lula e Dilma, o partido teria alcançado o governo; o poder, entretanto, teria permanecido com setores criticados, como o capital financeiro e a já citada mídia.

Uma abordagem também frequente é a da defesa de uma nova Assembleia Constuinte, para produzir um texto que substituiria a carta de 1988.

Marielle presente

O nome da vereadora Marielle Franco (Psol), morta em 2018 no Rio de Janeiro, é rotineiramente citado nos trabalhos. O crime contra a parlamentar é mencionado como um exemplo da "escalada de intolerância" que, para os petistas, estaria em curso no Brasil. Um trabalho também menciona uma suposta conexão entre o presidente Bolsonaro e o homicídio.

"Um traço marcante do governo é o fato de que quem dirige o mesmo hoje é uma facção política ligada ao crime organizado das milícias. O assassinato de Marielle Franco apenas deu nitidez e visibilidade ao fato que nos gabinetes dos filhos do presidente e dele mesmo há assessores milicianos, parentes de milicianos, pessoal ligado diretamente a diferentes crimes, inclusive ao de Marielle", diz a tese assinada por Romenio Pereira, Marcos Lemos e Saulo Dias.

Em outro trecho do mesmo texto, diz-se que "ganha relevo e prioridade agora a luta pelo desmascaramento do presidente miliciano que usa as instituições para acobertar os mandantes do crime do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes".

Histórico de teses

Em 2016, o congresso do PT se deu poucos meses após a conclusão do impeachment que tirou a ex-presidente Dilma Rousseff do poder. Chamado de "golpe", o processo ocupou grande parte da atenção dos trabalhos apresentados na ocasião. Diversas críticas foram citadas ao próprio PT, que teria apostado em alianças com partidos em nome da governabilidade.

Mas mesmo quando o PT ainda ocupava a presidência, teses que defendiam a radicalização eram recorrentes. Como em 2015, quando a tese “Resgatar o Petismo no PT” propunha temas como a desmilitarização das polícias, a reestatização das empresas privatizadas e "100% do petróleo para a Petrobras 100% estatal".

Dois anos antes, o partido falava em seu congresso de “não ceder às pressões do mercado financeiro” e de posicionar o Estado como "organizador dos pequenos e médios negócios do país". Já em 2007, uma das diretrizes aprovadas no congresso foi a defesa da descriminalização do aborto.

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