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PF polícia Federal
| Foto: Aniele Nascimento / Gazeta do Povo

O pedido de demissão de Sergio Moro, alegando interferência política do presidente Jair Bolsonaro na Polícia Federal (PF), traz à tona uma demanda antiga da corporação: a autonomia para investigar crimes, principalmente aqueles cometidos por figuras públicas, como o próprio chefe do Executivo.

A importância disso foi, inclusive, citada por Moro em seu pronunciamento de saída, ao lembrar que os ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff foram investigados precisamente porque a PF teve liberdade para cumprir as suas funções.

Mas o tema já tramita há 10 anos no Congresso, sem definição. Caso fosse aprovada, uma proposta de emenda constitucional concederia à corporação o "status" institucional de autonomia já outorgado a outros órgãos. Permitiria, além disso, que a PF organizasse sua estrutura administrativa, com possibilidade de mandato ao diretor-geral e autonomia de escolha dos outros cargos, sem passar por crivo político.

Para Bolsonaro, a "estrutura e os profissionais [da PF] já garantem autonomia de investigações" à corporação. Esse, porém, não é o entendimento de representantes e organizações da Polícia Federal no país, que têm denunciado a vulnerabilidade do órgão frente à ingerência política. Em 2019, a decisão de Bolsonaro de substituir o então superintendente da PF no Rio de Janeiro, Ricardo Saadi, gerou desconforto à corporação e críticas ao governo.

PEC que já existe

Em 2009, foi apresentada ao Congresso a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 412, que prevê autonomia funcional e administrativa à Polícia Federal. Sem definição, a PEC foi desarquivada em 2019, a pedido do deputado João Campos (PRB-GO) e atualmente aguarda parecer do relator na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC).

Na época, o autor do documento, o então deputado Alexandre Silveira, afirmou que garantir a autonomia do órgão, nos moldes do Ministério Público e da Defensoria Pública, por exemplo, seria uma maneira de prevenir a submissão da polícia "às intempéries do poder e de capricho dos governantes no combate à criminalidade organizada, à corrupção e à impunidade" no país.

O parlamentar também alegou que o órgão sofre com contingenciamento de recursos financeiros e limitações de empenhos, além de não receber investimento suficiente para atender às demandas das varas federais no interior do país.

Por outro lado, garantiu que a PF continuaria vinculada aos órgãos de controle da União e funcionalmente subordinada ao controle do Ministério da Justiça.

Nesta sexta (24), o presidente da CCJC, Felipe Francischini (PSL-PR), sinalizou que vai pedir "agilidade" aos parlamentares, para que a matéria seja votada até setembro de 2020.

Status outorgado a outras instituições

Historicamente, outros órgãos foram reposicionados na estrutura da União, sendo outorgados de autonomia institucional, a exemplo da Advocacia-Geral da União (AGU), Ministério Público, dos tribunais de contas e universidades federais.

A autonomia defendida pela Polícia Federal, portanto, não seria diferente da já assegurada a esses órgãos, afirma o deputado João Campos, garantindo a constitucionalidade e juridicidade da proposta.

"Assegurar a autonomia funcional, administrativa e orçamentária à Policia Federal significa dar tratamento paritário a essa instituição nos termos do que foi assegurado às instituições ora nominadas, pois ocupa posição de igual importância para a sociedade brasileira", diz o parlamentar.

Credibilidade

À Gazeta do Povo, o presidente da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal (ADPF) afirmou que apenas uma mudança na Constituição garantiria a autonomia à corporação, tendo em vista as ligações políticas que os ministros têm com o governo.

"Nenhum homem consegue garantir autonomia de uma instituição de Estado, porque os ministros têm ligação política com o governo, isso não é mistério. Não será um ministro, ou seja quem for, que irá garantir que a PF não sofra intervenção", defende. "Portanto, a garantia deve estar na legislação, e assim será respeitada por presidentes".

Enquanto a PEC não é aprovada, Paiva sugere uma medida prática a curto prazo: que o governo solicite aos delegados uma lista de nomes indicados ao cargo de diretor-geral da PF. E, em seguida, envie ao Congresso uma proposta legislativa que garanta possibilidade de mandato ao diretor.

"Qualquer um que entrar agora, escolhido dentro desse sistema de nomeação política que o governo adotou, vai entrar em crise de confiança", disse. "O próximo diretor-geral da polícia pode ficar dias no cargo e, na primeira crise, ir embora".

O tema deve ficar parado no Congresso enquanto as bancadas partidárias não entenderem a matéria como prioridade. Para Campos, embora a própria PF e outros setores da sociedade tenham se mobilizado em prol da proposta, não foi suficiente para sensibilizar os parlamentares.

Mas os fatos envolvendo a saída de Moro do governo podem impulsionar o andamento da PEC. "Ainda mais, se o presidente declarar apoio à essa proposta que já está relatada, poderá um diferencial expressivo", disse Campos, se referindo a especulações de que o governo anunciará, em breve, proposta que prevê autonomia à PF.

"A autonomia que a polícia tem hoje é garantida pelo povo, não está institucionalizada. [A corporação] passou a adquirir tanta credibilidade que o povo é o seu maior guardião", afirmou o parlamentar.

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