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O presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Justiça, Sergio Moro.
Bolsonaro estuda fatiar ministério de Moro em dois. Com isso, ministro ficaria enfraquecido| Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo

Líder da Frente Parlamentar da Segurança Pública na Câmara (conhecida como bancada da bala), o deputado Capitão Augusto (PL-SP) acusa o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de tentar enfraquecer o ministro Sergio Moro ao cogitar desmembrar o Ministério da Justiça para criar o Ministério da Segurança Pública. Para Augusto, a cisão do superministério comandado por Moro parece uma retaliação ao ministro.

Bolsonaro voltou a afirmar nesta quinta-feira (23), que o governo estuda a possibilidade de recriar o Ministério da Segurança Pública, mesmo contra a vontade de Moro, que atualmente é o responsável pela área. O presidente já havia mencionado essa possibilidade na quarta-feira (22), em encontro no Palácio do Planalto com secretários estaduais de Segurança, sem a presença de Moro.

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"É comum [o governo] receber demanda de toda a sociedade. E ontem [dia 22] os secretários estaduais da segurança pública pediram para mim a possibilidade de recriar o Ministério da Segurança. Isso é estudado. É estudado com o Moro... Lógico que o Moro deve ser contra, mas é estudado com os demais ministros", disse Bolsonaro na saída do Palácio da Alvorada na manhã desta quinta-feira (23), antes de embarcar para a Índia.

A reclamação dos secretários estaduais de segurança é que há uma dificuldade de diálogo com Moro. Eles também reclamam da transferência de líderes de organizações criminosas para presídios federais, uma das principais apostas de Moro para combater facções prisionais. Segundo os secretários, as transferências têm trazido dificuldades aos estados. O governo do Distrito Federal, por exemplo, criticou a decisão de Moro de transferir o chefe do PCC, Marcos Camacho, conhecido como Marcola, do estado de São Paulo para o Presídio Federal de Brasília.

Destino de Moro seria a pasta da Justiça

O presidente deixou claro que, caso decida desmembrar a pasta de Moro, o ex-juiz da Lava Jato seguirá no comando da Justiça. Segundo ele, o convite para ele integrar o governo, em 2018, foi feito antes de se pensar na ideia de formar um "superministério" composto por Justiça e Segurança Pública.

"Se for criado, aí o Moro fica na Justiça. É o que era inicialmente. Tanto é que, quando ele foi convidado [para ser ministro], não existia ainda essa modulação de fundir [a Justiça] com o Ministério da Segurança", disse o presidente.

Se ficar apenas com o Ministério da Justiça, Moro será responsável por temas como conflitos indígenas, direito do consumidor, classificação indicativa de filmes e outros assuntos com menos protagonismo.

Separação é tentativa de enfraquecer Moro, diz aliado

Um dos principais aliados de Moro na Câmara, Capitão Augusto diz que não é a hora de enfraquecer o ministro. “Não fomos consultados da fusão do Ministério da Segurança com o Ministério da Justiça, mas neste momento querer enfraquecer o ministro Sergio Moro é algo absurdo. Somos totalmente contrários”, disse Augusto.

“Não é o momento de enfraquecer o ministro Sergio Moro. Já tivemos um monte de derrotas no ano passado: Coaf, abuso de autoridade, prisão em segunda instância, o pacote anticrime que deram uma esvaziada. Começar o ano enfraquecendo o ícone, a referência, a personalidade que mais combate a corrupção e a criminalidade é ir na contramão de tudo que estamos pregando”, completa o líder da bancada da bala.

Ao longo de 2019, Moro sofreu uma série de derrotas – algumas delas impostas pelo próprio presidente. Uma delas foi a retirada do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do guarda-chuva do Ministério da Justiça – o órgão ficou sob responsabilidade do Banco Central. A decisão foi do Congresso, mas o presidente não se esforçou para manter o órgão sob supervisão de Moro e chegou a pedir aos senadores que não tentassem devolver o Coaf à Justiça quando o tema chegou no Senado. Moro também assinou o pedido, apesar de feito um intenso lobby para manter o Coaf sob seu guarda-chuva.

Moro também foi desautorizado por Bolsonaro quando nomeou a cientista política Ilona Szabó, especialista em segurança pública, como suplente para o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Ele precisou voltar atrás e rever a nomeação.

Recentemente, Bolsonaro também não deu ouvidos a Moro ao sancionar o pacote anticrime aprovado pelo Congresso, mantendo a criação do juiz de garantias. Moro era contra a criação desse novo tipo de magistrado.

