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Projetos de lei do presidente Jair Bolsonaro atendem anseios das polícias em ano eleitoral| Foto: Arquivo/Gazeta do Povo

O presidente Jair Bolsonaro (PL) fez, na sexta-feira (25), importantes gestos aos policiais e aos demais eleitores ao lançar seu novo "pacote anticrime". A segurança pública terá destaque nos discursos eleitorais de Bolsonaro e havia a preocupação de fazer acenos eleitorais nessa nessa área. O novo pacote anticrime, que tem decretos e projetos de lei, tenta contemplar isso.

O pacote consiste na edição de dois decretos – instrumentos que regulamentam leis, não precisando de aprovação legislativa – e o envio de três projetos de lei ao Congresso Nacional. Um dos destaques é o projeto que amplia o chamado "excludente de ilicitude", dispositivo já existente na lei que abranda eventual punição a policiais por mortes cometidas em serviço.

Outro projeto de lei foi apresentado com o objetivo de aperfeiçoar a legislação penal e fortalecer o combate à criminalidade violenta. Criminosos que praticarem ações apelidadas de "novo cangaço" – assaltos violentos a bancos em cidades pequenas, com pouca estrutura policial – poderão ser enquadrados na Lei de Organizações Criminosas e penalizados com prisão de 6 a 20 anos.

O terceiro projeto de lei visa a garantir o pagamento de indenização às vítimas de crimes, paga pelos criminosos. Para efeito dessa proposta, salários e valores aplicados poderiam ser penhorados, além do uso de 30% do saldo da conta do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) do condenado para pagamento de indenização da vítima. O mesmo projeto também torna obrigatório o ressarcimento ao Sistema Único de Saúde (SUS), pelo criminoso, de eventuais custos de seu ato.

Já entre os decretos, um deles atualiza o Conselho Nacional dos Secretários de Segurança Pública (Consep) com o objetivo de aproximar a gestão de segurança pública estadual do governo federal. A ideia é aumentar a interlocução federativa na área da segurança pública.

O segundo decreto regulamenta a lei que trata dos crimes de lavagem e ocultação de dinheiro, bens, direitos e valores. A medida regula a destinação de bens perdidos por autores de crimes de lavagem de dinheiro de modo que esse dinheiro oriundo do crime seja investido em ações de combate ao crime pela Polícia Federal (PF) e Polícia Rodoviária Federal (PRF).

Veja mais abaixo, em detalhes, o que diz cada uma das medidas anunciadas por Bolsonaro.

Por que o governo federal apresentou esse novo pacote anticrime

A apresentação do novo pacote anticrime traz propostas de combate à criminalidade que historicamente foram defendidas por Bolsonaro, mesmo antes de ser presidente. Contudo, o conjunto de decretos e projetos de lei de segurança pública também tem o objetivo de impulsionar a candidatura presidencial à reeleição, da mesma forma como o governo apresentou recentemente um pacote de estímulo à economia.

A salvaguarda jurídica a policiais que matarem em serviço, por exemplo, é um aceno que Bolsonaro faz aos agentes de segurança pública, sobretudo tendo o ex-juiz Sergio Moro (Podemos) como adversário na corrida presidencial.

Embora Bolsonaro conte com um apoio expressivo entre policiais, o governo avalia que Moro possa tirar votos do presidente da República, principalmente entre os policiais federais. A intenção de Bolsonaro, portanto, seria reforçar a agenda da segurança pública a fim de enfraquecer o ex-juiz nessa agenda.

A ampliação da excludente de ilicitude chegou a ser debatida no Congresso no primeiro "pacote anticrime" do governo, elaborado por Moro quando era o ministro da Justiça e Segurança Pública e posteriormente aprovado pelo Congresso. Entretanto, o Parlamento desidratou a proposta e retirou os trechos sobre a excludente de ilicitude.

A retomada desse debate às vésperas das eleições é uma tentativa de Bolsonaro de cumprir uma promessa eleitoral feita em 2018 – além de atender aos policiais. Desde que o primeiro pacote anticrime foi aprovado sem a excludente de ilicitude, o presidente prometeu a policiais que retomaria a discussão.

Os policiais contemplam uma das categorias que mais apoiou Bolsonaro em 2018 e que ainda pode ter um peso considerável nas eleições deste ano. Não à toa, o presidente disse aos agentes das forças de segurança que prepara um decreto para criar o programa sobre direitos humanos dos policiais e que encaminharia ao Congresso um novo projeto sobre a excludente de ilicitude.

