A revelação de que o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), utilizou estruturas e servidores do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na produção de relatórios previamente combinados para fundamentar as suas decisões em inquéritos no STF deu novo impulso aos pedidos de impeachment do magistrado, aumentando a pressão sobre o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que tem o poder de dar início ao processo.
Para parlamentares da oposição e independentes, a publicação da série de reportagens da Folha de São Paulo iniciada nesta terça-feira (13), a partir do vazamento da troca de mensagens de texto e áudio entre Moraes e seus auxiliares entre agosto de 2022 e maio de 2023, dá provas da prática de abuso de autoridade e perseguição contra cidadãos críticos à atuação de membros dos tribunais superiores, aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e políticos conservadores em geral.
Os arquivos revelam ainda que relatórios contra os jornalistas Rodrigo Constantino e Paulo Figueiredo foram produzidos a pedido de Moraes e usados para embasar medidas como o cancelamento de passaportes e bloqueio de redes sociais. A reportagem indica que essas decisões poderiam ter sido tomadas antes mesmo da coleta dos elementos necessários para a sua justificação, sugerindo antecipação de juízo por parte do ministro. As mensagens também sugerem que houve supostamente adulteração de documentos, prática de pesca probatória, abuso de autoridade e possíveis fraudes de provas.
O ministro Alexandre de Moraes evitou falar com a imprensa nesta terça-feira (13) depois de sair da posse de Cristiano Zanin como integrante substituto no TSE. Nota de seu gabinete esclareceu que, no curso das investigações dos Inquéritos 4781 (Fake News) e 4878 (milícias digitais), nos termos regimentais, “diversas determinações, requisições e solicitações foram feitas a inúmeros órgãos, inclusive ao TSE, que, no exercício do poder de polícia, tem competência para a realização de relatórios sobre atividades ilícitas, como desinformação, discursos de ódio eleitoral, tentativa de golpe de Estado e atentado à Democracia e às Instituições”.
Senador espera pressão popular para impulsionar impeachment
Antes mesmo da publicação da reportagem da Folha de São Paulo, o senador Eduardo Girão (Novo-CE) já havia mobilizado congressistas em favor da apresentação de um novo pedido de impeachment de Moraes com base na "série de atitudes surreais" colecionadas pelo ministro.
Na terça-feira (13), por exemplo, Moraes voltou a cassar as redes sociais do senador Marcos do Val (Podemos-ES). Elon Musk, dono da plataforma X, que protagonizou embates contra Moraes ao denunciar censura determinada pelo ministro, comentou a decisão como abusiva.
Além das revelações recentes, o senador Girão agregou à justificativa do requerimento várias acusações anteriores envolvendo abusos na condução de inquéritos, além de “comprovadas violações de prerrogativas de advogados e de parlamentares” e de “desrespeito aos direitos humanos e garantias fundamentais”, sobretudo dos condenados no 8 de Janeiro.
O pedido de impeachment de Girão será apresentado em entrevista coletiva na Presidência do Senado no começo da tarde desta quarta-feira (14). A ideia da iniciativa é deixar a lista de assinaturas de apoio de deputados e senadores aberta para novas adesões até 7 de setembro e protocolar o documento na Mesa do Senado no dia 9. “Será o maior movimento por um impeachment de ministro do STF da história”, prevê.
Para o senador e outros parlamentares engajados na iniciativa, as resoluções abusivas conduzidas pelo TSE e STF, sem respaldo legal e com livre intercâmbio entre os tribunais, revela um jogo de cartas marcadas na qual auxiliares cumpriam ordens movidas pelo "desejo pessoal de retaliação e que corromperam a mais alta Corte do Judiciário".
O histórico, porém, é favorável a Moraes, já que vários outros pedidos de impeachment contra ministros do STF foram engavetados pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. Para mudar a situação, Girão espera que manifestações de rua ajudem na campanha pelo impeachment.
Senadores da oposição cobram apuração imediata dos fatos, com impeachment e CPI
“A reportagem comprova a impressão de Alexandre de Moraes atuando como acusador, investigador e juiz ao mesmo tempo. Essa Casa (Senado) não pode prevaricar e a sua função é fiscalizar o STF. O mínimo que temos de fazer é apurar tudo o que está acontecendo”, afirmou da tribuna o senador Cleitinho (Republicano-MG).
