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Presidente Jair Bolsonaro acena com a mão.
Presidente Jair Bolsonaro acena com a mão.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Enquanto a tão esperada reforma da Previdência não é votada no Congresso e a economia do país ainda patina, o presidente Jair Bolsonaro busca fazer acenos a seu eleitorado para não perder apoio popular. Diversas medidas pontuais para agradar esse público estão sendo anunciadas: facilitação da posse de armas; fim do horário de verão; promessas para os caminhoneiros; e nesta última semana, o envio ao Congresso do projeto que trata de mudanças na Carteira Nacional de Habilitação (CNH).

A principal alteração do projeto sobre a CNH é a ampliação de 20 para 40 pontos no limite para suspensão do direito de dirigir. A proposta também aumenta a validade da carteira, passando de cinco para dez anos; e suspende a cobrança de multa para adultos que transportarem em seus veículos crianças pequenas sem cadeirinha.

Bolsonaro foi pessoalmente à Câmara entregar o projeto e foi criticado pelo  presidente da comissão especial da reforma da Previdência, Marcelo Ramos (PL-AM). O deputado disse que o presidente não tem “noção de prioridade”. “Enquanto estamos num seminário sobre reforma da Previdência ele está vindo pra Câmara apresentar PL [projeto de lei] que trata de aumentar pontos na carteira de maus motoristas”, escreveu Ramos no Twitter.

Ações pontuais buscam reaver popularidade

Se, por um lado, a ida de Bolsonaro à Câmara parece falta de prioridade em relação à pauta econômica, de outro mostra que o presidente está preocupado em manter o apoio de quem o elegeu.

Isso porque Bolsonaro começa a perder parte do apoio do eleitor que foi às urnas em outubro do ano passado. Em março, uma pesquisa do Datafolha mostrou Bolsonaro com a pior avaliação entre presidentes em primeiro mandato desde a redemocratização – 30% dos brasileiros consideravam o governo ruim ou péssimo, segundo o levantamento.

Uma pesquisa da XP/Ipespe realizada em maio também mostrou que o presidente começou a perder apoio, inclusive, entre os brasileiros de renda mais alta, que foram os primeiros a aderir à candidatura de Bolsonaro. O levantamento mostrou que entre os eleitores com renda acima de cinco salários mínimos, o índice de quem considera o governo ruim ou péssimo passou de 22% para 41% de abril para maio.

“Em seis meses parece que a gestão do Bolsonaro caiu na apreciação da população, mais especificamente na preferência desse eleitor da classe média, que na verdade votou no Bolsonaro como uma alternativa anti PT e contra a corrupção”, analisa o cientista político Doacir Quadros. “Como nesses meses a gestão ficou um tanto quanto paralisada, essas ações dele focando em projetos pontuais vai muito ao encontro de tentar a adesão desse eleitor”, ressalta.

“Parece que a gestão do Bolsonaro caminha muito naquilo que é um discurso ainda em clima de palanque”, analisa Quadros. “De fato, ele procura a partir dessas ações pontuais manter o discurso de palanque que de certa forma favoreceu muito o sucesso eleitoral dele e que de certa maneira mostra uma paralisação do governo no aspecto de gestão política”, completa o cientista político.

Estratégia pode funcionar, mas não para sempre

Para Quadros, a estratégia do presidente em fazer acenos à classe média e a segmentos do eleitorado pode funcionar, mas não para sempre. Ele alerta que o eleitor que escolheu Bolsonaro em 2018, caracterizado pelo sentimento anti-PT e contra a corrupção, é crítico. E, mais cedo ou mais tarde, vai exigir resultados.

“Eu sempre chamo a atenção: qual é o perfil do eleitorado da classe média? Os estudos que desenvolvemos na ciência política mostra que é um eleitorado crítico, que de fato sempre procura estar avaliando a gestão do seu governo frequentemente. Então essas medidas podem ter um efeito, mas temporário, provisório. Esse eleitor característico anti-PT e contra a corrupção, de fato está esperando um processo de crescimento econômico do país.”, diz Quadros.

