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Presidente da Rússia, Vladimir Putin, e Bolsonaro posam para foto no Palácio do Itamaraty, em 2019| Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

O presidente Jair Bolsonaro está com viagem marcada para a Rússia na próxima semana, quando se reunirá com o presidente Vladimir Putin. O objetivo, segundo o Ministério das Relações Exteriores, será estreitar os laços diplomáticos e comerciais entre os dois países. Na agenda do mandatário brasileiro estão previstos um encontro com empresários russos e uma visita à Duma, o parlamento do país, além da reunião com Putin no Kremlin na quarta-feira (16).

A visita ocorre em um momento em que a Rússia enviou cerca de 130 mil soldados para a fronteira com a Ucrânia em uma tentativa de dissuadir a vizinha de ingressar na Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e barrar a expansão da aliança militar ocidental. Os Estados Unidos e seus aliados mantêm a posição de que não negarão a entrada na Otan a nenhum país.

O impasse e os temores de uma invasão da Rússia à Ucrânia, como em 2014 quando da anexação da península da Crimeia, fizeram surgir questionamentos dentro e fora do Brasil sobre se este seria um bom momento para que o presidente Jair Bolsonaro fizesse uma viagem a Moscou. Isso porque o Brasil é um aliado extra-Otan e possui relações históricas com a organização.

Alguma declaração de Bolsonaro que possa ser interpretada como apoio do governo brasileiro aos russos na questão da Ucrânia – embora este não seja o foco do encontro –, poderia causar constrangimentos ou até mesmo azedar a relação com países da União Europeia e dos Estados Unidos, segundo maior parceiro comercial do Brasil. A presença de Bolsonaro na Rússia neste momento de tensão ainda ganha uma relevância maior pelo fato de o Brasil ocupar um dos assentos rotativos do Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU).

O que dizem os EUA

Ao comentar sobre a visita do presidente Bolsonaro a Putin, o porta-voz do Departamento de Estado dos Estados Unidos (equivalente ao Ministério das Relações Exteriores brasileiro), Ned Price, afirmou que o Brasil compartilha valores democráticos com os Estados Unidos e que acredita que “esses valores serão transmitidos [por Bolsonaro a Putin] e reforçarão as preocupações que o presidente Putin ouve não apenas dos Estados Unidos, mas de nossos parceiros em todo o mundo”.

“Não cabe a nós falar sobre os objetivos que o presidente Bolsonaro pode ter em mente. Estou confiante de que haverá discussões antes e depois da viagem com nossos parceiros brasileiros”, afirmou em coletiva de imprensa nesta segunda-feira (7).

À Gazeta do Povo, um funcionário do Departamento de Estado dos EUA salientou que seu país está "profundamente preocupado com o papel desestabilizador que a Rússia está desempenhando e sua ameaça contínua à soberania e integridade territorial da Ucrânia" e que, assim como os Estados Unidos, o Brasil tem a responsabilidade de defender os princípios democráticos e a ordem.

"Esperamos que o Brasil aproveite esta oportunidade para reforçar esta mensagem em suas conversas em Moscou", disse em nota o funcionário do governo americano. "Nos engajamos em um diálogo contínuo e regular com o Brasil em todos os níveis de nosso governo, incluindo nosso apoio inabalável à soberania e integridade territorial da Ucrânia, e nossa disposição de trabalhar com aliados e parceiros para impor consequências rápidas e severas à Rússia, se optar por escalar".

Nas últimas semanas, o Itamaraty tem atuado para evitar um embaraço com os EUA. Em meados de janeiro, o ministro das Relações Exteriores, Carlos França, conversou sobre a situação por videoconferência com o chanceler norte-americano, Antony Blinken, para conseguir apoio junto ao governo brasileiro em sua tentativa de enquadrar o governo Putin.

Sobre a questão da Ucrânia, o Brasil adota uma posição de neutralidade. O embaixador brasileiro nas Nações Unidas disse que o país não apoia nem uma intervenção militar, nem a aplicação de sanções unilaterais.

“O Brasil encoraja todas as partes a observar estritamente a legislação internacional. É imprescindível a aplicação dos princípios consagrados na Carta [da ONU] de forma consistente, de uma maneira não-seletiva. A proibição do uso da força, a resolução pacífica de controvérsias e os princípios de soberania, integridade territorial e proteção dos direitos humanos são pilares de nosso sistema de segurança coletiva”, disse o representante brasileiro Ronaldo Costa Filho, acrescentando que o Brasil é a favor da implementação dos acordos de Minsk, termos de cessar-fogo assinados por Rússia e Ucrânia em 2014 e 2015 que tinham o objetivo de colocar fim à guerra no leste ucraniano. Esses acordos, porém, não foram cumpridos.

