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Presidente dos EUA, Donald Trump
Presidente dos EUA, Donald Trump| Foto: SAUL LOEB / AFP

O presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou na manhã desta segunda-feira (2) que o país irá aumentar as tarifas para importação de aço e alumínio vindos do Brasil e da Argentina. Trump anunciou a medida em um post no Twitter, acusando os dois países de provocar a desvalorização de suas moedas de forma deliberada.

A justificativa do presidente norte-americano é de que a valorização do dólar, nesses casos, prejudica os produtores dos EUA – tanto de produtos manufaturados quanto de commodities. "O Federal Reserve deve atuar para que países como esses não tirem vantagem do dólar forte, por meio da desvalorização de suas próprias moedas", disse o presidente em uma das publicações.

Veja a íntegra do post:

Em nota conjunta dos ministérios das Relações Exteriores, Economia e Agricultura, o governo informou que já está tratando com interlocutores em Washington sobre o assunto. "O governo trabalhará para defender o interesse comercial brasileiro e assegurar a fluidez do comércio com os EUA, com vistas a ampliar o intercâmbio comercial e aprofundar o relacionamento bilateral, em benefício de ambos os países", diz a nota.

Medida é narrativa para o público interno, avalia especialista

O aumento na tarifa de importação do aço e do alumínio brasileiros e argentinos é, na verdade, a restauração de uma alteração implementada pelo governo norte-americano em março de 2018. Naquele mês, os EUA sobretaxaram as importações de aço em 25% e de alumínio em 10%, em um dos capítulos da guerra comercial com a China.

Em agosto de 2018, porém, o governo norte-americano revogou a medida para alguns países, incluindo Brasil e Argentina. Agora, de acordo com o anúncio de Trump, o governo norte-americano irá voltar a sobretaxar as matérias-primas dos dois países, mas ainda não há definição quanto aos valores das tarifas.

"Isso faz parte de uma retórica do presidente norte-americano de preservar indústrias tradicionais e mais antigas do país, que não são de alta tecnologia. Em tese, elas sofreram mais com a concorrência estrangeira. É uma narrativa para o público interno porque, na prática, nem Brasil nem Argentina desvalorizaram suas moedas de propósito", explica Wagner Parente, CEO da consultoria BMJ.

José Augusto de Castro, presidente-executivo da Associação do Comércio Exterior do Brasil (AEB), concorda que o objetivo da política é atender a um público específico nos EUA, que constitui o eleitorado de Trump. "Essa medida prejudica até mesmo os próprios empresários norte-americanos, porque são eles que vão pagar a sobretaxa. O custo da produção vai ficar maior. A motivação é política", avalia Castro.

Aço e alumínio podem ter sido "bode expiatório"

No caso argentino, a retaliação anunciada por Trump parece ter motivos mais definidos – já que as eleições de outubro tiveram como vencedor Alberto Fernández, peronista que está do lado oposto do presidente norte-americano do ponto de vista ideológico.

Mas, no cenário brasileiro, as causas da medida anunciada por Trump nesta segunda (2) ainda são alvo apenas de hipóteses por parte de especialistas.

"A Argentina está em crise e, no Brasil, o dólar subiu também por culpa do próprio Trump. Ele cria factoides e, por consequência, acaba desvalorizando as moedas ao redor do mundo. Não há fundamento técnico para essa medida", afirma José Augusto de Castro.

João Nyegray, professor de Negócios Internacionais da Universidade Positivo (UP), aponta que a relação com os EUA pode não estar tão boa quanto Bolsonaro quer aparentar. Na mesma linha, Wagner Parente, da consultoria BMJ, diz que o retorno à prática das taxas mais altas para o aço brasileiro pode ser resultado da aproximação entre o governo Bolsonaro e os chineses.

Ele vê, ainda, a possibilidade da sobretaxa para o aço ter sido utilizada para dar um "recado" ao governo brasileiro – já que o presidente norte-americano citou agricultores em seu post mas, na prática, o mercado de aço não tem ligação direta com o de commodities agrícolas.

"Essa medida não dá nenhuma vantagem imediata para o agronegócio americano. É mais uma forma de pressionar o governo brasileiro a parar com a suposta desvalorização do real", afirma. Vale lembrar que os produtores brasileiros competem diretamente com os norte-americanos no mercado internacional de commodities.

