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O ministro Dias Toffoli vai deixar a presidência do STF na próxima quinta-feiram, dia 10: ele deixa um legado de polêmicas e produtividade judicial.
O ministro Dias Toffoli vai deixar a presidência do STF na próxima quinta-feiram, dia 10: ele deixa um legado de polêmicas e produtividade judicial.| Foto: Carolina Antunes/PR

Ao se despedir da presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) no próximo dia 10, o ministro Dias Toffoli deixará como legado um histórico de polêmicas, como o inquérito das fake news e processos licitatórios pouco populares, como o relacionado à aquisição de lagostas. Do outro lado, deixará uma Corte mais unida internamente e o menor acervo processual dos últimos 20 anos.

Toffoli foi o ministro mais jovem a chegar ao STF e o mais novo a assumir posto de presidente da Corte. Quando se sentou na cadeira da presidência do Supremo, em setembro de 2018, Toffoli defendeu a harmonia e o respeito mútuo entre os poderes da República. “Não somos mais nem menos que os outros poderes”, disse em seu discurso de posse.

A prática, porém, foi um tanto quanto distinta da apregoada pelo próprio Toffoli naquela tarde de 13 de setembro. E um dos principais motivos foi o chamado inquérito das fake news, criticado, inclusive, por integrantes do próprio Supremo.

Em março de 2019, por meio de uma portaria e com base no artigo 43 do regimento interno do STF, Toffoli abriu um inquérito para investigar ameaças e ofensas à honra de membros da corte e de seus familiares. Desde então, o procedimento investigatório é conduzido pelo ministro Alexandre de Moraes.

Em junho desse ano, o STF ratificou a legalidade do procedimento. Internamente, os próprios ministros reconhecem que foi adotado um expediente pouco ortodoxo para proteger a Corte e os ministros de ataques externos – principalmente por meio das redes sociais. Apesar disso, os integrantes da Corte são a favor do procedimento para, na visão deles, “resguardar a instituição”.

As polêmicas de Toffoli: fake news e lagostas

Desde quando foi instituída, a apuração das fake news foi contestada por juristas e políticos por ter sido instituída de ofício, sem a provocação da Procuradoria-Geral da República (PGR); por não ter fato determinado, nem prazo de conclusão. O próprio procurador-geral da República, Augusto Aras, já apresentou duas manifestações distintas sobre a investigação. Em outubro do ano passado, defendeu a “atuação legítima do Supremo”; em maio desse ano, afirmou que o inquérito exorbitou limites.

Em aproximadamente um ano e meio de tramitação, o inquérito das fake news foi responsável por censurar uma reportagem; por permitir a devassa de informações bancárias de críticos ao Supremo; por realizar buscas e apreensões contra militantes bolsonaristas e deputados que manifestaram apoio ao governo e até pela prisão de apoiadores.

A amplitude da investigação foi tanta que nos corredores do STF, o inquérito foi apelidado de "investigação Bombril" – com 1.001 utilidades. “Eu fui investigado simplesmente por ter dito que Bolsonaro tem razão. É inacreditável”, critica um dos vice-líderes do governo, deputado José Medeiros (Podemos-MT).

Em entrevista coletiva concedida na última sexta-feira (4), Toffoli disse que abrir o inquérito foi “a decisão mais difícil” de sua gestão e que a história vai mostrar o papel desta investigação na defesa da democracia brasileira.

“Foi a decisão mais difícil da minha gestão a abertura desse inquérito. Mas ali já vínhamos vivendo algo que vinha ocorrendo em outros países, o início de uma política de ódio plantada por setores que queriam, e querem, destruir instituições, que querem o caos”, afirmou.

"Isso [política de ódio] está sendo combatido e vai ser combatido porque nós não podemos deixar o ódio entrar em nossa sociedade, não podemos deixar o caos entrar em nossa nação”, disse o presidente do STF.