O próprio Bolsonaro deu pistas sobre sua estratégia ao falar com a imprensa no dia em que entregou o projeto sobre as alterações na CNH. "O projeto tem a ver com a nossa economia. Aos que têm reclamado eu tenho falado: 'Procure um taxista, procure um motorista de ônibus, motorista de caminhão, [procurem] quem vive no trânsito. Muito rapidamente, [esse motorista] perde não é só a carteira [de motorista], perde a sua carteira de trabalho, na verdade”, justificou o presidente.

Um levantamento feito pelo jornal O Globo mostrou que, se o projeto de Bolsonaro que eleva de 20 para 40 o limite de pontos na Carteira Nacional de Habilitação (CNH) for aprovado, permitiria que pelo menos 1,4 milhão de motoristas, considerados atualmente infratores, continuassem dirigindo – só nos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo.

Horário de verão

Em abril, o presidente assinou o decreto que acaba com o horário de verão no país. Antes de terminar com a medida, o presidente se certificou de que ia ter mais apoiadores do que críticos: uma pesquisa de opinião mostrou que a maioria dos brasileiros era a favor do fim do horário de verão.

Uma sondagem realizada pelo Instituto Paraná Pesquisas em abril mostrou que a maioria dos entrevistados (65,7%) concorda com a decisão do governo federal. Os que não concordam são 31,1%.

"Justo anseio da população brasileira [o fim do horário de verão]. Eu concordo que eu sempre reclamei do horário de verão. E tive a oportunidade, agora, atendendo às pesquisas que fizemos, também, que mais de 70% da população era favorável ao fim do horário de verão", afirmou Bolsonaro durante a assinatura da medida, em uma cerimônia no Palácio do Planalto.

Decreto de armas

Outra sinalização clara de busca de apoio de seus eleitores veio com a assinatura de dois decretos sobre porte e posse de armas – o primeiro ainda em janeiro. Já no início da gestão, o presidente editou um decreto flexibilizando a posse de armas. Com base no texto, a comprovação do critério de efetiva necessidade para possuir uma arma de fogo em casa ou em um comércio torna-se automática.

O segundo decreto foi ainda mais além e alterou regras para o porte de armas, além de alterar regras sobre munições. Depois de questionamentos quanto à legalidade da medida, o decreto foi revisto, mas manteve boa parte dos pontos polêmicos. Agora, o Congresso analisa a edição de um decreto legislativo para derrubar as medidas adotadas pelo presidente.

A segurança pública foi uma bandeira da campanha de Bolsonaro em 2018. Apesar de muitos especialistas na área discordarem da premissa de que mais armas em circulação vão garantir mais segurança para a população, o presidente insiste em diminuir restrições quanto a porte e posse. Durante a corrida presidencial, Bolsonaro usava o símbolo de uma arma com as mãos como slogan entre os eleitores.

Aceno aos caminhoneiros

O presidente também tem feito de tudo para não perder apoio dos caminhoneiros. A categoria – que abalou o país ao fazer uma greve em 2018, durante o governo do presidente Michel Temer (MDB) – apoiou a eleição de Bolsonaro.

No projeto sobre alterações na CNH, uma das medidas propostas pelo governo é o fim da exigência de exame toxicológico para motoristas profissionais, como caminhoneiros.

No final de maio, o presidente almoçou com um grupo de 30 caminhoneiros em Anápolis (GO) e incentivou o grupo a dar entrada no pedido de porte de armas de fogo – a categoria foi contemplada no segundo decreto sobre o tema editado pelo presidente. Bolsonaro também aproveitou para prometer acabar com os radares móveis nas rodovias.

“A meu ver também tem como função atingir um perfil específico, e aqui não estamos falando do eleitor, estamos falando de um segmento profissional extremamente importante hoje para a economia do Brasil”, analisa o cientista político Doacir Quadros, sobre os acenos do presidente à categoria. “O peso dessa classe nós visualizamos no governo do Temer, quando houve a paralisação.”

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