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A bizarra proposta do Congresso de aumentar municípios no Brasil
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Por Luan Sperandio, publicado pelo Instituto Liberal

Uma das poucas coisas boas do movimento dos caminhoneiros foi que o Projeto de Lei Complementar 137 de 2015 foi retirado de pauta com a deflagração da revolta. Essa proposição legislativa diz respeito a um desejo antigo dos congressistas brasileiros, que anseiam para flexibilizar a criação de municípios no país – uma péssima ideia, como pretendo explicar neste texto.

Inicialmente, vale destacar a fragilidade financeira de parcela considerável dos municípios do país. O Brasil têm 530 municípios em que mais de 80% do mercado de trabalho é bancado pelas prefeiturasOu seja, cerca de 10% dos municípios brasileiros são responsáveis pelo mercado de trabalho local. Demais a mais, entre esses municípios, 96% estão em situação fiscal difícil ou crítica. Se aprovado, estima-se que possam ser criadas ainda outras 400 cidades a se somarem a eles.

O projeto dispõe sobre o procedimento para criação, incorporação, fusão e desmembramento de municípios, além de estabelecer os requisitos para isso. Entre eles está o requerimento na Assembleia Estadual com a assinatura de percentuais diferentes dos eleitores para os municípios que queiram se emancipar, desmembrar ou se fundir. Se aprovado, será permitindo criar novas cidades mesmo que elas tenham apenas 6 mil habitantes.

O projeto determina a necessidade de haver Estudos de Viabilidade Municipal (socioambiental, urbana e político-administrativa), algo cuja eficácia é bastante contestável, já que esse tipo de estudo técnico tende a ceder a pressões políticas.

O projeto de lei complementar em tramitação está apensado a outros 6, que versam sobre o mesmo tema, mas em nenhum deles há qualquer estimativa sobre o impacto orçamentário e financeiro que a medida, caso aprovada, trará aos cofres públicos.

O que está por detrás desse movimento dos parlamentares e é mais evidente é que, ao serem criadas novas prefeituras, haverá muitos novos cargos a serem ocupados pelos partidos, além de bastante dinheiro público envolvido.

Contudo, o que não é tão evidente assim sobre tamanha pressão para a criação  de municípios é que se trata de uma consequência da distorção do federalismo fiscal brasileiro. Como evidenciou a premiada dissertação de Cláudio Shikida,  os micro municípios recebem maiores recursos per capita do Fundo de Participação dos Municípios.

Outro estudo analisou os efeitos da divisão municipal na oferta de bens públicos e indicadores sociais entre os municípios que se emanciparam na década de 1990. Os resultados mostraram que a secessão não melhorou os indicadores: houve redução na provisão de coleta de lixo, piora no saneamento básico e no fornecimento de estrutura de energia elétrica. Ademais, verificou-se piora em indicadores de analfabetismo em relação aos municípios que não se emanciparam, além de queda na renda per capita em R$ 6 e um tombo no IDH de, em média, 0,007 – destoando da melhora desses índices nos municípios que não se dividiram.

Em última análise, o que está por detrás disso é um problema do pacto federativo. Não há real autonomia em se emancipar se o município não possui autonomia financeira de arrecadação. Dessa forma, os municípios são criados, mas ficam dependentes de repasses do Fundo de Participação dos Municípios

Apesar do nome, a República Federativa Brasileira possui uma estrutura de um Estado unitário descentralizado politicamente. Uma mudança no arranjo institucional do Estado Brasileiro, no sentido de criar um pacto federativo que dê autonomia para os entes federativos, deveria ser uma das prioridades da próxima presidência. Infelizmente, diante da falência das contas públicas da União, esse debate está fadado a ser completamente negligenciado.

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