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Com Jair Bolsonaro, presença de militares no primeiro escalão do governo federal é a maior desde a redemocratização.
Com Jair Bolsonaro, presença de militares no primeiro escalão do governo federal é a maior desde a redemocratização.| Foto: Marcos Corrêa/PR

O presidente Jair Bolsonaro dá posse nesta terça-feira (18) ao general Braga Netto e a Onyx Lorenzoni nos ministérios, respectivamente, da Casa Civil e da Cidadania. As trocas serão a sexta e a sétima no primeiro escalão de Bolsonaro desde o início do seu mandato. E representam uma espécie de indicativo de que o segundo ano da gestão Bolsonaro se desenvolverá com uma nova dinâmica de forças, tanto no Palácio do Planalto quanto na Esplanada dos Ministérios.

O ritmo de modificações que Bolsonaro faz em seu primeiro escalão é inferior, por exemplo, ao adotado por Dilma Rousseff (PT) no início de seu primeiro mandato. Em 2011, a petista dispensou sete ministros em um curto prazo de tempo, processo que foi apelidado de "faxina ética". Ainda assim, as alterações promovidas por Bolsonaro contrariam declarações recentes do próprio presidente, de que uma reforma ministerial não estaria em seus planos.

Braga Netto assume a Casa Civil no lugar de Onyx, que foi deslocado para o Ministério da Cidadania após um processo de fritura. O antigo titular da pasta Osmar Terra (MDB) reassumirá mandato na Câmara dos Deputados. Na semana anterior, a modificação que se concretizou foi a entrada de Rogério Marinho no Ministério do Desenvolvimento Regional, em substituição a Gustavo Canuto – que foi direcionado para a presidência do Dataprev.

Mesmo com pouco tempo passado, 2020 também já registrou modificações como a queda do presidente do INSS, Renato Vieira, substituído por Leonardo Rolim; a ascensão de Bruno Bianco para a Secretaria Especial da Previdência (cargo que era de Rogério Marinho); a demissão do secretário da Cultura Roberto Alvim após a publicação de um vídeo com inspiração nazista; e a quase certa – mas ainda não oficializada – indicação da atriz Regina Duarte para a vaga.

A temporada de especulações e cortes, por outro lado, faz com que outras figuras do primeiro escalão do governo estejam se fortalecendo. Ao "sobreviverem" à derrocada, mostram que podem amplificar seus poderes ao longo deste segundo ano da gestão Bolsonaro. O processo ainda não está concluído – nomes hoje com estabilidade podem ter seus status modificados por conta de circunstâncias ainda não consideradas.

Quem ganhou

Ala militar

Não há dúvida: a minirreforma ministerial ampliou a influência da chamada “ala militar”, que desde o início do governo trava uma queda de braço com a “ala ideológica”, da qual são adeptos os filhos do presidente da República.

O grupo foi turbinado com a chegada de Braga Netto à Casa Civil, a escolha do almirante Flávio Rocha para chefiar a Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), o indicativo de Bolsonaro de estar feliz em ter "o terceiro andar do Palácio do Planalto militarizado" e a baixa reação contrária, ao menos em público, por parte do Congresso Nacional.

Outro detalhe: Braga Netto é um militar da ativa e até semana passada chefiava o Estado-Maior do Exército. Além disso, traz consigo a experiência adquirida como interventor federal na segurança pública do Rio de Janeiro, em 2018. Vai trabalhar junto com outro general da ativa, o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, que se tornou um dos conselheiros mais próximos de Jair Bolsonaro.

Hamilton Mourão

O vice-presidente foi tema de uma brincadeira recente de Bolsonaro – o presidente disse que Mourão era a única figura garantida no governo por ter seu mandato garantido via eleição. Agora, o general começou 2020 em alta: foi "premiado" com a recriação do Conselho da Amazônia. O órgão foi criado em 1995, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, e estava desativado. Retornará sob a coordenação de Mourão e com a presença de 14 ministérios.

Apesar da condição, o general Mourão não desfrutou de um ambiente pacífico em 2019, principalmente no início do ano. Foi tema de críticas do vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), filho do presidente, e do guru do bolsonarismo, Olavo de Carvalho, e de um pedido de impeachment apresentado pelo deputado Marco Feliciano (Podemos-SP), aliado de primeira hora do Palácio do Planalto.

Abraham Weintraub

O ministro da Educação saiu de férias no fim do ano passado sob risco de não retornar ao cargo. Seu estilo virulento nas redes sociais chamava a atenção e incomodava aliados do governo. A isso se somou a série de problemas na aplicação do Enem, o Exame Nacional do Ensino Médio. Weintraub depois se tornou alvo de pesadas críticas do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e de um pedido de impeachment assinado por um grupo de deputados federais e senadores.

A série de controvérsias, porém, não levou à queda do ministro. Ao contrário: parece ter proporcionado uma espécie de fortalecimento. Nesta segunda-feira (17), o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, declarou que "Weintraub é o melhor ministro da Educação". O titular da pasta, dias antes, havia sido beneficiado com uma campanha nas redes sociais veiculada por bolsonaristas, que viralizaram a hashtag #somostodosweintraub. Os deputados Hélio Lopes (PSL-RJ) e Carla Zambelli (PSL-SP) estiveram entre os que saíram em defesa do ministro.

Rogério Marinho

O novo titular do Ministério do Desenvolvimento Regional é outro que sai fortalecido com as modificações recentes. A ascensão como ministro é a coroação de um processo que se iniciou no início do governo Bolsonaro, quando foi nomeado secretário da Previdência. Marinho foi um dos responsáveis pelo principal projeto econômico do país em 2019, a reforma do sistema de aposentadorias e pensões do INSS.

