A área técnica do Tribunal de Contas da União (TCU) recomenda aos membros da Corte a abertura de um processo para averiguar a conduta do ministro da Defesa, general Walter Braga Netto, no combate à Covid-19 no período em que comandou a Casa Civil e coordenou o Comitê de Crise do governo. O documento interno, ao qual o Estadão teve acesso, aponta “graves omissões” do general. Entre elas, “não ter contribuído da forma que seria esperada para a preservação de vidas”.
No TCU, o processo tem a relatoria do ministro Vital do Rêgo. Ele ainda analisa se vai acolher a sugestão e, para isso, tem mantido conversas com os demais integrantes da Corte. A eventual abertura do processo de representação pode ampliar o cerco sobre os erros do governo na gestão da pandemia, que já deverão ser esmiuçados pela CPI da Covid, no Senado, prestes a iniciar os trabalhos.
Além disso, uma eventual abertura de processo aprofundaria o desgaste do presidente Jair Bolsonaro por investigar a atuação de mais um militar de seu núcleo duro diretamente envolvido no enfrentamento à principal crise do Brasil. Na Casa Civil, Braga Netto foi designado por Bolsonaro para coordenar o Comitê de Crise da pandemia. Entre as atribuições, estavam articular e monitorar ações governamentais, bem como assessorar o presidente na pandemia. É exatamente no desempenho dessas atribuições que os auditores identificaram falhas.
O TCU também mira outro militar, o atual coordenador do comitê, Heitor Abreu, subchefe de Articulação e Monitoramento da Casa Civil. Na avaliação dos técnicos, o tenente-coronel também não contribuiu “da forma que seria esperada para a preservação de vidas”.
A iniciativa do tribunal é uma consequência de auditorias e recomendações que apontaram a inexistência de diagnósticos e diretrizes para o combate à doença. A área técnica entende que o Comitê de Crise omitiu-se diante de temas cruciais, como no monitoramento do consumo de oxigênio, emissão de diagnóstico sobre a segunda onda de contaminação e em projeções sobre a disponibilidade de leitos para pacientes de Covid.
Uma auditoria realizada pela Secretaria-Geral de Controle Externo do TCU, entre 25 de janeiro e 19 de fevereiro, apontou falhas no trabalho do comitê e transferência de responsabilidades ao Ministério da Saúde. “Constatou-se que inexistem diagnósticos elaborados que contenham as informações supracitadas (sobre diagnósticos conjuntos), bem como inexistem novas diretrizes voltadas especificamente para o enfrentamento à segunda onda de covid-19”, diz trecho do documento, de 15 páginas.
Ministério diz que não houve omissão do Comitê de Crise
Aos auditores, o comitê informou que o desenvolvimento de um modelo preditivo sobre o consumo de oxigênio medicinal ainda encontra-se em fase inicial, “havendo necessidade de aperfeiçoamento para que seja mais objetivo e acurado”.
A falta de oxigênio para pacientes com Covid instalou um caos Manaus (AM), em janeiro, e levou ao colapso o sistema de saúde da capital amazonense. Pacientes internados por causa do novo coronavírus morreram por falta de ar para respirar.
O comando do comitê também confirmou não possuir diagnósticos elaborados em conjunto com estados e Distrito Federal para lidar com a “segunda onda” de infecções. Disse apenas que há “monitoramento constante da situação dos Estados e municípios”.
Os técnicos da secretaria de controle sugerem o encaminhamento das conclusões da auditoria para a Procuradoria-Geral da República e ao Congresso Nacional. Para o âmbito do Legislativo, indicam que o documento pode subsidiar debate de medida legislativa sobre o “planejamento governamental para crises sanitárias de grandes proporções”.
Em resposta ao Estadão, o Ministério da Defesa alegou que não houve omissão do Comitê de Crise. Segundo a pasta, “inúmeras atividades e ações” foram coordenadas pelo comitê, como a abertura de crédito de R$ 20 bilhões para vacinação contra Covid e a disponibilização aos Estados de mais de R$ 115 bilhões para ações de saúde pública.
“Todas as ações executadas seguiram a diretriz geral de ‘salvar vidas, preservar empregos e empresas e priorizar aos mais vulneráveis’. Nesse sentido, o Brasil é um dos países com o maior número de recuperados, quase 12 milhões de pessoas”, disse a Defesa.
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