Ministros da Defesa e das Relações Exteriores se reunirão com seus similares russos

O ministro da Defesa, Walter Braga Netto, e o chanceler brasileiro, Carlos França, estarão na comitiva que acompanhará o presidente Bolsonaro. Em Moscou, os dois devem participar de uma reunião com seus respectivos contrapartes russos. Uma cooperação técnico-militar pode ser tratada durante as conversas.

A Rússia tenta há anos vender ao Brasil seu sistema de defesa antiaérea, o Pantsir. Contudo, o vice-presidente da República, Hamilton Mourão, disse nesta semana que as negociações para a compra deste armamento não devem avançar, já que o Brasil é um aliado extra-Otan, o que lhe dá acesso privilegiado à compra de equipamentos militares americanos e a treinamentos com países-membros da aliança.

“Não somos compradores de material bélico russo”, afirmou Mourão ao jornal Valor Econômico. “Tem problemas de manutenção. Mas a razão principal é a condição do Brasil de parceiro preferencial extra-Otan. Sinceramente, acho difícil. Não vejo nenhuma simpatia dos meios militares brasileiros a qualquer acordo nesse sentido”.

De olho no agro

A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, também estava escalada para fazer parte da comitiva que vai à Rússia. Contudo, após informar que está com Covid-19, sua presença em Moscou é incerta.

A participação dela nos encontros bilaterais com os russos é considerada importante para o governo brasileiro, que está preocupado com um sistema de cotas imposto pela Rússia no ano passado para a exportação de fertilizantes, produto do qual o Brasil é um dos principais importadores e que, devido à escassez no mercado, está inflacionado. Tereza Cristina esteve em Moscou em novembro do ano passado para garantir o fornecimento do insumo para o Brasil no médio prazo, mas o assunto deve voltar a ser debatido na viagem da semana que vem.

O chanceler Carlos França comentou, em um texto publicado nesta quarta-feira no Estadão, sobre a importância das relações comerciais com a Rússia para o agronegócio brasileiro. “A Rússia é o maior fornecedor brasileiro de adubos e fertilizantes, insumos cruciais de um dos motores da economia brasileira, o agronegócio. Esses produtos têm respondido por quase um quarto das importações brasileiras da Rússia”, salientou. “A Rússia tem desempenhado um papel decisivo na manutenção da força da agricultura brasileira em todas as suas vertentes”, escreveu França.

É mais uma demonstração de que a viagem de Bolsonaro à Rússia tem um caráter voltado a reforçar e ampliar laços comerciais com o país. Em dezembro, Bolsonaro enalteceu a Rússia como um "grande mercado consumidor". "Vamos aprofundar esse relacionamento", disse. "Vamos nos preparar para fazer dessa visita uma oportunidade de alavancarmos a nossa economia".

Além do encontro de alto nível diplomático, os dois governos pretendem estreitar os laços com uma nova sessão da Comissão Brasileiro-Russa de Cooperação (CAN), a ser realizada em abril deste ano em solo brasileiro, para “dar seguimento aos entendimentos alcançados” durante o encontro entre Bolsonaro e Putin, segundo França.

Após Rússia, Bolsonaro visita Orbán, na Hungria

Antes de voltar ao Brasil, na quinta-feira (17), Bolsonaro irá fazer uma parada de um dia em Budapeste, na Hungria, onde se encontrará com o primeiro-ministro do país, Viktor Orbán. A agenda ainda não está definida, mas fontes palacianas informam que ele também deve se reunir com o presidente János Áder e fazer uma visita ao Parlamento.

Assim como Putin, Orbán é um conservador nos costumes e Bolsonaro está buscando se aproximar dessas figuras, principalmente após perder um aliado na Casa Branca, o ex-presidente dos EUA Donald Trump, que perdeu as eleições de 2020 para o democrata Joe Biden.

A estratégia busca agradar o eleitorado conservador após a debandada de ministros da ala mais ideológica do governo, a exemplo do ex-chanceler Ernesto Araújo, e mostrar que o presidente brasileiro não está isolado no cenário internacional. O porém é que, tanto Orban quanto Putin não prezam pelos mesmos valores democráticos que o Brasil para comandar seus países.

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