A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de derrubar a possibilidade de prisão em segunda instância reacendeu um debate sobre a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte para criação de uma nova Constituição para o Brasil. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), disse na semana passada que conversaria com líderes partidários sobre a possibilidade. Do outro lado, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) defendeu que não é o momento de falar em nova Constituição para o país.
O debate sobre a necessidade de uma nova Carta Magna começou com a prisão em segunda instância. Depois do julgamento no STF que definiu que a prisão para cumprimento de pena só pode acontecer depois do trânsito em julgado da condenação, quando não cabem mais recursos, o Congresso começou a se movimentar para permitir a prisão antecipada.
Na Câmara e no Senado há propostas que tentam estabelecer a condenação em segundo grau como momento para início do cumprimento das penas, mas parte dessas propostas pode esbarrar em cláusulas pétreas da Constituição – aquelas que não podem ser alteradas nem pelo Congresso.
Foi para driblar as cláusulas pétreas da Constituição que, teoricamente, inviabilizam a prisão em segunda instância, que Alcolumbre sugeriu uma nova constituinte. “Estou aqui há 19 anos no Parlamento, há muitos anos, volta e meia, o debate da Constituinte vem à tona no Congresso Nacional. Então, se há novamente esse impasse, se há novamente essas observações e esses conflitos, novamente eu quero trazer o debate da nova Constituinte para esse momento importante da história nacional”, disse.
Movimento para nova constituinte na Câmara
Alcolumbre não é o único parlamentar em levantar a discussão sobre uma nova Constituição. Há cerca de um mês, o líder da bancada da bala na Câmara, deputado Capitão Augusto (PL-SP), postou nas redes sociais uma figura em que a Constituição de 1988 era jogada em uma privada, pedindo uma nova Assembleia Geral Constituinte. A imagem gerou polêmica e acabou retirada do ar, mas o deputado diz que continua defendendo a necessidade de escrever uma nova Constituição para o país.
“A nossa Constituição foi feita pensando em presos políticos, pensando no regime militar, algo que não retornará mais. Hoje, ela já se demonstrou totalmente velha, foram apresentadas mais de 3.500 emendas à Constituição, uma colcha de retalhos. E muita coisa que está lá na Constituição, após 30 anos sequer foi regulamentado. Então tem mais de 100 artigos aguardando regulamentação”, diz Augusto em entrevista à Gazeta do Povo.
O líder da bancada da bala diz contar com o apoio de cerca de 100 deputados para propor uma nova constituinte já nas eleições de 2022. “Talvez no próximo mandato convocar eleição para o novo Congresso já falando que será a constituinte”, afirma.
Constituição mais enxuta, mas sem abrir mão de conquistas democráticas
Capitão Augusto defende uma carta magna mais enxuta. “A Constituição é muito confusa, permite várias interpretações. Tem que colocar no artigo 5.º, considerar mais os presos como facções criminosas, como marginais, não como presos políticos. Eles fizeram o artigo 5.º inteiro pensando em presos políticos. Naquela época nem existia facção criminosa, crimes bárbaros como tem hoje, não tinha 60 mil mortes violentas por ano como nós chegamos. Tem que reformar por completo, mas em especial enxugar a Constituição e deixar ela mais clara”, diz o parlamentar.
O deputado afirma, porém, que a ideia de escrever uma nova Constituição não deve ser utilizada para promover retrocessos democráticos. “[A Constituição de 1988] teve avanços na questão da democracia, que está consolidada. Tudo que for referente a isso tem que ser mantido. [A Constituição atual] fortaleceu instituições importantes para o combate à corrupção, como a Polícia Federal, o Ministério Público, o que tem que ser mantido. Tem vários pontos do artigo 5.º, dos direitos, que têm que ser mantidos”, afirma o parlamentar.
Proposta de nova constituinte encontra resistência
A proposta, porém, encontra resistência dentro do próprio Parlamento. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) já deixou claro que não acha que esse seja o momento ideal para escrever uma nova Constituição.
"O Brasil tem uma Constituição que é jovem ainda. A gente tem dificuldade até de encontrar na própria Constituição uma brecha para esse assunto. Eu acho que não é o melhor caminho. Uma mudança constitucional pode ser instrumento, inclusive, de restrições de liberdade", afirmou Maia.
Brasil já teve sete Constituições
A Constituição de 1988 é a sétima adotada pelo Brasil. Das sete, quatro foram promulgadas por assembleias constituintes, duas foram impostas — uma por D. Pedro I e outra por Getúlio Vargas — e uma aprovada pelo Congresso por exigência do regime militar.
Para o presidente do Conselho Fundador da Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst), Flávio Pansieri, só há duas situações que permitiriam a convocação de uma nova constituinte no país: uma ruptura institucional ou um consenso nacional. Para ele, o Brasil não passa por nenhum dos dois momentos.
“A constituinte pode ser convocada em duas hipóteses. Primeiro, em estado de comoção nacional, uma revolução que imponha a necessidade de um novo modelo onde a sociedade esteja descontente com o modelo atual, o que não está acontecendo. Segundo, em um estado de consenso nacional sobre a necessidade de um novo ordenamento”, diz. “Acho que não há nenhuma das duas hipóteses. Não é possível a convocação de uma nova constituinte hoje, não há espaço político para tanto”, completa.
Pansieri ressalta, ainda, que o ambiente político polarizado pelo qual passa o Brasil não é o momento adequado para se falar em criar uma nova Constituição. “Exatamente neste momento é que não precisamos de uma constituinte. A estabilização social passa pela estabilidade jurídica, portanto não é possível essa alteração, essa convocação nesse momento”, diz.
“Toda vez que for falar de Assembleia Nacional Constituinte alguém vai falar que é preocupante, mas tem que ser feito. O Brasil não consegue avançar, o Brasil está paralisado, engessado pela Constituição. Tem que ser jogada no lixo e fazer outra”, rebate Capitão Augusto. “Cada hora vai ter uma desculpa: crise econômica, polarização direita e esquerda, a esquerda está no poder, a direita está no poder. Tem que fazer, independente dos fatos. A Constituição não cumpre mais o seu papel, não serve para nada”, completa o deputado.
Constituições no Brasil nasceram em momentos de ruptura
Todas as Constituições no Brasil nasceram em momentos de ruptura institucional. Dois anos depois da independência do Brasil, surge a Constituição de 1824, que foi substituída pela Constituição de 1891, que foi criada dois anos depois da Proclamação da República.
A Revolução de 1930 levou à Constituição de 1934, que foi revogada com o golpe do Estado Novo e a imposição da Constituição de 1937. Em 1946, com o fim da ditadura Vargas, veio a Constituição de 1946, que ficou em vigor até que a ditadura militar de 1964 impusesse uma nova Constituição, a de 1967.
O fim da ditadura militar de 1985 gerou uma Assembleia Nacional Constituinte, que deu origem à Constituição de 1988, chamada de Constituição Cidadã, que está em vigor até hoje.
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