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Combatendo falácias econômicas do cotidiano
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Por João Luiz Mauad, publicado pelo Instituto Liberal

Uma matéria publicada na imprensa do Japão, e reproduzida pelo jornal Valor. sobre os últimos dados da economia chinesa (2017) espelha uma série de falácias econômicas amplamente disseminadas pelo mundo, especialmente sobre desigualdade de renda, análise e formação do resultado do PIB.

O título da matéria já é bastante sugestivo: “Alta dos ativos beneficia os mais ricos e eleva desigualdade”. Ora essa afirmativa é um típico truísmo. Qualquer ser pensante sabe que uma alta dos ativos irá beneficiar os mais ricos, que obviamente possuem mais ativos, assim como uma eventual baixa nos preços desses ativos os irá prejudicar. Quando estourou a última crise nos Estados Unidos, derivada do estouro da bolha imobiliária naquele país, por exemplo, os índices de desigualdade caíram junto, uma vez que os mais ricos, por razões evidentes, empobreceram mais que o resto da população.

Mesmo aqueles mais ávidos pela redução das desigualdades irão concordar que aquela não foi, nem de longe, uma boa maneira de resolver o “problema”. Imagine o leitor que um grande terremoto, seguido de tsunami, atingisse a Zona Sul do Rio de Janeiro, onde se localizam os imóveis mais caros da cidade. Evidentemente, as perdas econômicas dos ricos que ali moram ou têm propriedades seriam enormes, e os índices de desigualdade iriam cair na mesma proporção. Entretanto, em sã consciência, alguém poderia comemorar tal ocorrência?

Passando para o primeiro parágrafo, temos um bom resumo da análise capenga que se fará adiante:

“A renda está ficando mais desigual na China, à medida que a alta dos preços dos ativos beneficia primordialmente os que ganham mais. Isso estimula o ressentimento social ameaça os esforços do governo para fazer com que o consumo assuma o papel de principal motor da economia, atualmente ocupado pelo investimento.

A primeira afirmativa, segundo a qual o aumento da desigualdade “estimula o ressentimento social” representa o resumo da ideologia da inveja que está por trás da maioria das causas igualitárias. Segundo esta visão torta, a solução para o “problema” seria premiar o vício (ressentimento/inveja), através da punição à virtude (o enriquecimento lícito, a produtividade, a eficiência).

Reparem que a própria matéria, um pouco mais adiante, informa que a renda de todos os extratos da população cresceu de forma consistente durante o período, com pequenas diferenças:

A renda disponível da classe alta da China – a mais rica dentre as cinco classes sociais que o país emprega para analisar a renda – cresceu 9,1% em 2017, ou 0,8 ponto percentual mais que em 2016. O mesmo indicador cresceu respectivamente 7,7%, 7,2% e 7,1% no caso das classes média-alta, média-média e média baixa. Os índices são 0,6 ponto a 1 ponto percentual inferiores aos de um ano atrás. A renda disponível da classe mais baixa avançou 7,5% – 1,8 ponto mais que em 2016o que significa que os programas de combate à pobreza estão tendo algum efeito.”

A reclamação, portanto, não é que a renda das classes mais baixas não tenha crescido, mas que ela cresceu menos que a renda da classe mais alta. Então, eu pergunto: essa gente está preocupada em melhorar a vida dos pobres ou piorar a dos ricos? Ora, a desigualdade de renda não tem conexão necessária com a pobreza – falta de recursos materiais para uma vida decente, como alimentação adequada, abrigo e roupas. Uma sociedade com grande desigualdade de renda pode não ter pessoas miseráveis, enquanto uma sociedade sem desigualdades pode ter apenas pobres. Os caras que escreveram essa matéria deveriam perguntar aos chineses se eles estão mais satisfeitos hoje ou há 40 anos, antes das reformas que propiciaram os avanços das últimas décadas.

A segunda falácia a destacar diz respeito à afirmação de que o aumento da desigualdade “ameaça os esforços do governo para fazer com que o consumo assuma o papel de principal motor da economia, atualmente ocupado pelo investimento.

Esta falácia tem origem na fórmula de cálculo do PIB pelo lado da demanda, que acabou se transformando no Santo Graal dos keynesianos.

PIB = C + I + G + (X – M), onde C é o consumo das famílias, I são os investimentos, G são os gastos do governo, X são as exportações e M as importações.

Com base nesta simples identidade contábil, os keynesianos fazem as mais escalafobéticas derivações e as tratam como se teoria científica fossem. Invertendo totalmente a ordem das coisas, eles se apegam àquela fórmula para dizer bobagens tais como: se o governo gastar mais, o PIB automaticamente será maior. O mesmo ocorrerá se o país importar menos. Se isto fosse verdade, a fórmula do crescimento seria muito fácil.

No caso em tela, a matéria afirma que o presidente chinês pretende que o consumo assuma o papel de principal motor da economia, no lugar dos investimentos. Não chequei a veracidade da informação, mas ela é uma rematada bobagem.

Primeiro – e principalmente – porque antes de serem consumidos por ou direcionados a quaisquer dos componentes da identidade contábil, os bens e serviços têm de ser criados. Em outras palavras, para que haja consumo, investimento (consumo de bens de capital), gastos do governo e exportações, primeiro os produtos e serviços têm de ser realizados/fabricados. As importações, por seu turno, só entram na fórmula com sinal negativo porque aquela é uma fórmula de cálculo do Produto INTERNO Bruto, e há importações presentes no cálculo de todas as demais variáveis, principalmente C, I e X.

A ideia de que o consumo pode substituir a poupança (e conseqüentemente o investimento) como motor do crescimento, como explica George Reisman, é totalmente equivocada. “Ela ignora o fato de que é a >produção, e não consumo, a fonte de riqueza. Se o que se quer é uma economia saudável, então é imprescindível criar as condições para que empreendedores possam produzir e criar riqueza. Igualmente importante é criar as condições para que pessoas e empresas possam poupar o suficiente para financiar toda essa produção e, também, para consumi-la no futuro.”

Adam Smith, ainda no século XVIII, também ensinou que é “A parcimônia, e não a indústria, a causa imediata do aumento de capital. A indústria, de fato, fornece o que a parcimônia acumula. Mas, seja o que for que a indústria possa adquirir, se a parcimônia não poupou e armazenou, o capital nunca será o maior”. (O termo “indústria”, como usado por Smith, tem o sentido de trabalho sistemático, diligência nos negócios).

Não por acaso, a própria China detém, há décadas, taxas de poupança bastante fartas e taxas de crescimento, idem.

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