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Bolsonarismo precisa investir em narrativa de “extrema-imprensa” para manter seu próprio viés oculto
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Fato: a imprensa tem, em geral, má vontade com Bolsonaro, faz mais torcida do que análise independente, e demonstra claro viés ideológico “progressista”. Isso não é por conta de uma conspiração dos proprietários, e sim por um viés dos jornalistas mesmo, como Bernie Goldberg já apontava no caso americano décadas atrás, em seu imperdível livro Bias.

Segundo fato: muito do avanço do bolsonarismo depende desse ataque constante à imprensa, que seria produtora de Fake News e nada mais. É o mesmo fenômeno do Trump aqui nos Estados Unidos. E como há boa dose de verdade na denúncia, ela cola: nada que vem da “extrema-imprensa” presta, e por isso precisamos de fontes alternativas.

Terceiro fato: entra em cena a milícia virtual bolsonarista, como se fosse essa alternativa, mas apenas fazendo torcida com sinal trocado, ou seja, bajulando seu “mito” em vez de fazer análise ou trazer notícias sérias à tona. Combate-se um mal com outro ainda pior.

Afinal, e eis o quarto fato, foi a mídia mainstream, com todos os seus defeitos, que revelou denúncias que levaram ao impeachment de Dilma e ao debacle petista nas urnas. Há um viés sim, não resta dúvida (voltar ao primeiro fato), mas há jornalismo também, e alguma pluralidade.

A milícia bolsonarista, porém, precisa vender a ideia de que tudo que sai da mídia – quando interessa – é podre e que há uma espécie de coordenação de cima, como se fosse algo monolítico e maquiavélico. Não importa que nesses veículos de comunicação tenham vários liberais e conservadores, ainda que em menor número do que “progressistas” ou mesmo petistas.

Numa típica projeção freudiana, os bolsonaristas acham que toda crítica ao governo que vem dos colunistas de opinião dessa grande imprensa se deve ao fato de serem uns “vendidos”. Entende-se: seguem cegamente um guru e muitos estão de olho em verbas públicas como prêmio pela bajulação ao presidente. Alguns ficaram animados até com a decisão absurda de manter a EBC (TV Brasil), de olho em programas alinhados ao bolsonarismo. Não percebem que existe, sim, analista independente na mídia.

Toda essa introdução para chegar à polêmica de hoje: tivemos duas notícias “bombásticas” recentemente, uma sobre a quebra de sigilo de Flavio Bolsonaro no caso Queiroz e outra da delação do dono da Gol, Henrique Constantino, que menciona o filho de Lula e Rodrigo Maia, presidente da Câmara.

Analistas sérios e independentes não devem passar pano em nenhum dos dois casos, e sim cobrar explicações e avaliar o momento das denúncias, eventuais interesses por trás, sua robustez etc. Foi o que a maioria fez. Mas a narrativa bolsonarista precisa investir na tese de “extrema-imprensa” sempre contra Bolsonaro e a favor dos bandidos. Logo, bolsonaristas espalharam que a imprensa blindou Maia e só falou de Flavio Bolsonaro.

Não dá muito trabalho checar fake news. Olavetes disseram que a “extrema-imprensa” blindou Maia e nem fala da delação do dono da Gol, só do Flavio Bolsonaro. Nos sites do Globo, Estadão, Jovem Pan e até Folha a delação contra Maia está em destaque. É só checar. Sou grande crítico do viés ideológico da imprensa, da torcida contra Trump e Bolsonaro, mas tenho apreço pela verdade. Sou crítico, enfim, de qualquer fake news, venha de onde vier!

Acho lamentável a torcida futebolística em política, que toma um lado e fecha com ele, “no matter what”. É a morte da independência. O que mais vemos por aí é bolsonarista atacando a imprensa como um todo ao mesmo tempo em que demonstra escancarada parcialidade em suas “análises”, sempre protegendo o governo. Essa postura é lamentável. É petismo com sinal trocado.

Rodrigo Constantino

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