Ele sugeriu a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), que batizou de “vaza toga”, para aprofundar as revelações. “Não tenho medo de perseguição. Nossa missão é verificar essa injustiça”, disse.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) também cobrou reação do Senado diante da notícia, que chamou de “perseguição exposta”. Para ele, ficou flagrante a desmoralização de um ministro do STF, que “usou da máquina pública para perseguir aquele que considera o seu adversário político”, Jair Bolsonaro.
“O setor de combate à desinformação do TSE, da qual era presidente à época, foi usado como braço investigativo do Supremo. É uma arapongagem que faz a suspeita de uma Abin paralela parecer fichinha. Trata-se de um atentado à democracia, caso tudo se confirme”, discursou.
O senador entende que o uso de um órgão judicial para abastecer inquérito de outro tribunal, relacionados ou não com a eleição, é algo grave e que pode ser a prova da interferência direta, pessoal e criminosa de Moraes nas eleições de 2022 para prejudicar um candidato, provocando desequilíbrio da disputa presidencial. “O plenário do Senado precisa tomar uma atitude", disse.
Com poder para barrar impeachment, Pacheco tende a favorecer Moraes
O senador Rodrigo Pacheco tem sido cobrado a pelo menos colocar algum dos processos contra Moraes em pauta, mas resiste a todos, alegando inconsistência ou ponderação para evitar ainda mais tensões entre os Poderes. Os críticos, contudo, lembram que a postura só tem incentivado o chamado ativismo judicial, reforçado injustiças e ampliado a descrença nas instituições democráticas.
Até mesmo parlamentares da oposição admitem ser nula a chance de Pacheco levar adiante o pedido de impeachment. No passado, havia seus interesses cruzados de integrar o STF e depois com o governo do presidente Luiz Inácio Lua da Silva (PT). Agora, em fim de gestão, deverá preferir não se inclinar para nenhum lado, deixando tudo como está, remetendo as questões para o seu virtual sucessor, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP). A eleição para a presidência no Senado ocorre em fevereiro.
André Marsiglia, advogado especializado de defesa da livre expressão, salientou em que um pedido de impeachment não precisa aguardar a comprovação do material relacionado pela reportagem da Folha de São Paulo.
“O artigo 52 da Constituição Federal autoriza Senado a ter livre convencimento. Haveria, em tese, quebra de decoro e decisão tomada em caso de que o ministro é suspeito, demonstrando interesse no resultado, ao direcionar investigação”, sublinhou.
Na mesma linha, o ex-desembargador e advogado dos condenados no 8 de Janeiro, Sebastião Coelho, afirmou que as provas estão dadas e Moraes perderá o cargo. "É o começo do fim dele", disse.
Para Alessandro Chiarottino, doutor em Direito Constitucional pela USP, o episódio envolvendo o Alexandre de Moraes e revelado em mensagens vazadas tem elementos robustos para se encaminhar um impedimento do ministro.
“Trata-se de um escândalo absoluto esses fatos revelados sobre o Moraes. Se for verdade o que dizem, ele não apenas violou o dever de imparcialidade do juiz, o Código de Ética da Magistratura Nacional, mas também cometeu um crime segundo a Lei de abuso de autoridade (13.869/2019). Há, sim, justificativa para impeachment”, expressou à Gazeta do Povo.
Em entrevista recente, o ex-presidente do STF Nelson Jobim disse que os métodos utilizados pelo ministro Alexandre de Moraes eram muito questionáveis.
A falta de transparência e o uso de vias informais para produção de provas podem pressionar o Senado a reagir contra essas práticas como única instituição incumbida pela Constituição de fazer o controle institucional dos tribunais superiores. Ocorre, contudo, que a decisão de abrir processos contra seus ministros é também exclusiva do presidente do Congresso, o que nunca ocorreu.
Revelações contra Moraes podem afetar as instituições, afirma especialista
O cientista político Leonardo Barreto, diretor da consultoria I3P, aponta duas questões principais no vazamento das mensagens entre assessores e o ministro Alexandre de Moraes. A primeira é se os procedimentos legais foram obedecidos. A segunda é se pode ser caracterizada perseguição judicial contra um dos lados da disputa presidencial, o que traria implicações para as instituições.
Barreto questiona quem pode julgar Alexandre de Moraes no âmbito do STF, cuja tendência ainda é tratar o caso como mera questão burocrática, a menos que emerja grande pressão política ou popular.
Por outro lado, se um movimento pelo impeachment de Moraes crescer, o magistrado poderia ser aconselhado a renunciar, um cenário ainda remoto. Além disso, o especialista menciona a possibilidade de que a situação leve a uma reforma do STF, transformando-o em um tribunal puramente constitucional.
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