O que prevê a ampliação do excludente de ilicitude

O projeto de lei que reforça a salvaguarda jurídica a policiais que venham a matar em serviço busca ampliar as possibilidades legais de legítima defesa para profissionais da segurança pública. O objetivo do texto, segundo o governo, é "aperfeiçoar a legislação penal para conceder maior amparo jurídico aos integrantes dos órgãos de segurança".

O governo assegura que o texto não dá "margem para excessos", uma vez que os policiais responderão por qualquer "extrapolação da lei", seja ela intencional ou não. "Pela proposta apresentada, em situação de flagrante, a autoridade policial deixa de efetuar a prisão se entender que o profissional de segurança pública praticou o fato amparado por qualquer excludente de ilicitude ou culpabilidade", informa o Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Segundo o governo, a ampliação do excludente de ilicitude tem o objetivo de não "prejudicar o andamento das eventuais investigações". O investigado fica, assim, obrigado a comparecer a todos os atos do processo. Hoje, mesmo em casos de o policial responder por uma morte sob alegação de uma ação de legítima defesa, o agente de segurança pública pode ficar preso durante a fase investigativa, explica o governo.

A proposta também confere a prerrogativa de policiais serem detidos em cela separada dos demais presos. A medida é justificada pelo governo com a intenção de resguardar a "integridade física dos agentes de segurança pública" que, pela profissão exercida, "ficam completamente expostos" quando são presos juntamente com pessoas que foram encarceradas pela polícia.

O texto considera ainda que o uso de arma de fogo ou de outro instrumento capaz de ferir ou matar serão considerados como injusta agressão ao policial. Na legislação atual, a legítima defesa deve acontecer na mesma medida da agressão ou da ameaça iminente.

O projeto também considera como "exercício regular de direito" da atividade de segurança pública a "defesa da inviolabilidade do domicílio". Ou seja, propõe garantir "segurança" à atuação policial na hipótese de violação de um domicílio, "de forma a proteger de maneira mais eficaz os interesses mais caros à sociedade, como a defesa do seu patrimônio e da propriedade".

Como o pacote anticrime pretende combater o "novo cangaço"

O "novo cangaço" é como se chamam crimes praticado por quadrilhas que cercam cidades para promover grandes assaltos, especialmente a bancos. O objetivo do governo em ampliar as punições a esse delito visa, portanto, aperfeiçoar a legislação penal e fortalecer o combate à criminalidade violenta.

Hoje, a pena para quadrilhas que cometem crimes desse tipo é de reclusão de 3 a 8 anos, uma vez que a legislação não especifica o tipo de ação executada pelo "novo cangaço". O projeto do governo propõe prisão de 6 a 20 anos. Para isso, a Lei n.º 12.850/13, a Lei de Organizações Criminosas, passa a prever como qualificadora o "controle total ou parcial de uma localidade para a prática de qualquer delito".

O governo também propôs aumentar em até dois terços a pena para quem integra, promove ou financia uma organização criminosa no caso de a atuação do grupo ocorrer com "emprego de arma de fogo, explosivo ou artefato análogo". Pela legislação atual, a pena aumenta pela metade e cita apenas o uso de arma de fogo para o cometimento de crimes.

O projeto também propõe alterações na Lei n.º 8.072/90, que trata dos crimes hediondos. Roubos circunstanciados pela "destruição ou rompimento de obstáculo mediante uso de explosivos ou artefatos semelhantes" e crimes como os do "novo cangaço" passam a ser considerados como hediondos.

A proposta também propõe mudanças na Lei n.º 7.210/84, a Lei de Execução Penal, de forma a aumentar o percentual de cumprimento de pena necessário para a progressão de regime. Ou seja, eleva o percentual de pena que deve ser cumprido antes do criminoso ter direito à progressão de regime (do fechado, por exemplo, para o semiaberto).

Pela proposta do Ministério da Justiça, o percentual de execução de pena ficaria mantido apenas para o caso de crimes cometidos por réu primário sem uso de violência ou grave ameaça, em 16%.

Nos demais casos, o preso só teria direito a progressão de regime se tiver boa conduta comprovada. E passaria de 20% da pena cumprida para 25% no caso de reincidente em crime cometido sem violência ou grave ameaça; de 25% para 30% se for réu primário e o crime for cometido com violência ou grave ameaça; e de 30% para 40% se for reincidente em crime cometido com violência ou grave ameaça.

Pela proposta que será enviada ao Congresso, a pessoa condenada pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for réu primário, deve cumprir 60% da pena antes de ter direito à progressão de regime. Com a legislação atual, precisa cumprir 40%.