Estratégia eleitoral

Segundo aliados de Bolsonaro, o maior entrave para a retomada do Ministério da Segurança Pública seria criar um desgaste público com Moro, o ministro mais popular do governo, com melhor avaliação até do que o próprio Bolsonaro. No ano passado, o presidente cogitou a recriação do Ministério da Segurança, mas enfrentou resistências justamente devido às críticas de que a medida poderia esvaziar a pasta de Moro.

Com a separação dos ministérios, Moro perderia sua principal bandeira no governo: a redução dos índices de criminalidade, que seguem uma tendência iniciada ainda no governo Temer.

Outra bandeira de Moro, que ficaria no Ministério da Justiça, é o combate corrupção, que ainda patina no governo Bolsonaro. Um relatório da Transparência Internacional divulgado nesta quinta-feira (23) mostra que o Brasil caiu mais uma posição no ranking mundial de combate à corrupção e está na pior colocação (106º lugar) e com a pior nota (35) desde 2012.

A Transparência Internacional aponta uma série de retrocessos no país no combate à corrupção em 2019 e não poupou o governo Bolsonaro, citando interferências políticas em órgãos de investigação e controle, como Polícia Federal e Receita Federal, além de casos de corrupção envolvendo ministros e pessoas próximas ao círculo do presidente da República.

Sucessão presidencial seria pano de fundo da divisão do ministério

O deputado Capitão Augusto afirmou que não discorda totalmente da interpretação de que a separação dos ministérios é uma tentativa de Bolsonaro de enfraquecer Moro para uma eventual disputa em 2022. “Não dá para saber, mas quem pensar isso tem todo direito de pensar que a intenção do enfraquecimento é político”, diz o líder da bancada da bala. “Não vou criticar quem pense isso.”

Ex-secretário de Segurança Pública de Minas Gerais, o deputado Lafayette Andrada (Republicanos-MG), diz que a possibilidade de dividir as duas pastas que estão sob comando de Moro não faze sentido sob nenhum ponto de vista. “Conceitualmente, do ponto de vista de gestão, não é eficiente dividir o Ministério da Justiça e o de Segurança Pública. Se porventura o objetivo for enfraquecer o ministro Sergio Moro, essa solução também é pouco eficaz porque os crimes de maior repercussão e popularidade também continuarão no Ministério da Justiça. E, terceiro, se esse for o objetivo, acho uma pena porque o ministro Moro está fazendo um bom trabalho”, afirma ele.

Lafayette destaca que, mesmo que o Ministério da Segurança seja retirado da alçada de Moro, a Polícia Federal continuará subordinada a ele, no Ministério da Justiça. E é justamente a PF que comanda grandes investigações de lavagem de dinheiro, corrupção, fraudes e organizações criminosas de relevância nacional.

Mas no governo do ex-presidente Michel Temer (MDB), que criou o Ministério da Segurança Pública, a PF ficou hierarquicamente subordinada a essa nova pasta – e não à Justiça.

Resultados de Moro na segurança

A redução nas taxas de violência em 2019 tem sido comemorada por Moro, que atribui parte da queda à sua gestão no ministério. No ano passado, o ministro criou um projeto-piloto em cinco cidades do país que é sua maior aposta na redução dos índices de homicídios.

O programa Em Frente Brasil já apresentou redução de assassinatos nas cidades onde está sendo testado e está entrando em sua segunda fase em 2020. A ideia é ampliar o programa para mais cidades ainda no primeiro semestre deste ano.

Sobre fala do presidente e a possível divisão do ministérios, Moro repetiu a interlocutores o que havia falado no programa Roda Viva, da TV Cultura, na segunda-feira (20): "Certas coisas não vale a pena discutir publicamente". Ele também afirmou que não foi ao encontro com secretários de segurança porque estava ocupado "com outras reuniões", mas não especificou quais e com quem. Na agenda divulgada no site da pasta não constavam compromissos.

O Ministério da Justiça e Segurança Pública afirmou que o ministro não vai comentar o assunto oficialmente.

Políticos a favor e contra o desmembramento

Bolsonaro destacou que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já indicou ser favorável à recriação do Ministério da Segurança Pública. "O Rodrigo Maia é favorável à criação da Segurança. Acredito que a Comissão de Segurança Pública [da Câmara] também seja favorável. Temos que ver como se comporta esse setor da sociedade para melhor decidir", declarou o presidente.

O presidente da Comissão de Segurança Pública e da bancada da bala, Capitão Augusto, nega que seja favorável à ideia e disse que nem sequer foi consultado pelo presidente. “Somos contrários a isso, se vier esse projeto para cá [para a Câmara] vamos trabalhar contra o Ministério da Segurança Pública porque não é o momento. Parece uma retaliação. Pode não ser, mas parece”, afirma o deputado.

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