Os militares vêm atuando como “bombeiros” no governo de Jair Bolsonaro há tempos. Geralmente cabe aos generais tentar contornar situações de conflitos que ocorrem dentro da administração. Não foi diferente com a relação entre o presidente e o agora ex-ministro Sergio Moro. Mas, a avaliação de muitos militares – integrantes da gestão ou não – é de que a saída de Moro fragiliza ainda mais o presidente, principalmente pelo teor das declarações feitas pelo ex-juiz da Lava Jato, que afirmou que Bolsonaro queria intervir na Polícia Federal.
Ao jornal Estado de S.Paulo, oficiais-generais se disseram “perplexos” com as revelações de Moro e avaliam que será difícil para o governo Bolsonaro se levantar após a demissão do ministro, porque não há mais como recuperar seu capital político. Entre os comentários coletados pela reportagem, havia o de que Bolsonaro virou um “zumbi” no Palácio do Planalto e que “tudo tem limite”.
À Folha de S. Paulo, assessores militares do Bolsonaro tiveram reações de surpresa e chegaram a declarar de que o discurso contundente de Moro marcava “o fim de muitas ilusões, inclusive as nossas”.
Figura mais popular e influente no setor militar, o general da reserva Eduardo Villas Bôas disse que se "identificou" com Moro. Ele rasgou elogios a Moro e evitou comentar sobre a situação política do governo. "Está muito cedo para avaliar as consequências", ressaltou. "Por enquanto, eu só tenho a lamentar do ponto de vista pessoal."
O ex-comandante do Exército lembrou que, na assessoria no Palácio do Planalto no início do governo, pode conhecer o ex-juiz da Lava Jato. "Trata-se de uma pessoa que fez história, com base nos princípios éticos, com quem eu me identificava e tinha a honra de desfrutar da amizade", afirmou Villas Bôas.
Como a quase totalidade da cúpula das Forças Armadas, Villas Bôas nunca escondeu a admiração pelo ex-juiz da Lava Jato. As declarações do general, por sua vez, sempre tiveram forte impacto na área militar. As palavras comedidas costumam indicar rumos no setor. É tanto que, no final de março, o presidente Jair Bolsonaro foi à casa do general, no Setor Militar Urbano, em Brasília, para pedir indiretamente apoio público.
Ex-integrante do governo Bolsonaro, o general Santos Cruz usou o Twitter para se manifestar sobre a demissão de Moro. Embora não tenha feito menção a Bolsonaro, destacou a importância da "PF autônoma e sem interferência política nas investigações".
Relação desgastada com militares
A relação entre Bolsonaro e o meio militar vinha passando por um desgaste. No último domingo (19), o presidente comemorou o dia do Exército em um ato realizado em frente ao quartel-general das Forças Armadas, em Brasília. A maioria dos manifestantes estava lá para mostrar apoio ao governo, mas muitos também pediam intervenção militar, a reedição do AI-5 (a medida mais incisiva da ditadura que governou o Brasil entre 1964 e 1985) e o fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF). A presença de Bolsonaro na atividade motivou críticas variadas.
A conduta gerou ainda questionamentos dentro e fora das Forças Armadas. Nenhum militar fala, abertamente, sobre a possibilidade de uma intervenção — todas as manifestações públicas são em sentido oposto, de rejeição a um "autogolpe". O próprio Bolsonaro descartou a ideia no dia seguinte, quando disse a um apoiador que defende Congresso e STF "abertos e transparentes". A mudança de tom foi, mais uma vez, creditada aos militares, que teriam desaconselhado, em vão, a presença do presidente na manifestação de domingo.
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