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Procurador-geral da República, Augusto Aras, aceitou prorrogar a força-tarefa da Lava Jato por mais quatro meses.
Procurador-geral da República, Augusto Aras, aceitou prorrogar a força-tarefa da Lava Jato por mais quatro meses.| Foto: Evaristo Sá/AFP

No despacho em que prorroga até 31 de janeiro de 2021 a força-tarefa da Lava Jato no Paraná, a Procuradoria-Geral da República (PGR) faz uma série de críticas ao modelo de investigação e cobra do Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF) a institucionalização do combate à corrupção no país. O documento, assinado pelo vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, destaca que as forças-tarefas não podem ser prorrogadas indefinidamente e que os procuradores cedidos por outras unidades fazem falta às suas estruturas de origem.

Não foi só a Lava Jato que ganhou uma prorrogação menor da PGR. Outras forças-tarefas, como a Lava Jato de São Paulo e a da Greenfield, por exemplo, também foram estendidas por períodos menores e com menos procuradores. A interpretação dos investigadores é de que, com a autorização para os grupos funcionarem mais curta, a PGR consegue pressionar o Conselho Superior do MPF a criar uma saída institucional, como a implementação da Unidade Nacional de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (Unac), o quanto antes.

A prorrogação da Lava Jato no Paraná ocorre em meio a uma série de ataques à força-tarefa, que ganharam força a partir do final de junho. Havia um temor na equipe de procuradores de que o trabalho não fosse prorrogado e a força-tarefa acabasse dissolvida.

Na semana passada, a subprocuradora Maria Caetana Cintra dos Santos, do Conselho Superior do Ministério Público (CSMPF), havia concedido uma liminar para prorrogar a força-tarefa em Curitiba por mais um ano.

Na decisão desta quarta, Medeiros teceu críticas ao grupo paranaense. O vice-PGR ressaltou que devido ao teto de gastos não há mais de margens de adaptação das unidades do MPF que cedem procuradores para a força-tarefa de Curitiba. Segundo ele, todas as forças-tarefas do país se queixam de falta de estrutura quando se comparam ao grupo do Paraná.

“Por outro lado, qualquer mínimo ensaio realocativo de recursos nessa arena é imediatamente rechaçado como ataque à força-tarefa. Dar ouvidos aos legítimos reclamos de uma Unidade do Ministério Público Federal que discorda da exclusividade com que um de seus quadros foi alocado em força-tarefa é motivo para ‘carta aos concidadãos’ e cobertura em parte da imprensa sobre as práticas de ‘desmonte’”, diz o vice-PGR no documento.

Medeiros também afirmou que a força-tarefa de Curitiba não aceita críticas quanto ao modelo de investigações. Segundo ele, “até pela grandiosidade dos adversários que coleciona, a Força-Tarefa se sente em constante ameaça e, portanto, precisa mostrar resultados e buscar aliados e apoiadores por vias e meios heterodoxos para o Ministério Público, ao tempo que aponta detratores em qualquer crítica que se lhe faça”.

Em julho, o procurador-geral da República, Augusto Aras, também havia criticado os procuradores de Curitiba. Ele afirmou que a Lava Jato é uma “caixa de segredos” e que é preciso uma “correção de rumos” no MPF para que o “lavajatismo não perdure”.

PGR cobra institucionalização das investigações

Ao prorrogar mais uma vez a força-tarefa em Curitiba, o vice-PGR cobrou do CSMPF a institucionalização das investigações. Uma das soluções apontadas por ele é a redistribuição de processos da Lava Jato a outros ofícios, ou seja, outros procuradores lotados em Curitiba.

“O caminho institucional, portanto, passa por se redefinir quantos Ofícios, por exemplo, Guarulhos e Curitiba necessitam. Se a necessidade de Curitiba é permanente e ascendente como afirmam os Procuradores da República no Paraná, o seu enfrentamento institucional é com a criação de Ofícios, titularizados por Procuradores da República com todas as garantias constitucionais”, destaca.

Segundo Medeiros, há atualmente sete ofícios vagos no MPF, que podem ser alocados pelo Conselho Superior no combate à corrupção em Curitiba, “garantindo-se o funcionamento pleno dentro dos estritos moldes institucionais”.

Há no Conselho Superior tentativas de regulamentar o assunto das grandes investigações. Uma delas é a criação da Unac, que centralizaria as investigações mais complexas em andamento no país.

Procuradores do Ministério Público vêem com bons olhos a proposta, mas alertam para alguns cuidados que devem ser tomados na criação do órgão para evitar a concentração de poder nas mãos do procurador-geral da República ou de alguém escolhido por ele para coordenar a unidade.

Há, ainda, uma discussão paralela para se regulamentar as forças-tarefas, além de um anteprojeto tratando da instituição de grupos de apoio, no âmbito das Câmaras de Coordenação e Revisão, com o objetivo de auxiliar membros do MPF.