Esta, porém, não foi a única polêmica relacionada à condução de Toffoli à frente da Corte. Se a sua antecessora, a ministra Cármen Lúcia, tinha como bandeira a contenção de gastos públicos – tanto que durante sua posse, ela não deu festas, ofereceu apenas café e água aos convidados –, Toffoli foi obrigado a dar várias explicações sobre os dispêndios do Supremo.

O mais famoso ocorreu em abril do ano passado, quando o STF resolveu abrir um processo licitatório para a aquisição de refeições institucionais, que incluíam, no cardápio, lagostas, pratos à base de camarões, bacalhau, galinha d’Angola, champagnes, vinhos especiais e uísques 18 anos.

Houve outras tentativas de se fazer compras consideradas nababescas como a aquisição de lanches para o estafe do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em voos da Força Aérea Brasileira (FAB) e a restruturação técnica da TV Justiça. Mas essas aquisições, ao contrário da relacionada às lagostas, foram canceladas.

Aproximação de Toffoli com o presidente irritou outros ministros

Nestes dois anos, Toffoli buscou uma aproximação com o presidente da República, Jair Bolsonaro, em nome da estabilidade institucional. Porém, a forma como Toffoli conduziu crises entre o Supremo e o Palácio do Planalto foi criticada internamente pelos outros ministros.

Um episódio foi simbólico. Em 7 de maio, Bolsonaro visitou Toffoli na sede do STF, acompanhado de empresários e do ministro da Economia, Paulo Guedes, com o intuito de pressionar o Supremo a apoiar medidas de abertura da economia durante a pandemia do coronavírus.

O encontro não estava na agenda e o presidente da República seguiu a pé em direção ao Supremo. Ministros da Suprema Corte criticaram Toffoli por ter recebido o presidente naquela circunstância. Na visão dos integrantes do STF, Bolsonaro quebrou a liturgia e o gesto foi visto como uma tentativa de emparedar a Corte.

Além disso, fontes ligadas aos ministros admitiram à Gazeta do Povo que o fato de Toffoli não ter dado uma resposta ao presidente da República quando Bolsonaro tentou utilizar-se de decisões do Supremo em favor dos estados para tentar isentar a responsabilidade do governo federal em ações de contenção da Covid-19 gerou mal-estar entre os integrantes da Corte.

Esse tipo de resposta coube, por exemplo, ao ministro Luiz Fux, que será o próximo presidente do STF. “O que serve para a União, não serve para municípios. A União federal continua com a sua responsabilidade”, disse Fux em junho deste ano.

Na entrevista da última sexta-feira, Toffoli fez elogios a Bolsonaro e disse que nunca "viu da parte do presidente nenhuma atitude contra a democracia". "Meu diálogo com ele sempre foi direto, sempre foi franco, sempre foi respeitoso", afirmou.

"Tive um diálogo com ele intenso no sentido de manter a independência entre os poderes e fazer ele compreender que cabe ao Supremo declarar inconstitucionais determinadas normas, porque essa é nossa função e a dele é respeitar — e ele respeitou ao fim e ao cabo", completou Toffoli.

Ministro deixa o STF com o menor acervo processual

Apesar das polêmicas, Toffoli deixará a presidência da Corte com o menor acervo processual dos últimos 20 anos. Hoje, o Supremo tem pendentes de julgamento um total de 28,6 mil processos – uma queda de 8,5% em comparação com o acervo processual de 31 de dezembro do ano passado. Em 31 de dezembro de 2018, o STF contabilizava 37,2 mil processos em tramitação.

Apesar disso, o STF ainda tem vários desafios como a redução da taxa de congestionamento processual (índice que mede a efetividade do tribunal) e a diminuição do tempo de tramitação de cada ação que chega ao Supremo. Hoje, o STF tem taxa de congestionamento de 40%, pouco maior que a meta de 39%. Porém, a média de análise de um processo hoje no Supremo é de 366,2 dias; a meta é que as ações fiquem no Supremo em um período inferior a 519 dias.

Esse desempenho é resultado da combinação de alguns fatores, como a modernização administrativa, a adoção da chamada repercussão geral para processos com um mesmo objeto e o aumento de processos que foram julgados por meio do Plenário Virtual do Supremo.

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