José Augusto de Castro completa dizendo que o acordo entre o Mercosul e a União Europeia é uma das principais motivações para a medida. "Trump quer detonar o acordo antes que ele seja, de fato, firmado", diz o presidente-executivo da AEB.

Bolsonaro diz que "tem canal aberto" com Trump

O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, já comentou o caso. Na saída do Palácio da Alvorada, ainda na manhã desta segunda-feira (2), Bolsonaro disse que irá falar com o ministro da Economia, Paulo Guedes, e, se for o caso, com Trump. "Tenho canal aberto com ele [o presidente norte-americano]. Não quero falar nada agora para não ter que recuar depois", afirmou.

De acordo com o professor João Nyegray, a Organização Mundial do Comércio (OMC) pode interferir caso a sobretaxa persistir. Mas, para isso, o Brasil precisa fazer um pedido à entidade. "A OMC só age quando provocada. Não sei se o governo brasileiro está interessado em comprar essa briga", avalia.

Os efeitos econômicos da retaliação norte-americana, entretanto, podem ser grandes. Isso porque o aço é parte importante das exportações brasileiras para os EUA: segundo dados do Ministério da Economia, entre janeiro e outubro deste ano foram US$ 2,2 bilhões em aço exportados para os EUA, o que representa 9,3% de tudo o que o Brasil manda para os norte-americanos.

As consequências da medida, entretanto, ainda são incertas, tendo em vista que Trump não especificou qual será a sobretaxa aplicada ao aço brasileiro.

Segundo Nyegray, um dos efeitos pode ser a desvalorização do aço no mercado mundial. "A dificuldade em exportar para os EUA vai implicar em um aumento na oferta desse produto no mercado internacional. Como vai sobrar aço, a tendência é a diminuição do preço, o que certamente vai afetar a nossa balança comercial caso não encontremos outros clientes para esse produto", avalia.

O Instituto Aço Brasil, que representa as empresas brasileiras produtoras de aço, afirma que recebeu a decisão "com perplexidade". "O Instituto reforça que o câmbio no país é livre, não havendo por parte do governo qualquer iniciativa no sentido de desvalorizar artificialmente o real", diz nota enviada pela entidade.

O Instituto afirma, ainda, que a medida é uma retaliação que "não condiz com as relações de parceria entre os dois países". "Por último, tal decisão acaba por prejudicar a própria indústria produtora de aço americana, que necessita dos semiacabados exportados pelo Brasil para poder operar as suas usinas", completa o texto.

Dólar bateu recorde na semana passada

Na semana passada, a cotação do dólar bateu recorde em valor nominal desde a criação do Plano Real. A moeda norte-americana bateu os R$ 4,26 na quarta-feira (27). Ao perceber o aumento do dólar, o Banco Central brasileiro chegou a fazer um leilão extra da moeda à vista, com a intenção de segurar a cotação. Na manhã desta segunda-feira (2), a moeda operava em queda.

Antes da escalada no valor da moeda, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse, em viagem aos EUA, que os brasileiros teriam que "se acostumar com o câmbio mais alto por um bom tempo".

Confira a íntegra da nota do Instituto Aço Brasil

O Instituto Aço Brasil recebe com perplexidade a decisão anunciada hoje (02) pelo presidente dos EUA, Donald Trump, de restaurar as tarifas de importação de aço e alumínio provenientes do Brasil e da Argentina, sob o argumento de que estes países têm liderado uma desvalorização maciça de suas moedas, e que isso não é bom para os agricultores dos EUA.

O Instituto Aço Brasil reforça que o câmbio no País é livre, não havendo por parte do governo qualquer iniciativa no sentido de desvalorizar artificialmente o Real e a decisão de taxar o aço brasileiro como forma de "compensar" o agricultor americano é uma retaliação ao Brasil, que não condiz com as relações de parceria entre os dois países. Por último, tal decisão acaba por prejudicar a própria indústria produtora de aço americana, que necessita dos semiacabados exportados pelo Brasil para poder operar as suas usinas.

Confira a íntegra da nota conjunto dos ministérios das Relações Exteriores, Economia e Agricultura

O governo brasileiro tomou conhecimento de declaração do Presidente Donald Trump sobre possível imposição de sobretaxa ao aço brasileiro e já está em contato com interlocutores em Washington sobre o tema.

O governo trabalhará para defender o interesse comercial brasileiro e assegurar a fluidez do comércio com os EUA, com vistas a ampliar o intercâmbio comercial e aprofundar o relacionamento bilateral, em benefício de ambos os países.

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