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Comunismo x Cristianismo: qual exige maior fé?
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Por Jocinei Godoy, publicado pelo Instituto Liberal

Muito provavelmente você já deve ter pensado em alguma utopia – algum lugar ou estado de coisas onde tudo é perfeito, pacífico e equânime – tipo uma ilha perfeita, como retratou Thomas More em seu livro: A Utopia. Com a passagem do Medievo para a Moderna, é sabido que a fé deslocou-se do campo religioso e passou a focar o campo científico e político. Em outras palavras, a fé de que a humanidade alcançaria seu ápice de igualdade, liberdade e fraternidade saiu da esfera transcendental para a esfera da imanência, ou seja, do divino para o aqui-e-agora [humanismo].

Quando o comunismo – utopia de viés humanista – é confrontado por algum cristão como sendo histórica e humanamente impossível, logo os adeptos e simpatizantes desta ideologia, devolvem para os cristãos a mesma acusação, dizendo que o cristianismo também é utópico. Esta última acusação não possui qualquer sustentação, lógica e histórica, uma vez que as diferenças entre cristianismo e comunismo são estabelecidas desde suas bases fundacionais, sendo a principal delas, o que se entende por natureza humana. O marxismo, ao rotular a religião como “a ideologia”, provou do seu próprio veneno tornando-se uma das mais pujantes ideologias de toda a história. Seu calcanhar de Aquiles se deve justamente na idealização de um ser humano humanamente impossível.

O comunismo e até mesmo o próprio marxismo ou socialismo científico nunca darão certo, uma vez que, como disse Roger Scruton “desconsideram o agir humano, ao olhar o mundo [humanidade] como uma junção de forças impessoais”[1] . Ao contrário do que pretendem com seu materialismo histórico, pervertem a noção de natureza humana para firmar seus mais loucos devaneios travestidos de justiça e igualdade.

Contudo, esta ideologia possui uma estratégica válvula de escape. Isto é, a práxis destas tentativas utópicas por meio do socialismo é dialética por natureza. Este é o cerne da ideologia que coopta milhares de estudantes que, achando o máximo, aderem aos seus pressupostos. Assim, por mais que as evidências concretas da instituição do socialismo apontem para desgraças e calamidades sem fim, seus ideólogos, numa espécie de onanismo mental, subvertem o imbecil coletivo [parodiando Antônio Gramsci] sob o pretexto de a ideologia se reinventar a cada momento, através da força dos contrários. Ou seja, é sempre a reação dos outros, não a deles, que gera desgraça e calamidade na tentativa de instauração de regimes socialistas. Espertinhos, não é?

É por esta e outras razões que jamais o comunismo poderá ser comparado ao cristianismo. O fundamento do comunismo é imanente. Já o fundamento do cristianismo é transcendente. O primeiro é ingenuamente otimista em relação à natureza humana. Sua implementação sempre acaba em desgraça. O segundo é regiamente pessimista em relação à natureza humana, tornando-se, portanto, factível através da busca espiritual incessante pela virtude.

Sobre isso, o escritor brasileiro João Batista Libânio em seu livro: A Religião do Inicio do Milênio, citando o saudoso padre e filósofo Lima Vaz (1921-2002), ilustrou esta questão ao dizer: “Lima Vaz assume forte posição crítica diante da modernidade pós-cristã na sua pretensão de razão autônoma, de antropocentrismo absoluto, sem referência a Transcendência”. É a “imanentização da transcendência”, isto é, mesmo a ideia de sagrado foi trazida para dentro e a partir do próprio humano no pretenso uso de sua “razão autônoma”.

Finalmente, a verossimilhança da apropriação pelo ser humano de determinada ideologia ou sistema filosófico, tem muito mais a ver com a busca por fundamentação de suas crenças e legitimação do seu pathos [suas paixões], do que propriamente a busca ou amor pelo conhecimento. Tal fenômeno indica que qualquer ser humano, passada a mais tenra infância, sempre partirá da sua crença para a busca interessada de determinado conhecimento. Neste caso, são raríssimas as exceções que se relacionam com o conhecimento, conscientes de que “levarão porrada” o tempo todo em seus conceitos e preconceitos.

Quem conseguiu atingir tal grau de autonomia intelectual, está sempre pronto a moldar suas formas e esquemas de pensamento. Os que atingiram este patamar, certamente, jamais removerão a sua fé em Deus para colocá-la na humanidade ou, por redução, em si mesmo. Isto sim seria uma fé para lá de religiosa. Eric Voegelin a chamou de fé metastáticaou seja, a fé de que uma ordem paradisíaca se daria a partir, e somente, da boa vontade humana. É a ilha perfeita de Thomas More.

[1] The Imaginative Conservative: How to Be a Non-Liberal, Anti-Socialist Conservative. Publicado em 22 de dezembro de 2012.

Sobre o autor: Jocinei Godoy é formado em Teologia pelo Seminário Teológico Batista Independente de Campinas-SP; estudante de Filosofia na PUC-Campinas-SP; e Sócio da Evolução Consultoria. 

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