No caso de presos condenados pela prática de crime hediondo, por exercer comando de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo, ou pela prática de constituição de milícia privada, o percentual de cumprimento da pena antes de progredir de regime passaria dos atuais 50% para 65%. O percentual também é ampliado para presos reincidentes na prática de crime hediondo, passando de 60% para 70% da pena. Para reincidentes em crime hediondo que tenham resultado em morte iria de 70% para 80%.

Governo quer indenização para as vítimas de criminosos

Outro projeto de lei do novo pacote anticrime propõe alterações em uma série de legislações para "instituir garantias e aprimorar mecanismos existentes" para assistir vítimas de crimes e assegurar que sejam ressarcidas pelos danos sofridos. São propostas alterações no Código de Processo Penal, na Lei de Execução Penal, no Código de Processo Civil, na Lei do FGTS e na Lei dos Juizados Especiais.

O texto propõe que salários de criminosos condenados e outros valores aplicados por eles poderiam ser penhorados, além do uso de 30% do saldo da conta do FGTS, para pagamento de indenização à vítima. O projeto também prevê que, após o trânsito em julgado, o criminoso tem de ressarcir o Sistema Único de Saúde (SUS) por custos relativos aos serviços de saúde prestados para o total tratamento da vítima.

Criminosos com tornozeleira eletrônica também deverão arcar com as as despesas do monitoramento, inclusive as relacionadas à manutenção do equipamento. O juiz poderá determinar que a reparação do dano se efetive mediante desconto no vencimento ou salário do condenado.

Para isso, o projeto estabelece que os vencimentos e a quantia depositada em poupança até o limite de 40% deixem de ser impenhoráveis.

As mudanças proposta para o conselho dos secretários de segurança

O decreto que modifica o Conselho Nacional dos Secretários de Segurança Pública (Consep) reestrutura o colegiado. O objetivo, segundo o governo, é promover uma maior aproximação da gestão de segurança pública entre os estados e o Distrito Federal com o governo federal. O objetivo é potencializar a interlocução federativa na área da segurança e discutir temas relevantes para a sociedade.

O conselho vai propor medidas destinadas ao aperfeiçoamento do Sistema Único de Segurança Pública (Susp) e vai deliberar sobre assuntos gerais de interesse institucional do setor. O colegiado será composto pelos secretários de segurança pública dos estados e do Distrito Federal, que o integrarão após indicação pelos governadores.

O decreto estabelece que o Consep se reunirá a cada três meses e, em caráter extraordinário, sempre que convocado pelo presidente do colegiado, ou, alternativamente, por decisão de um terço dos membros. As reuniões do conselho precisarão de um quórum de maioria absoluta. Já a aprovação de medidas a serem deliberadas precisará de maioria simples.

O presidente do colegiado será escolhido entre seus membros, para o período de um ano, admitida uma recondução por igual período Além do voto ordinário, o presidente do conselho terá o "voto de minerva" em caso de empate. Ele poderá convidar representantes de outros órgãos e entidades públicas ou privadas, bem como especialistas, para participarem das reuniões. Contudo, especialistas não terão direito a voto.

As reuniões do Consesp ocorrerão, preferencialmente, por meio de videoconferência, "ou outro meio eletrônico disponível". A participação será considerada "prestação de serviço público relevante", ou seja, seus integrantes não serão remunerados.

Como o dinheiro da lavagem pode financiar o combate ao crime organizado

O decreto que regulamenta a destinação de bens perdidos por autores de crimes de lavagem de dinheiro e investe o dinheiro oriundo do crime em ações de combate pela PF e PRF segue uma filosofia já implementada no Ministério da Justiça e Segurança Pública. O governo já usa o dinheiro do tráfico contra o próprio crime organizado.

Pelo decreto, bens, direitos e valores relacionados direta ou indiretamente às práticas dos crimes previstos pela Lei n.º 9.613/98, que trata de crimes de lavagem de dinheiro e ocultação, podem ser destinados à PF e PRF no caso que a Justiça Federal declarar a perda desse patrimônio pelos criminosos.

A distribuição dos valores provenientes, com ressalva dos bens oriundos do crime de tráfico ilícito de drogas, seguirá regras previstas pelo decreto assinado por Bolsonaro: 90% para a PF, a integrar a receita do Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividades-fim da Polícia Federal (Funapol); e 10% para custear as operações da PRF.

Os recursos deverão ser utilizados para executar ações de prevenção e combate à prática dos crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores. Ao término de uma investigação, se for constatado que houve prejuízo à vítima, seja pessoa física ou jurídica, ou a terceiros, a verba poderá ser devolvida levando em conta o valor do bem perdido.

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