“Todos eles, como se mostra evidente, embutem a compreensão de que a forma atual das forças-tarefas pode ser aprimorada, dotando-as ainda mais de institucionalidade para que possam bem desempenhar seu papel”, diz o documento assinado por Medeiros.

Críticas ao modelo de força-tarefa

O uso de forças-tarefas para investigações complexas tem sido alvo de críticas da PGR. Em manifestação assinada no final de junho, Medeiros afirmou que o modelo está esgotado, é desagregador e incompatível com a instituição.

Ao renovar a força-tarefa da Lava Jato na quarta-feira (9), o vice-PGR voltou a criticar o modelo. “O fenômeno das ‘Forças-Tarefa’ no Ministério Público Federal consiste em atuações conjuntas de membros da Instituição, especialmente em casos de grande monta e alto impacto, muito reconhecidas por seus fins e resultados, e menos observadas por seus meios”, afirmou.

“Uma força-tarefa formada apenas por membros do Ministério Público é um contrassenso em uma instituição fundada no princípio da unidade”, continuou o vice-PGR.

Vice-PGR diz que Lava Jato não pode ter duração infinita 

O tempo de duração da força-tarefa no Paraná também foi alvo de críticas de Medeiros. A autorização para o grupo trabalhar em conjunto já foi renovada seis vezes desde o início das investigações, em 2014.

“O modelo, portanto, concebido para ser provisório, se desenvolve logicamente no caminho da sua perpetuação. Procuradores não lotados em Curitiba se aclimatam e transferem suas vidas e famílias para a cidade, e o acervo ascendente se mostra recusado pelos Ofícios institucionais do Ministério Público Federal no Paraná”, diz o documento.

Medeiros destaca que a situação cria um clima de desigualdade de tratamento dentro do MPF. “O apoio, que era para ser extraordinário e pontual para um caso se torna permanente, não pode ser deslocado para outras demandas que emergem no Ministério Público e se instala um clima organizacional de desigualdade de tratamento entre preteridos e privilegiados, centro de excelência e unidades em carência”, diz o vice-PGR.

Escolha dos membros da Lava Jato é pouco transparente

Outro ponto destacado pelo vice-PGR ao prorrogar a força-tarefa da Lava Jato foi a escolha dos membros que compõem o grupo em Curitiba. “É certo que a excelência dos resultados dos trabalhos é fruto da excelência dos selecionados. Todavia, os processos seletivos não são públicos ou abertos aos membros da carreira, que republicanamente poderiam disputar essa oportunidade incomum de aprendizagem e crescimento profissional”, destaca Medeiros.

Ele ressalta que a falta de conhecimento sobre os critérios de seleção dos integrantes do grupo reforça a ideia de que critérios de confiança e afinidade são levados em consideração. “Isto que é próprio dos cargos e funções comissionados não é do modelo institucional de um agente de execução do Ministério Público”, diz Medeiros.

O vice-PGR reforça, ainda, que o recente episódio do pedido coletivo de desligamento da força-tarefa Lava Jato de São Paulo “evidencia o quanto o modelo correntemente vigente é dependente de relações interpessoais, o que o fragiliza”.

Na última quarta-feira (2), sete procuradores da Lava Jato em São Paulo informaram desligamento coletivo da força-tarefa em comunicado endereçado ao procurador-geral da República, Augusto Aras.

No texto, os integrantes informam a data em que pretendem deixar o grupo e afirmam que o motivo das saídas se refere, "em síntese, a incompatibilidades insolúveis com a atuação da procuradora natural dos feitos da referida Força-Tarefa, Dra. Viviane de Oliveira Martinez".

Segundo o portal O Antagonista, a crise em São Paulo tem origem em uma determinação da Corregedoria do Conselho do MP para que todas as investigações sejam direcionadas para o gabinete de Martinez.

A procuradora tem se recusado a assinar denúncias e outros pedidos com os colegas da força-tarefa, o que pode gerar pedidos de nulidades das investigações, já que ela é a procuradora natural do caso.

Procuradores fazem falta em suas unidades de origem

Na decisão desta quarta, Medeiros também destacou que os procuradores “emprestados” para a força-tarefa da Lava Jato fazem falta em suas unidades de origem, que ficam desfalcadas. “Unidades consultadas indicam atuações que entendem sacrificadas, mais uma vez, em favor desta força-tarefa”, ressalta o vice-PGR.

No caso da Procuradoria da República em Minas Gerais, por exemplo, há um Grupo de Atuação Especial e Combate ao Crime Organizado (Gaeco) sem nenhum procurador que se dedique com exclusividade a esse tema, enquanto um de seus quadros atua em Curitiba há quatro anos.

O Ministério Público Federal no Mato Grosso do Sul destacou suas responsabilidades com questões indígenas e a rota internacional de drogas e armas que ingressam no Brasil em seu território ao se manifestar sobre o empréstimo de um procurador para o grupo de Curitiba.

Já o MPF em Guarulhos e Campinas, que também têm membros na força-tarefa do Paraná, destacam as responsabilidades que decorrem da complexidade dos maiores aeroportos internacionais de passageiros e carga do país.

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