Ele se destacou na condução da reforma, em especial no relacionamento com o Congresso, e assim se cacifou junto a Bolsonaro. Um reerguimento na carreira que parecia improvável em outubro de 2018, quando registrou 20 mil votos a menos do que na eleição anterior e não conseguiu renovar seu mandato de deputado federal pelo Rio Grande do Norte.

Sergio Moro

Quem também está com tudo neste início de ano é o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro. O ministério comandado pelo ex-juiz da Lava Jato foi alvo de uma especulação em janeiro sobre uma possível divisão de suas atribuições – com Justiça de um lado e a Segurança Pública de outro.

O nome do ex-deputado Alberto Fraga (DEM-DF) chegou a ser especulado como comandante do "Ministério da Segurança Pública", que teria a Polícia Federal como subordinada, e chegou a dar entrevistas criticando a suposta falta de experiência de Moro na área. A opinião pública e o ex-juiz não reagiram bem à proposta – Moro teria dito a aliados que pediria demissão se isso acontecesse –, e Bolsonaro arquivou a iniciativa rapidamente.

Quem perdeu

Onyx Lorenzoni

Onyx foi uma das primeiras figuras relevantes da política de Brasília a acreditar na possibilidade de Bolsonaro ganhar a eleição presidencial. Após a vitória nas urnas, coube a Onyx coordenar a transição governamental. Ocupou a Casa Civil sem maiores sobressaltos ao longo de 2019 e, sempre que possível, valorizava sua conexão com Bolsonaro.

Mas uma série de episódios foi gerando desgastes entre ele e o presidente da República. Onyx foi criticado por interferir na negociação entre o Planalto e o Congresso – atribuição que deveria ser exclusiva do ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos – e acabou sendo afetado pela viagem que o então secretário-executivo da Casa Civil fez em um avião da FAB entre a Suíça e a Índia. O episódio levou à demissão de Vicente Santini e também a um esvaziamento das funções da Casa Civil. A destituição de Onyx do cargo acabou se mostrando uma etapa natural.

O agora ex-ministro da Casa Civil se preocupou em minimizar os impactos do episódio. Divulgou um vídeo em que dizia "não importar o número da camisa", desde que continuasse servindo ao governo. Antes de ter a sua indicação ao Ministério da Cidadania confirmada, viu seu nome considerado a voltar à Câmara.

Osmar Terra

O deputado federal do MDB assumiu no começo do governo um superministério da Cidadania, que tinha entre suas atribuições o Bolsa Família, a política antidrogas, as secretarias de Cultura e Esporte, e o projeto Pátria Voluntária, tocado pela primeira-dama Michelle Bolsonaro. Um ano depois foi demitido por “falta de desempenho”, segundo interlocutores do Planalto.

Terra vinha sofrendo um processo de esvaziamento: primeiro o Pátria Voluntária saiu do guarda-chuva da Cidadania para o Palácio do Planalto. Depois, Terra perdeu a pasta da Cultura, que foi para o Ministério do Turismo.

Também causou desgaste o aumento da fila do Bolsa Família, que tinha sido zerada no governo do ex-presidente Michel Temer. Além disso, Terra assinou um contrato do ministério com uma empresa de tecnologia da informação alvo da Polícia Federal por irregularidades no governo Temer – e ele fez isso mesmo alertado da investigação.

Filipe Martins

Outro que perdeu espaço com as modificações recentes foi o assessor especial para assuntos internacionais Filipe Martins. Ele viu a assessoria sob seu comando sair da alçada da Presidência da República para o comando da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), que passou a ser chefiada por outro militar, o almirante Flávio Rocha.

Martins, discípulo do filósofo Olavo de Carvalho e tido como um dos principais membros da "ala ideológica" do governo, viu sua influência ser diminuída.

Quem ainda pode balançar

O momento do governo contempla ainda integrantes do primeiro escalão que por ora estão poupados, mas podem ser incluídos em uma leva de novas modificações.

Um exemplo é o do chefe da Secretaria de Comunicação (Secom), Fábio Wajngarten. Ele passou a encarar um fogo cruzado desde que reportagens da Folha de São Paulo identificaram que ele é sócio de uma empresa que recebe verbas de publicidade do governo federal – destinadas pela própria Secom. Bolsonaro bancou Wajngarten e criticou a imprensa, mas uma possível demissão prossegue no radar.

E outra hipótese é a do desligamento do titular das Minas e Energia, Bento Albuquerque. A saída do ministro, que é almirante, era dada como certa por pessoas do setor no fim do ano passado. A demissão não ocorreu, mas o desligamento pode ocorrer – ainda que de modo mais nobre, com a indicação de Albuquerque para uma vaga no Superior Tribunal Militar.

Já o ministro Paulo Guedes, da Economia, não chegou a ser ameaçado de demissão, mas é possível dizer que seu status perante Bolsonaro deixou de ser inabalável. O presidente não gostou da declaração de Guedes sobre a alta do dólar, a de que a elevação do valor da moeda americana tinha como benefícios impedir que "domésticas" viajassem para a Disney.

Habitualmente enérgico na defesa dos seus auxiliares, Bolsonaro não se mobilizou para rebater as críticas ao ministro: "pergunta para quem falou isso, eu respondo pelos meus atos", disse, quando questionado sobre o tema. Dias antes, Guedes já havia causado controvérsia ao comparar servidores públicos a "parasitas".

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