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Constituição exige que União invista em saúde no mínimo o mesmo valor do ano anterior corrigido pela inflação.
Constituição exige que União invista em saúde no mínimo o mesmo valor do ano anterior corrigido pela inflação.| Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Pergunte a qualquer brasileiro em que área ele gostaria que o governo federal investisse mais recursos e a saúde será a resposta de grande parte dessas pessoas. Esse é um dos maiores desafios da União: como oferecer bons serviços na área em um país tão grande e desigual em tempos de penúrias das contas públicas?

Se dinheiro faz diferença, a boa notícia é que, para 2020, o orçamento do Ministério da Saúde aumentou. Entre recursos disponíveis ou sujeitos a aprovação do Congresso, a área terá R$ 229,2 bilhões para manejar. Mas quase R$ 95 bilhões desse total estão “bloqueados” – constam em uma nova rubrica orçamentária, que praticamente não permite flexibilidade. Ainda assim, os recursos que estarão disponíveis no próximo ano representam um avanço em relação ao último orçamento.

Isso não acontece só pela boa vontade do governo: há um mecanismo constitucional que obriga a União a aportar, no mínimo, o mesmo valor do ano anterior corrigido pela inflação. Por isso, o orçamento cresce – serão R$ 134,8 bilhões para administração direta do ministério, de acordo com a área técnica da pasta.

Na mensagem presidencial que acompanha a proposta de lei orçamentária anual (PLOA), apresentada pelo governo federal no final de agosto, há a explicação para isso. “O texto constitucional garante o montante de recursos aplicados no setor, determinando que, na vigência do Novo Regime Fiscal, a União aportará pelo menos o valor aplicado em ações e serviços públicos de saúde no ano anterior corrigidos pela variação do IPCA de 12 meses”, lembra o texto. Para o ano que vem, o orçamento será corrigido em 3,37%.

Na apresentação da proposta orçamentária, o secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, destacou que, no caso da saúde, além de cumprir o mínimo constitucional, houve um avanço de R$ 900 milhões no orçamento. Cálculo do Raio X do Orçamento, disponível no site da Câmara dos Deputados, mostra que o valor total do orçamento da Saúde está em R$ 122,9 bilhões, já contando esse excedente e os royalties do petróleo, que somam quase R$ 800 milhões. Esse número equivale a 1,6% do PIB.

Ainda assim, apesar de a pasta ter um valor global maior para administrar, os gastos discricionários da área também encolheram, acompanhando um movimento geral das contas públicas. Para o ano que vem, são “apenas” R$ 18,2 bilhões disponíveis para as despesas que podem ser livremente definidas pelo governo. Neste ano, havia R$ 22,5 bilhões disponíveis.

O curioso caso da verba “bloqueada”

O orçamento mais “gordo” da saúde pode ser explicado por verbas que estão vinculadas a outras fundações e órgãos, mas que ainda assim fazem parte do guarda-chuva do ministério. Porém, a área é a que mais concentra verbas de uma rubrica do orçamento, que considera Recursos para Programações em Despesas de Capital -- todos condicionados.

Especialistas em orçamento ouvidos pela reportagem explicam que embora o código já existisse, esse mecanismo passou a existir nesse orçamento. Os recursos que estão sob esse código orçamentário somam cerca de R$ 125,5 bilhões, valor muito próximo ao que seria o estimado para o próximo ano pela Desvinculação de Receitas da União (DRU), que será modificada pela reforma da Previdência.

A proposta de emenda à constituição (PEC) acaba com a DRU das contribuições sociais, já passou pela Câmara e deve contar com o aval do Senado. Esses recursos estão distribuídos em três ministérios: Economia, Cidadania e Saúde, sendo que essa última tem R$ 94,7 bilhões alocados nesse novo código.

Grosso modo, existem dois tipos de universos no orçamento: despesas e receitas, que são ligadas pelas fontes do orçamento. E ele é bastante engessado, por isso, é preciso “prever” com antecedência certos custos, sob pena de não poder utilizá-los depois. Antes da PEC, os recursos da DRU eram bastante maleáveis: até 30% das contribuições sociais poderiam ser manejadas pelo orçamento. Com a mudança que está em vias de aprovação, isso não poderá mais ser feito.

