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As falácias socialistas, a “classe do ócio” e a idealização da inveja
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Por Roger Scruton*

Esse cenário, segundo o qual os frutos do trabalho humano, essencialmente, não têm dono até o Estado distribuí-los, não é meramente a posição padrão do pensamento de esquerda. Foi idealizado dentro da universidade nos departamentos de Filosofia Política de modo a tornar-se praticamente inatacável a partir de qualquer ponto da disciplina.

A ideia de que a riqueza já vem ao mundo marcada pelo título do direito de propriedade, que só pode ser cancelado em violação aos direitos do indivíduo, não tem espaço na visão de mundo da esquerda progressista.

O Estado socialista não “redistribui” um ativo comum da sociedade. Cria renda sobre os ganhos dos pagadores de impostos e a oferece aos seus clientes privilegiados. Esses clientes garantem os seus rendimentos votando naqueles que os providenciaram.

Testemunhamos assim, como na Grécia, a criação de uma nova “classe do ócio” que se utiliza do Estado a fim de obter o seu ganho do restante da sociedade.

A verdadeira perversão é uma falácia peculiar que vê a vida em sociedade como aquele em que todo sucesso de um é o resultado do fracasso de outrem. Segundo essa falácia, todos os ganhos são pagos pelos perdedores. A sociedade é um jogo de soma zero em que existe um equilíbrio entre os cursos e os benefícios, e a razão da vitória do vencedor é a derrota dos perdedores. Tal falácia do “jogo de soma zero” se tornou uma afirmação clássica na teoria da mais-valia de Marx, que pretendia mostrar que o lucro do capitalista é resultado do confisco da força de trabalho do proletário.

Parece-me que essa falácia do jogo de soma zero está na base da crença generalizada de que igualdade e justiça são ideias equivalentes – crença que parece ser a posição padrão dos socialistas e programada como tal nos cursos universitários de Filosofia Política.

Para certo tipo de mentalidade igualitária, não importa que Jack tenha trabalhado para construir a sua riqueza e que Jill apenas descansava em uma ociosidade voluntária; não importa que Jack tenha talento e energia, ao passo que Jill não tenha nem um nem outro; não importa que Jack mereça o que tem, enquanto Jill nada mereça: a única questão importante é a classe e as desigualdades “sociais” que dela se originam.

É fácil assegurar a igualdade na área do ensino: basta remover todas as oportunidades para um aluno ir além e se destacar, para que nenhuma criança jamais tenha êxito em aprender o que quer que seja.

Um sistema que oferecia aos filhos de famílias pobres uma oportunidade de progredir sozinhos pelo talento e pelo esforço foi destruído pela simples razão de dividir os bem-sucedidos e os malsucedidos.

Contudo, o novo conceito de justiça “social” veio para salvar os igualitaristas e permitiu-lhes mostrar a sua maldade contra os bem-sucedidos como uma espécie de compaixão em relação aos demais.

E não há dúvida de que o ressentimento desempenhou um importante papel na atitude que hoje prevalece perante a desigualdade. Não vejo outra solução para o ressentimento generalizado que não a postura tradicional norte-americana existente nos Estados Unidos – investir a riqueza e dar ao maior número possível de pessoas uma parte dessa aplicação bem-sucedida, adotando, entretanto, aqueles “estratagemas” para conter a inveja investigados por Helmut Schoeck.

Há uma tentação, que os intelectuais de esquerda sentem mais intensamente, de substituir o indivíduo imperfeito pela abstração pura, de reescrever o mundo humano como se este fosse formado por forças, movimentos, classes e ideias, todas se movendo em uma estratosfera de necessidade histórica a partir da qual as realidades desordenadas foram excluídas.

Hoje podemos ver isso claramente, visto que o mundo ocidental emerge da Guerra Fria e do pesadelo comunista. Mas a “tentação totalitária”, como a denominou Jean-François Revel, ainda está lá – a tentação de remodelar a sociedade para que a igualdade seja imposta de cima para baixo pelo benigno Estado socialista, cujas boas intenções nunca podem ser questionadas, pois ninguém sabe como seria caso fossem realizadas.

* Trechos do capítulo “A verdade no socialismo”, de Como ser um conservador.

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