O curioso é que não há muito o que fazer com esses recursos: eles constam no orçamento, mas são praticamente inacessíveis, tanto que é por isso que todos esses recursos aparecem como verba condicionada. O governo não pode transformar esses recursos em despesa corrente, porque o próprio texto da PLOA impede que isso ocorra. Não há possibilidade de fazer a alteração por decreto, tampouco via projeto de lei do Congresso Nacional (PLN), porque isso implicaria em estourar o teto de gastos – isso também ocorreria caso a dotação fosse mudada para despesa de capital.

Há uma possibilidade de usar os recursos caso fossem modificados para despesa de capital financeiro, mas isso aumentaria a necessidade de inclusão de crédito suplementar, para respeitar a regra de ouro. O palpite dos especialistas consultados pela Gazeta do Povo é que esse mecanismo foi usado justamente para equilibrar receitas e despesas para 2020. Como as despesas correntes aumentaram em relação às receitas, aumentar o crédito corrente dá uma “folga” para obter um valor mais interessante de recursos condicionados à aprovação do Congresso como créditos suplementares.

Raio-X do orçamento

O texto da PLOA está tramitando no Congresso. Na mensagem presidencial que acompanha a proposta, o governo destaca que o ministério estabeleceu áreas prioritárias, destacando atenção básica, assistência hospitalar e ambulatorial, suporte profilático e terapêutico, e vigilância sanitária, epidemiológica e ambiental. Historicamente, esses são os setores que recebem a maior parte das verbas da pasta, inclusive em tempos de contingenciamento, como a Gazeta do Povo já mostrou.

Foco da nova gestão, a atenção básica, com foco na estratégia de Saúde de Família, é prioridade para o ministério no ano que vem. “Em 2020, suas ações contemplarão a manutenção e expansão de equipes multiprofissionais por todo o território nacional com capacidade de prevenção e resolução de problemas e de encaminhamento adequado às redes de Atenção de Média e Alta Complexidade”, diz a mensagem.

Segundo o texto, serão alocados para a área recursos na ordem de R$ 23,7 bilhões – pelo menos R$ 19,4 bilhões estariam repassados para estados e municípios por meio do Piso de Atenção Básica em Saúde. Na PLOA, a subfunção atenção básica tem garantida a verba de R$ 16,6 bilhões – outros R$ 6,96 bilhões aparecem como crédito suplementar. Nominalmente, o valor é inferior ao da Lei Orçamentária de 2019, que previa R$ 26 bilhões para a mesma rubrica.

Em outro eixo destacado na mensagem, os serviços de assistência hospitalar e ambulatorial, que envolvem recursos de assistências de todas as especialidades de média e alta complexidade, terá orçamento de R$ 53,6 bilhões. Mais uma vez, na PLOA, o valor para a subfunção de assistência hospitalar e ambulatorial para 2020 é inferior ao que estava na lei de 2019: são R$ 38,5 bilhões que já estão garantidos para o próximo ano mais a verba adicional de R$ 15 bilhões, contra R$ 57,4 previstos para serem usados até dezembro.

Ações como o programa Farmácia Popular entram nas despesas de suporte profilático e terapêutico, que terá orçamento total de R$ 14,6 bilhões. Desse valor, R$ 2,5 bilhões vai para o Farmácia Popular. As vigilâncias sanitária, epidemiológica e ambiental terão recursos de R$ 8,3 bilhões no ano que vem. O ministério vai gastar mais da metade do dinheiro – R$ 4,9 bilhões – em adquirindo e distribuindo imunobiológicos e insumos usados para prevenção e controle de doenças.

Investimento e alívio

Apesar do aperto nas contas públicas, o Ministério da Saúde já anunciou que fará investimento de R$ 2,2 bilhões, especialmente para unidades de atenção especializada e rede de urgências e emergências. Neste ano, a pasta já foi a que menos sofreu com o contingenciamento de gastos do governo – a limitação de empenhos da pasta em 2019 ficou na casa de R$ 600 milhões, o que representa 3% do seu gasto discricionário.

Para 2020, os gastos discricionários da pasta devem ficar em R$ 18,2 bilhões. No ano passado, o valor empenhado nessa rubrica foi de R$ 22,5 bilhões e, em 2019, o limite é de R$ 19 bilhões. Mesmo com a diminuição desse montante, o orçamento de saúde conta com uma ajuda extra: as emendas parlamentares. Parte dessa verba obrigatoriamente é destinada para o setor.

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